Serão cerca de um milhão de pessoas, segundo a Asssociação Portuguesa dos Deficientes, mas o Estado português sabe pouco sobre muitos dos seus cidadãos com deficiência e/ou incapacidades várias. O último Censos, feito em 2011, reduziu a informação específica sobre os cidadãos com deficiência e, por isso, o Governo decidiu promover um levantamento da situação desta população. Uma iniciativa que vai avançar muito em breve, contando prioritariamente com o apoio das autarquias locais e das unidades de saúde.
“Ainda não conhecemos a realidade por completo, porque esse mapeamento não está devidamente feito, onde é que as pessoas estão, onde é que elas podem estar e em que condições”, salienta Ana Sofia Antunes, secretária de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência, em declarações ao PÚBLICO. A governante frisa que ainda subsistem muitos factores que diferenciam e condicionam o acesso das pessoas com deficiência a múltiplas situações, desde logo à formação e ao emprego. “Ainda hoje o elemento urbano versus rural pesa muito. Aquilo que um jovem com deficiência faz ou pode fazer no meio urbano é muito diferente daquilo que faz ou que pode fazer num meio mais rural”, constata Ana Sofia Antunes, jurista de formação e a primeira pessoa cega a integrar um governo em Portugal.
Por isso, a secretária de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência revela que já está decidido que vai ser feita "uma espécie de censos” da população portuguesa com deficiência e/ou incapacidades. Este trabalho, que será coordenado pela Secretaria de Estado, já está a ser preparado e poderá contar, igualmente, com algum apoio de fundos comunitários. O objectivo é que seja um levantamento que não invada a vida das pessoas, mas que assente sobretudo na recolha de informação junto das autarquias, dos centros de saúde e da multiplicidade de instituições (públicas e privadas) que trabalham com deficientes.
Identificar sem invadir
“O objectivo é saber onde estão, com que condições vivem, com recurso a quê, que formação tiveram, que aptidões profissionais podem ter”, precisa Ana Sofia Antunes. “Queremos fazer esta caracterização e, para isso, precisamos muito da colaboração de algumas entidades, nomeadamente das câmaras e principalmente das juntas de freguesia que, muitas vezes, são as únicas entidades que sabem realmente onde é que as pessoas estão. Mas contamos também com os centros de saúde. Tem que haver aqui uma colaboração que permita identificar sem invadir”, sublinha a governante.
Assim, a responsável da nova Secretaria de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência garante que ficarão asseguradas todas as questões da protecção de dados, mas considera muito importante conhecer em maior profundidade esta realidade. Com que objectivo? “Queremos ter a capacidade de saber o que é que podemos fazer para a melhoria da sua inclusão. É um processo que já estamos a montar, para iniciar em breve”, acrescenta Ana Sofia Antunes, lamentando a forma como estas questões foram praticamente eliminadas do Censos geral de 2011, ao contrário do que acontecera com o Censos de 2001.
O último Censos que indica especificamente o número de pessoas com deficiência em Portugal é de 2001, quando se contavam mais de 630 mil pessoas nesta situação. Em 2011, o Censos mudou o tipo de levantamento substituindo "a avaliação baseada em diagnósticos de deficiências, por uma auto-avaliação que privilegia a funcionalidade e a incapacidade como o resultado de uma interacção dinâmica entre a pessoa e os factores contextuais". O documento publicado pelo INE concluía assim que "cerca de 17,8% (taxa de prevalência) da população com 5 ou mais anos de idade declarou ter muita dificuldade, ou não conseguir realizar, pelo menos, uma das 6 actividades diárias (ver, ouvir, andar, memória/concentração, tomar banho/ vestir-se, compreender/fazer-se entender). Na população com 65 ou mais anos, este indicador atinge os 50%". O Governo quer agora apurar esta informação e saber mais sobre as pessoas com deficiência em Portugal.
