quinta-feira, 15 de abril de 2010

Desabafos...

Vemos constantemente falarem em superação, heróis, heroínas e outros adjectivos para classificarem deficientes vencedores. Não poucas vezes muitos afirmam que têm uma vida activa e que fazem tudo como antes. Que única diferença é a cadeira de rodas.
Sejamos claros. Isso nunca poderá ser assim…Como é que uma pessoa sentada numa cadeira de rodas pode fazer tudo e não ter limites?

Eu convivo com paraplégicos e sei que por mais que tenham força de vontade e sejam independentes, barreiras e limites existirão sempre. Tetraplégicos, pior situação estão ainda. Eu quando criei o TETRAPLÉGICOS, foi com a intenção de mesmo sem saber bem como, devido minhas limitações, dar a conhecer um pouco melhor a realidade de uma pessoa dependente. DEPENDENTES em quase tudo, é isso que somos. Como é que uma pessoa que até para se deslocar de lugar, muitas vezes necessita que lhe empurrem a cadeira de rodas, pode afirmar que faz tudo como uma pessoa não dependente?

Também é muito importante separar tetraplégicos que estão dependentes de seus familiares, apoio domiciliário, vizinhos e favores de outros, daqueles que têm condições de contrataram auxiliares (cuidadores) para os acompanharem 24 horas por dia e apoiarem-nos em tudo, e que têm todo o equipamento necessário para terem uma vida mais facilitada. Assim mesmo, com dificuldades, vencer é bem mais fácil.

Deixe-mo-nos de demagogias. Eu por exemplo jamais serei um vencedor aos olhos da maioria. Pois como minhas/meus queridas/os amigas/os desabafam abaixo, meus tempos em geral podem não ser os dos outros, e como muito bem escreve a Andrea, até para ir ao supermercado é preciso mobilizar a família toda.

Agradeço a estas/es amigas/os escreverem sem receio estes desabafos. Isto sim é nossa realidade. Para que esconder? Estes relatos ajudam-nos a fortalecerem-nos e a verificar que afinal todos somos limitados e também sofremos as mesmas angústias. Uma amiga ontem dizia-me, por telefone, que achava que era fraca, que era a maior inútil, que estava assim por não lutar o suficiente, etc. Mas que agora ficavam mais tranquila, pois afinal outros também têm mesmas dificuldades que ela, e não são como os que afirmam que fazem tudo como antes.

Superação? Superar-mo-nos? Supera-mo-nos todos, pois cada um à sua maneira é um vencedor.

E desabafar não é ser fraca/o ou se querer vitimar. Longe disso. É sim, relatar factos e partilha-nos connosco.

NÃO DEIXEM DE LER, ABAIXO, O DEPOIMENTO SENTIDO E REAL DE CADA INTERVENIENTE.

1º - DIA NÃO por Andrea Schute (tetraplégica)

2º - DESABAFO por Manuela Ralha (paraplégica)

3º - APENAS FICÇÃO OU ARTE DE REPRESENTAR por Nelson Mendes (tetraplégico)

4º - TANTA PERGUNTA por Mónica Silva (tetraplégica)

11 comentários:

  1. Meu querido Eduardo, as nossas "dores" saõ comuns...e por mais q queiramos ser independentes há tantos factores contra nós...tenho dias q só conseguir levantar-me é um milagre...e não nos vitimizamos, partilhamos as nossas "dores"...quem melhor q alguém como nós para nos entender? Beijo do tamanho do mundo para todos os "camaradas de estrada"...longo é o caminho e árduo...

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  2. Disse tudo Manuela, eu tenho pena que Manuela não escreva mais sobre seu dia-a-dia. Quando conheci seu blogue li-o todo sem quase parar.
    Eu gosto deste tipo de blogues porque me revejo nas vivências. Emocionam-me. Choro, rio, grito em silêncio, apaixono-me e revolto-me.

    Só nós podemos realmente sentir a dor de cada um e a luta é conjunta.

    Acho às vezes desajustado essa coisa de mostrarem vencedores.E os outros totalmente dependentes e abandonados não o são porque não lhe criam condições para tal.
    E há tantos...não os esqueçam.

    Beijo enorme e solidário para todos nós também.

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  3. Deixo aqui um comentário de uma não tetraplégica, mas mãe de um menino com paralisia cerebral e um provável dependente, por isso também eu sou um bocadinho tetraplégica....

    As notícias, a imprensa querem noticiar coisas incríveis !

    Há pessoas excepcionais em todo o lado, deficientes ou não.

    Eu ainda tenho as duas perninhas e os dois bracinhos a trabalhar a 100 % e não me destaco em nada. Trabalho árduamente e não oiço uma palavra de apreço. Sou mediana e sinto-me com baixa auto-estima constantemente. Sinto a pressão própria de ser uma boa profissional. Talvez porque sou mulher e gostaria de mostrar que tb as mulheres conseguem ser boas profissionais no meu ramo....

