sábado, 7 de janeiro de 2023

Desapareceram 700 mil pessoas com deficiência ou incapacidade nos censos 2021

A forma como os censos foram conduzidos ainda é um resquício de domínio da maioria silenciosa. Precisamos de continuar a combater estas correntes e, na questão fundamental dos dados, investir num estudo de caracterização desta população, escreve Tiago Fortuna no Expresso.


Em 2011 os Censos identificaram 1 792 719 pessoas com alguma deficiência ou incapacidade, mas em 2021 apresentaram um novo número: 1 085 472 pessoas. Desapareceram 700 mil pessoas com deficiência ou incapacidade nos últimos 10 anos em Portugal? A Organização Mundial de Saúde deu conta de 1.3 mil milhões de pessoas com deficiência ou incapacidade no Mundo (16% da população).

O Instituto Nacional de Estatística refere na publicação dos censos que há uma diferença na metodologia e, portanto, os resultados de 2011 não são comparáveis aos de 2021. No mais recente estudo a pergunta sobre incapacidade era facultativa e foram introduzidas mais opções de resposta. Mas então como se apresenta consistência, compromisso e continuidade no trabalho com as pessoas?

Há uma maioria silenciosa e dominante na sociedade quando falamos de minorias - a deficiência não é excepção. Sinto, desde que fundei a Access Lab, que os dados publicados são amorfos. Fazem parte da cultura dominante e cultivam a passividade dos grupos caracterizados, sem estimular o desenvolvimento e o questionamento.

O mais chocante nos censos são os 84,4% da população com incapacidade economicamente inativa. Será que reflecte a realidade? O World Bank Group diz-nos que a população mundial com deficiência tem rendimentos estimados em 2 mil milhões de dólares, considerando uma população de mil milhões, que, se for pensada com os agregados familiares, chega aos 3.4 mil milhões de pessoas (o que faz crescer os rendimentos estimados).

Com este contexto, coloca-se a questão: seremos economicamente irrelevantes para a sociedade?

Por mais críticas que se possam tecer aos estudos disponíveis, todos indicam alguma vulnerabilidade social e económica nesta população. O Observatório da Deficiência e Direitos Humanos (ODDH) indica-nos que pessoas com deficiência têm um risco de pobreza de 31.2% (comparado com 18.8% da população geral).

No relatório do ODDH dá-se nota de um crescimento residual de trabalhadores com deficiência no sector privado de 0,51% para 0,59% nos últimos 5 anos. Note-se que a lei 4/2019, para empresas com mais de 100 empregados, tem um período de transição para 1% dos trabalhadores que termina já em Fevereiro de 2023.

Como se estimula a empregabilidade e participação no tecido social? Através da educação. Apesar dos censos darem conta de 21,5% da população com incapacidade não ter completado a escolaridade, o ano lectivo de 2021/2022 contou com o número mais elevado de jovens com deficiência no ensino superior: 2779 - um crescimento de 8% (que tem sido regular nos últimos anos).

Nos Estados Unidos, um estudo conduzido pela Accenture concluiu que empresas que promovem a empregabilidade de pessoas com deficiência têm mais 28% de receitas e mais 30% de margem de lucro, comparadas com outras empresas. A exclusão é mais dispendiosa que a inclusão.

Os dados que apresento são paradoxais porque não aceito a dormência dos censos. A comunidade de pessoas com deficiência é diversa: em idades, profissões, contextos sociais. Somos pessoas inteiras, longe de sermos estanques.

Tenho procurado criar paralelismos com outras realidades, analisar o progresso em questões de género, raciais ou sexuais - até porque, além da deficiência, também somos parte destes grupos. Ao contrário de outras minorias, não vejo as pessoas com deficiência como tendo sido ostracizadas. Foram assimiladas, institucionalizadas e geridas por um assistencialismo crónico e corrosivo. Talvez por isso, tenha sido até há pouco tempo uma comunidade silenciosa. Mas os tempos mudam e as nossas vozes ouvem-se cada vez mais alto.

A forma como os censos foram conduzidos ainda é um resquício desta conjuntura, de domínio da maioria silenciosa (que existe e opera diariamente). Precisamos de continuar a combater estas correntes e, na questão fundamental dos dados, investir num estudo de caracterização desta população. Alguém tem de atravessar-se com este investimento, pode ser o Estado ou uma fundação privada.

