Há vários dias que procuro em vão
palavras para iniciar este texto.
Até agora
não surgiram.
Chego a sentir que estou a fugir do
assunto, a adia-lo, que não o quero fazer, outras vezes penso que é necessário
esperar o momento e o local certo...
mas hoje, dia 01/07/2015, 22h14, ao som
do Rui Veloso, deitado como me deixou a Rafaela e até que a Euridice não me
venha voltar a posicionar lá pela meia-noite, esboço um tentativa de finalmente
começar a escrever.
Isto de deitar cá para fora através da
escrita o que vai na alma pelos vistos não é fácil.
Ainda por cima quando se trata de
resumir emoções desconhecidas. Estou a viver um turbilhão de sentimentos e
sensações, pior de tudo é esta sensação de não estar a fazer o certo, sinto-me
como se estivesse a fazer algo muito errado, a desiludir alguém, a entregar os
pontos e a dar-me como vencido...neste momento é o que sinto, e magoar os
outros, mas principalmente a mim, é algo que quero evitar.
A minha luta pela
desinstitucionalização é conhecida por todos, mas eu vou institucionalizar-me
dia 21 de Julho próximo. Esse facto está a fazer-me muito mal. É difícil não
sentir uma sensação de derrota.
É muito complicado estar nesta posição.
Sinto-me muito confuso.
Mas tenho que aceitar de uma vez por
todas que continuar a viver sozinho, durante 16 horas do dia, neste estado
frágil de saúde que me encontro não posso continuar. Suores persistem, escara
idem, intestinos e bexiga não me dão sossego.
É impossível continuar a viver nestas
circunstâncias.
Além do factor saúde e impossibilidade
de continuar sozinho existiram outros motivos que me levaram a optar por me
mudar para um lar. São eles: Uma fantástica e inesperada oferta de emprego que
me foi dirigida pelo Centro de Apoio Social da Carregueira (CASC); a
impossibilidade de continuar a trabalhar onde me encontro, com contrato após o
término do estágio profissional que estou a realizar na União das Freguesias de
Alvega e Concavada (UF), e o facto da proposta de emprego me ter sido dirigida
por pessoas muito especiais e que têm a minha admiração pela maneira humana
como administram a minha futura Instituição. Pessoas essas que conheci aquando
da realização da minha viagem de protesto até Lisboa em cadeira de rodas.
Ter um trabalho hoje em dia é um enorme
privilégio, ser-se desejado como foi o meu caso é uma sensação maravilhosa. Após
adquirir a minha deficiência só tive direito a estágios ao abrigo dos programas
de emprego subsidiados pelo IEFP e (contratos de emprego-inserção +) praticamente
mendigando…sem dúvida que o factor emprego conta muito, mas não vou deixar de
ser obrigado a habitar num lar de idosos.
Vamos aos factos: irei mudar-me para o CASC,
no dia 21 próximo, e iniciarei funções a partir do dia 01/08/2015. Estive hoje na
Instituição a escolher o quarto e a esclarecer últimas dúvidas.
Agora é preparar a mudança e retribuir
com trabalho a confiança que a direcção do CASC depositou em mim.
DESISTI DE LUTAR?
Não, desistir nunca será uma opção, mas
as minhas limitações levaram a melhor por enquanto. Vou tentar resolver os
problemas de saúde que me têm surgido, e criar condições para poder continuar
ainda mais forte e convicto.
Tinha a continuação da greve de fome
programada para o passado dia 10/6, mas nestas condições e circunstâncias era
impossível realiza-la, facto que me doeu muito e ainda dói.
TRISTEZA
Sair da minha casa e meu ambiente
social, onde adoro viver e queria continuar. Separar-me dos meus cães Aramito
com 5 anos, e Kiko com 1, assim como das plantas que me foram deixadas pela
minha mãe e minha horta, está a ser muito doloroso.
AGRADECIMENTOS
Principalmente à população da Concavada
e Ribeira do Fernando, assim como restantes moradores da União das Freguesias por
tudo que me ensinaram.
Ficarão para sempre no meu coração.
Cá no fundo existe a esperança de
voltar um dia, por isso deixo não um adeus mas um até breve.
Saio com a convicção de dever cumprido.
Nunca esquecerei estes quase 4 anos de crescimento e aprendizagem, numa área
que quanto a mim não é explorada como deveria ser no percurso académico, pois existe
cada vez menos preocupação em promover a dignidade e o valor das pessoas no
interior do nosso país, anos esses que me deixam com uma sensação de conquista
e vontade de continuar a aprender e desafiar as minhas capacidades, desta vez
noutro lugar.
Espera-me um novo desafio que será
encarado com enorme orgulho e a mesma determinação e paixão de sempre.
Também não poderia deixar de agradecer
ao anterior executivo da Junta de Freguesia da Concavada, assim como aos
actuais membros que dirigem atualmente a recém criada União das Freguesias de
Alvega e Concavada, pela oportunidade que me deram de trabalhar numa área que
tanto prazer me dá (Serviço Social), a todos os meus colegas, Câmara Municipal
de Abrantes, Centro de Reabilitação Infantil de Abrantes, principalmente Drº
Humberto Lopes, e ainda a Dra Lurdes Botas do Serviço de Emprego de Abrantes
pelo excelente trabalho que está a realizar em prol da empregabilidade das
pessoas com deficiência no nosso Concelho.
Um obrigado muito especial ao Sr
Joaquim Catarrinho pela sua dedicação e carinho ao cuidar das minhas maleitas físicas e não só durante
vários anos, e às minhas cuidadoras Lidia Correia, Euridice Varela e Rafaela
Fialho pela paciência que tiveram comigo. Deveria agradecer a muitas mais
pessoas, mas o espaço não o permite, sendo assim quero que saibam que ficarão
sempre no meu coração. A todos vocês o meu muito obrigado!
Para finalizar quero deixar bem claro
que me sinto um afortunado por poder continuar a trabalhar, e sou muito grato a
quem me realizou o convite. Minha grande angústia reside no facto de ainda não
ter conseguido, através das ações de luta que me propus, alterar esta politica
da institucionalização compulsiva levada a cabo pelo nosso Governo. Meu grande
dilema não é institucionalização em si, mas o facto de ser obrigado a isso, de
não existirem outras alternativas para quem depende do apoio de terceiros, mas
principalmente o facto de eu não ter ainda conseguido reverter esta situação
através das ações de luta que tenho realizado.
Eduardo Jorge