O Governo não cumpriu com o prometido, por isso vou voltar a sair à rua. Neste caso sair à estrada.
Acontecerá no dia 23 de Setembro próximo, e irei percorrer em cadeira de rodas a distância entre Concavada, concelho de Abrantes, localidade onde resido, e Ministério da Solidariedade e Segurança Social em Lisboa. Há um ano atrás realizei com o apoio do Movimento (d) Eficientes Indignados, Uma greve de fome em frente da Assembleia da República, cuja finalidade era dizer basta há institucionalização compulsiva por parte do Estado, das pessoas com deficiencia em lares de idosos, como única alternativa de Vida.
- Mais detalhes:
http://tetraplegicos.blogspot.pt/2013/07/a-aventura-de-um-tetraplégico-para.html
- Em áudio:
Queremos ter direito a comandar as nossas vidas como o fazem
restantes cidadãos, e não ser os nossos governantes a fazê-lo por nós. Luto
pelo direito a uma Vida Independente. Quero ter direito a trabalhar, estudar,
viver no meu bairro, círculo de amigos, perto da minha família, frequentar
lugares que escolhi, e não ser obrigado a ser um número, sem voz, num lar
imundo e sem condições, a vários quilómetros de distância das minhas
referências, com custos financeiros altíssimos para mim e minha família, só
porque nasci ou adquiri uma deficiência. Criar-nos condições para vivermos nas
nossas casas, fica muito mais barato ao Estado do que a institucionalização.
Realizei a greve de fome pelo direito a uma Vida
Independente e digna. Suspendi-a porque numa reunião tida na Assembleia da
República, o Senhor Secretário de Estado da Solidariedade e Segurança Social,
Agostinho Branquinho prometeu entre outras medidas, iniciar os trabalhos de
redacção de legislação sobre a Vida Independente no final de Janeiro, com a
participação do movimento (d)Eficientes Indignados e demais representantes da
comunidade de pessoas com deficiência, mas pouco ou nada aconteceu até ao
momento, facto que me leva a voltar a luta. Existiram várias reuniões entre as
partes, mas avanços concretos nada.
A viagem que irei realizar entre a Concavada e Lisboa, passará pelas seguintes localidades: Saída de Concavada, dia 23 de Setembro, às 7h, sempre
pela estrada nacional 118, passagem pelo Pego às 7h45, Rossio ao Sul do Tejo
8h15, Tramagal 9h, Santa Margarida da Coutada 10h15, Arrepiado 11h45,
Carregueira 13h, Chamusca 15h, Vale de Cavalos 16h, Alpiarça 16h45 e Almeirim 17h30,
onde vou pernoitar em vigília à frente do edifício da Câmara Municipal local.
Dia 24, saída ás 8h de Almeirim pela estrada
nacional 114, Benfica do Ribatejo 9h15, Casa Cadaval 10h, Salvaterra de Magos 11h30,
Benavente pela EN 118 12h15, Samora Correia/Porto Alto 13h30, Vila Franca de
Xira EN10 14h45, Alhandra 15h15, Sobralinho 15h45 e Alverca do Ribatejo16h,
onde vou pernoitar na Praça de São Pedro.
Dia 25 partirei às 5h de Alverca do Ribatejo,
Forte da Casa 7h30, Povoa de Santa Iria 7h45,
e por último Praça de Londres 10h.
Durante o percurso irei pernoitar na via pública, em vigília,
junto à Câmara Municipal de Almeirim no dia 23, e no dia 24 será em Benfica do
Ribatejo. Em ambas as noites agradeço se alguém me disponibilizar um quintal,
junto a uma torneira, que me permita tomar um banhinho refrescante de mangueira.
Tanto nas noites passadas em Almeirim e Benfica do Ribatejo,
como também nas restantes localidades percorridas durante a viagem, se houver
alguém que deseje participar activamente nesta luta será muito bem-vindo, basta
juntar-se a mim durante o trajecto, ou acompanhar-me nas vigílias mencionadas,
ou também ainda através da realização de outras iniciativas que digam respeito
ao tema deficiência/Vida Independente. Ao entrar na cidade de Lisboa, seria
importante realizarmos uma marcha em conjunto, até ao Ministério da
Solidariedade e Segurança Social, que fica na Praça de Londres. Entregaremos em
conjunto um documento onde mostraremos a nossa indignação e descontentamento
por até ao momento as promessas não terem sido cumpridas, assim como lançaremos
um ultimato a exigir respostas concretas no imediato.
VIDA INDEPENDENTE...