Um estudo que nos permita perceber quem são estas pessoas: onde estão no país? Que grau de incapacidade têm? Em que trabalham? Viajam? Investem em entretenimento? Que obstáculos encontram no seu dia-a-dia? São vítimas de discriminação? Os censos fazem algumas destas questões, mas são insuficientes.

Esta caracterização pode ter resultados desanimadores. Há quem tema tanto esses resultados que prefere não tê-los. Sou veementemente contra essa posição. Podemos concluir que as pessoas gastam muito pouco em cultura ou que não viajam. Mas e se for? O que podemos fazer? Que medidas podemos criar na política e empresas para mudar paradigmas?

Reconheço a demora inerente ao progresso mas a sensação que tenho, diariamente, é que tudo continua por fazer. Nos últimos meses, questionei-me sobre o que é o progresso e o que deve norteá-lo. As minorias, continuando à mercê da maioria, estão a romper os cânones instituídos, a desconstruir preconceitos, a superar todas as expectativas. E nós, quer façamos parte de grupos minoritários ou não, devemos escutá-los.

Chega de silenciamento. Uma causa que é nossa, vive na constância de se ver vetada por uma vontade maioritária, como tão bem se sente na pergunta que James Baldwin nos faz neste vídeo: quanto tempo é que precisam para o vosso “progresso”?

SIBS lança o primeiro cartão para pessoas com deficiência visual certificado pela ACAPO

A SIBS desenvolveu o primeiro cartão inclusivo do mercado pensado para as pessoas com deficiência visual certificado pela ACAPO – Associação dos Cegos e Amblíopes de Portugal, informa a techbit.pt


A ideia da SIBS com este cartão é que as pessoas com problemas de visão fiquem aptas a utilizar este instrumento de forma mais autónoma, segura e privada.

SIBS apresenta solução com cartões bancários e não bancários

A solução certificada pela ACAPO que a SIBS apresentou inclui cartões bancários e não bancários com identificação e caracteres em Braille, desta forma os utilizadores cegos ou com baixa visão vão conseguir distinguir os vários tipos de cartão por tipo de utilização.

A tecnologia em questão, assim como a solução apresentada, são próprias e desenvolvidas pela própria SIBS, passando a estar disponível o acesso aos cartões a todos os clientes e parceiros da empresa, seja em Portugal ou no estrangeiro.

“Trabalhamos diariamente para colocar o melhor da tecnologia ao serviço da sociedade, contribuindo para um futuro mais equilibrado e seguro. É com orgulho que, depois de quase dois anos de desenvolvimento e melhoramento do projeto, somos mais uma vez agentes de mudança, assegurando a utilização de cartões de forma autónoma, privada e segura, em terminais de pagamento e caixas automáticos, por parte de um cego ou amblíope”Gonçalo Campos Alves, Diretor Geral da SIBS Cartões

A ACAPO já havia identificado que este processo de identificação de cartões se tratava de um problema para as pessoas com dificuldades a nível visual, e agora, a SIBS oferece uma solução que pretende facilitar a vida destas pessoas.

O desafio foi assumido pela SIBS no âmbito do programa de Sustentabilidade “Verde-Código-Verde”, e em linha com o seu propósito de desenvolver soluções com impacto no dia a dia e criar valor para as comunidades onde está presente, promovendo uma sociedade mais justa e equitativa.

“Este projeto é um passo importante não só para as pessoas cegas ou com baixa visão, e para todos os que lhes são mais próximos, mas também para a consciencialização da comunidade sobre a importância do acesso igual e acessível a todos. Desta forma, um maior número de entidades poderão adotar no seu dia-a-dia práticas inclusivas, quer para a informação que produzem quer para o relacionamento com os seus clientes”Rodrigo Santos, Presidente da Direção Nacional da ACAPO

A solução apresentada vai permitir que qualquer pessoa possa identificar tanto o tipo de cartão (bancário, de fidelização, de acesso, etc) assim como a entidade emissora. A autonomia será total e passa a permitir que estas pessoas possam utilizar os seus cartões de forma mais privada e segura, uma vez que deixam de depender de terceiros para identificar o que estão a fazer ou utilizar.