    Mas se não sou nada disso, tento ser a melhor mãe possível, a melhor amiga possível....uma boa pessoa.

    Quando oiço noticias que um deficiente alcançou, fez isto ou aquilo....só penso: mesmo que não fosse, estaria destinado a ser alguém que se destacaria mesmo. No fundo queremos ser heróis, mas se em cada casa, formos o melhor que soubermos, dar o melhor de nós aos nossos entes queridos....então estamos a ser valiosos.

    À sociedade da competição, um basta !

    A cada deficiente o meu reconhecimento. Com tudo a funcionar, já há dias que custa a sair da cama, mesmo....imagino com entraves.
    Sempre pensei que um dia podia ficar tetraplégica. Não sei se o serei ou não, mas vejo as limitações do meu filho e isso basta-me para ver que a nossa sociedade está estruturada para a "normalidade". Teremos de mudar isso.

    A normalidade é precisar de rampas e sitios acessíveis.

    Um abraço e desculpe a intromissão....

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  4. ANA, tu é que és fantástica! És "dita normal" e como a maioria, poderia passar-te ao lado esta temática. Mas não, tua presença e apoio constante para connosco e nossa causa é enternecedor.
    Obrigado de coração.

    GRILINHA, bem-vinda e seja intrometida sempre! Já conheço sua simpatia e generosidade pelo d-eficiente. Lá sou "edtomas".

    Competição e competição, não é? Parece que temos sempre obrigatoriamente e a qualquer custo de ser melhor que o outro. Eu não sou nada contra. Até acho que se for saudável...Não me sinto confortável é exigirem que um tetraplégico, completamente dependente, confinado a um quarto, muitas vezes acamado e sem apoio nenhum consiga os mesmos feitos que um com todo o apoio.
    Conheço muitos que se sentem inúteis e fracassados porque nunca poderão então ser vencedores.
    Irei com atenção ver seu blogue e um abraço bem forte para o filhote.
    Vou publicar seu texto no blogue porque o acho muito importante.

    Fiquem bem.

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  5. Eduardo, por mais que descrevamos realidades difíceis é incrível que tem quem não acredita.
    Somente sendo direto, como você aqui foi, é que outros saberão e verão.

    Abraços.

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  6. Porque muitos dizem que fazem uma vida normal. E isso não é a realidade.
    Dependente, é dependente...

    Fica bem.

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  7. Eduardo, Sou a Carla e tenho Paralisia Cerebral provacada por erro médico.

    Não falo bem, caio com um simples sopro, e tenho muito difilculdade de coordenação.

    Na vida já fui posta de lado muitas vezes, mas sempre lutei, sempre quis contariar as minhas limitalções, e chegar onde os ditos chegam.

    Ter um trabalho foi sempre o meu sonho e consegui realiza-lo.

    Sempre adorei desporto porém devido à minha incapacidade não havia modalidade nenhuma que se adaptace ás minhas caracteristicas, um dia descobri o remo adaptado que partiquei durante 10 anos mas quando entraram na competição propriamente dita eu era fraca e fui posta de lado, ainda assim não desisti e um dia senti de novo o regresso de um sonho e estava de volta à água desta vez num kayak.
    Muitos diziam que era asneira que não iamos a lado nenhum.
    O Ivo acreditou em mim e eu nele e os dois consegui-mos pôr de pé um sonho e o projecto da canoagem adaptada.

    O ano passado vimo-nos no meio de um Campeonato do Mundo.

    " O que faço eu aqui?" foi o que pensei na altura, senti-me um piolho no meio de uma floresta.

    Hoje vamos a Galas somos recolhecidos e continua-mos a ser os mesmos e a lutar para levar a canoagem adaptada aos que menos mobilidade têm é no meio de vós que nós nos senti-mos gratificados.

    Sábado fomos destinguindos com o DVD de Ouro no meio de muitos elustres, eu termia por todo pus uma sala inteira de pé.

    Fiquei arrepiada mas o prémio esse é de todos aqueles que lutam para passar todos os obstaculos da vida.

    Força Eduardo

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  8. Carla, gostei muito do teu testemunho e por isso resolvi publica-lo no blogue e assim também dar a conhecer-te melhor e canoagem adaptada.

    Desejo-te continuação de grandes sucessos.

    Fica bem.

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  9. Sou tetraplégica a 23 anos e ainda assim pra mim é um tabu falar minha vida

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    Respostas
    1. Tente se libertar. É a sua nova condição. É a sua vida. Se a aceitar será mais fácil lidar com ela.
      Abraço solidário

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