“Não podemos ter dados exactos, porque fizeram questão de perder uma oportunidade fundamental de ter esses dados mais ou menos caracterizados. Alguém decidiu, por razões contabilísticas ou financeiras, que as questões relativas à deficiência iriam ficar fora do Censos de 2011. Tínhamos dados mais ou menos fiáveis nos Censos de 2001 e deixámos de os ter em 2011”, critica a governante.
Por isso, segundo Ana Sofia Antunes, em 2011 praticamente só se apurou que 17,8% da população portuguesa tem deficiência ou incapacidades. “É a única informação que temos de acordo com o Censos de 2011. Mas são duas realidades diferentes, porque nem todas as pessoas que têm uma incapacidade têm uma deficiência e não se pode dizer que todas as pessoas que têm uma deficiência têm verdadeiramente uma incapacidade”, acrescenta a governante, constatando que sobre estas questões o Censos de 2011, na forma como foi feito, só permite perceber também se as pessoas têm dificuldade em ler ou em subir degraus. “Mas ficamos por aqui e sabemos que muitos dos nossos avós têm dificuldade em ler ou em subir escadas, porque são contingências da idade”, conclui, frisando que, depois, falta muita informação sobre a realidade de vida das pessoas com deficiência e/ou incapacidades.
Esta limitação do Censos de 2011 foi, na altura, denunciada por várias organizações, incluindo a Associação Portuguesa de Deficientes, mas nunca foi corrigida. Fonte: Público
APD: Quem fizer «censos» da população com deficiência deve ter formação adequadaA Associação Portuguesa de Deficientes (APD) defendeu hoje que as pessoas que venham a fazer o levantamento e caracterização das pessoas com deficiência devem ter formação adequada, elogiando a iniciativa do Governo.
O jornal Público adianta, na sua edição de hoje, que a secretária de Estado para a Inclusão das Pessoas com Deficiência pretende realizar um levantamento do número de pessoas com deficiência em Portugal, bem como procurar fazer a sua caracterização, uma iniciativa que irá contar com o apoio das autarquias locais e das unidades de saúde.
Em declarações à agência Lusa, a presidente da Associação Portuguesa de Deficientes elogiou a iniciativa, descrevendo-a como "excelente".
"É uma velha reclamação da APD e já de há muito tempo que nós dizemos que é necessário e era urgente saber exatamente quantas pessoas com deficiência existem em Portugal", sublinhou Ana Sesudo, lembrando que não há qualquer estudo feito até agora para Portugal.
Nesse sentido, a responsável apontou que enquanto não se tiver noção da realidade das pessoas com deficiência, quantas são, onde estão, que tipo de deficiência ou incapacidade têm, "será sempre difícil desenhar políticas" específicas.
E sem essas políticas específicas, sublinhou Ana Sesudo, Portugal continua a "não cumprir os direitos das pessoas com deficiência".
Relativamente ao facto de os últimos Censos (2011) terem praticamente deixado de fora as questões relativas à deficiência, Ana Sesudo lembra que o argumento tinha que ver com suscetibilidades e com a proteção de dados.
"Se houver um cuidado nas questões levantadas, (...) desde que haja cuidado relativamente à informação que é divulgada, penso que não haverá esse tipo de problema e espero que haja um grande avanço", destacando o cruzamento de dados entre autarquias e centros de saúde.
Por outro lado, alertou para o cuidado necessário em relação a quem irá elaborar o estudo e, principalmente, quem irá abordar as pessoas com deficiência.
"Quem vai fazer a abordagem que tenha a formação devida para fazer as questões e para falar com as pessoas", pediu a responsável.
Por outro lado, apontou como "muito estranho" o número que é conhecido de pessoas com deficiência desempregadas, já que são apenas contabilizadas as que estão inscritas nos centros de emprego.
"É um número que, a meu entender, deve ser muito baixo em relação ao que é a realidade já que é preciso saber quantas não estão inscritas, quantas nunca estiveram, quantas já desistiram por situação de desemprego prolongado", apontou Ana Sesudo.
A presidente da APD contou inclusivamente que muitas vezes "o desespero é tal" que há várias pessoas com deficiência que recorrem à associação à procura de emprego,
Fonte: Diário Digital