A inclusão do Braille nos cartões complementa assim o cortante lançado em 2018, um corte efetuado no cartão em formato de meia lua que permite às pessoas cegas ou com baixa visão identificarem o lado correto para utilizar o mesmo.

Segundo os dados partilhados pela SIBS, em Portugal, 23.396 pessoas não conseguem ver e 3,7% da população tem muita dificuldade em realizar esta tarefa.

Este novo projeto surge em parceria com a ACAPO, uma Instituição Particular de Solidariedade Social fundada a 20 de outubro de 1989 que tem como missão a representação dos cidadãos com deficiência visual, providenciando-lhes serviços adequados às suas necessidades e consciencializando a sociedade para a sua inclusão.

Governo acusado de falhar lei da reforma para pessoas com deficiência

O Jornal de Noticias publica que a associação Centro de Vida Independente acusa o Governo de ter falhado o prazo de regulamentação da lei que permitirá a pessoas com 80% ou mais de incapacidade se possam reformar antecipadamente sem penalizações. A associação afirma ter endereçado uma carta a questionar a secretária de Estado para a Inclusão, Ana Sofia Antunes, sobre este atraso.


A lei, que foi aprovada a 26 de novembro de 2021 e entrou em vigor a 28 de junho de 2022, com a aprovação do Orçamento do Estado para esse ano, tinha como data limite de regulamentação o passado dia 25 de dezembro, data a partir da qual as pessoas que reunissem as condições já se poderiam candidatar à aposentação antecipada sem cortes, lê-se no comunicado enviado às redações pelo Centro de Vida Independente.

A associação afirma que são diversas as queixas de pessoas que, após a data limite de regulamentação por parte do Governo, tentaram submeter a reforma segundo as novas regras previstas, mas sem sucesso. A direção do Centro de Vida Independente relata que as entidades junto das quais se trata da reforma "afirmam desconhecer qualquer tipo de legislação em vigor".

Jorge Falcato, presidente do Centro de Vida Independente, refere que o atraso no Orçamento de Estado, que consequentemente atrasou a entrada em vigor da lei, permitiu ao Governo "ter tempo suficiente para a formulação da regulamentação". "Entre a aprovação da lei em novembro de 2021 e a entrada em vigor, em junho de 2022, tiveram mais de seis meses para trabalhar na regulamentação. E desde aí já passaram mais 180 dias."

Em causa está a permissão aprovada pelo Governo para que pessoas que tenham mais de 80% de incapacidade possam reformar-se sem penalizações caso tenham "60 anos e 20 anos de descontos, dos quais, pelo menos 15 na condição de pessoa com deficiência". Em setembro de 2021, antes da aprovação da lei, a associação presidida por Jorge Falcato pedia que a reforma antecipada tivesse início nos 60% de incapacidade, o que não avançou.

Atrasos são "constantes"

Em outubro passado, a secretária de Estado para a Inclusão, Ana Sofia Antunes, garantiu, em sessão no Parlamento, "que a partir do início de 2023, as pessoas com deficiência com acesso antecipado à pensão de velhice poderão requerê-lo e ter acesso ao mesmo". O que, segundo a associação Centro de Vida Independente, ainda não se verifica.

Este não é o primeiro atraso que Jorge Falcato lamenta relativamente a apoios a pessoas com deficiência. "Estes atrasos na secretaria de Estado para a Inclusão são constantes." O presidente do Centro de Vida Independente refere o incumprimento, não só de diversas ações previstas na Estratégia Nacional para a Inclusão das Pessoas com Deficiência, com efeito de 2021 até 2025, mas do próprio relatório de execução. "O relatório de 2021 deveria ter sido entregue até maio de 2022, já questionamos o Instituto Nacional para a Reabilitação, responsável pela estratégia, por diversas vezes há vários meses, e até agora não obtivemos qualquer resposta."

É ainda assinalada por Jorge Falcato a não atualização da Prestação Social para a Inclusão, que deveria ter acontecido no ano passado.

O JN questionou o Governo sobre este atraso mas não obteve ainda resposta.