O Estado Português subscreveu a Convenção sobre os Direitos
das Pessoas com Deficiência em 2009. A Convenção é muito clara: (...) “os
Estados Partes comprometem-se a:
a) Adoptar todas as medidas legislativas, administrativas e
de outra natureza apropriadas com vista à implementação dos direitos
reconhecidos na presente Convenção;”
Passaram já 4 anos e o Estado não cumpriu o compromisso que
assinou relativamente a inúmeros itens da Convenção, nomeadamente o
estabelecido no Art.19º - Direito a viver de forma independente e a ser
incluído na comunidade. Neste Artº o Estado Português reconheceu “o igual
direito de direitos de todas as pessoas com deficiência a viverem na
comunidade, com escolhas iguais às demais” e comprometeu-se a tomar “medidas
eficazes e apropriadas para facilitar o pleno gozo, por parte das pessoas com
deficiência, do seu direito e a sua total inclusão e participação na
comunidade, assegurando nomeadamente que:
a) As pessoas com deficiência têm a oportunidade de escolher
o seu local de residência e onde e com quem vivem em condições de igualdade com
as demais e não são obrigadas a viver num determinado ambiente de vida;
b) As pessoas com deficiência têm acesso a uma variedade de
serviços domiciliários, residenciais e outros serviços de apoio da comunidade,
incluindo a assistência pessoal necessária para apoiar a vida e inclusão na
comunidade a prevenir o isolamento ou segregação da comunidade;
c) Os serviços e instalações da comunidade para a população
em geral são disponibilizados, em condições de igualdade, às pessoas com
deficiência e que estejam adaptados às suas necessidades.”
Recordamos ainda que na Lei n.º 38/2004,de 18 de Agosto
sobre o regime jurídico da prevenção, habilitação, reabilitação e participação
da pessoa com deficiência, no Artigo 7.º - Princípio da autonomia, se define
que a “pessoa com deficiência tem o direito de decisão pessoal na definição e
condução da sua vida.”
O que observamos, passados estes anos é que a política dos
sucessivos governos tem-se orientado no sentido da institucionalização das
pessoas com deficiência. O Estado em vez de criar condições para as pessoas com
deficiência se manterem nas suas residências, no seu enquadramento familiar e
social centra a sua intervenção na comparticipação de soluções orientadas para
o desenraizamento social e afectivo destas pessoas.
Comparticipa por ex. os lares residenciais com 951,53€ por
utente internado e no entanto, se a mesma pessoa estiver em casa, com a sua
família, a comparticipação máxima que poderá ter para contratar alguém para o
assistir, é de 177.79€. Existe mesmo a situação paradoxal de ser possível
financiar com 672,22€ uma família de acolhimento na casa ao lado da família,
que nas melhores das hipóteses, tem direito a 177,79€ para cuidar do seu
familiar dependente.
É de notar que, quer na situação de internamento em lares
quer nas famílias de acolhimento, as pessoas com deficiência ainda têm de
comparticipar com parte dos seus magros rendimentos. Esta situação é anacrónica
quer do ponto de vista do bem-estar emocional e social da pessoa, quer ainda do
ponto de vista da despesa do Estado. Uma solução que passe por pagamentos
directos à pessoa com deficiência, dando-lhe meios que lhe permitam escolher
entre a permanência na sua residência ou o internamento, poderá, no nosso ponto
de vista, ser também uma poupança para as contas do Estado.
O conceito de vida independente é a saída para o cumprimento
dos compromissos assumidos pelo Estado quer na Convenção já referida, quer na
legislação nacional existente. Cabe à pessoa com deficiência “o direito de
decisão pessoal na definição e condução da sua vida.” Este foi o compromisso
assumido pelo Estado Português ao assinar a Convenção. Foi também o próprio
Estado que na Estratégia Nacional para a Deficiência 2010-2013 (ENDEF)
inscreveu várias medidas que vão nesse sentido:
Medida 63: Desenvolver
projecto-piloto que cria o serviço de assistência pessoal.
Medida 64: Executar o
aumento da capacidade das residências autónomas (RA).
Medida 66: Executar o
aumento da capacidade do Serviço de Apoio Domiciliário (SAD).
Nenhuma destas medidas, que têm como prazo de execução este
ano, foi executada de uma forma expressiva, não havendo sequer notícia do
projecto piloto que criaria o serviço de assistência pessoal, um dos pilares da
vida independente. Está na altura de passar das boas intenções à prática. É
necessária uma lei de promoção da autonomia pessoal/Vida Independente que
garanta o direito a uma vida independente para as pessoas com deficiência.
Vida Independente é uma filosofia e um movimento de pessoas
com deficiência que trabalham para a auto-determinação, igualdade de
oportunidades e respeito por si próprias. Vida Independente não significa que
queiramos ser nós a fazer tudo e que não precisamos de ajuda de ninguém ou que
queiramos viver isolados. Vida Independente significa que exigimos as mesmas
oportunidades e controlo sobre o nosso dia-a-dia que os nossos irmãos, irmãs,
vizinhos e amigos, sem deficiência, têm por garantidos. Nós queremos crescer no
seio das nossas famílias, frequentar a escola do bairro, trabalhar em empregos
adequados à nossa formação e interesses e constituir a nossa família.
Visto sermos os melhores peritos nas nossas necessidades,
precisamos mostrar as soluções que queremos, precisamos de estar à frente das
nossas vidas, pensar e falar por nós próprios – tal como qualquer outra pessoa.
Com este fim em vista nós temos de nos apoiar e aprender uns com os outros,
organizarmo-nos e trabalharmos por mudanças políticas que conduzam a uma
protecção legal dos nossos direitos humanos e cívicos. Nós somos pessoas comuns
partilhando a mesma necessidade de se sentirem incluídas, reconhecidas e
amadas.
- ENQUANTO ENCARARMOS AS NOSSAS INCAPACIDADES COMO TRAGÉDIAS
, TERÃO PENA DE NÓS.
- ENQUANTO SENTIRMOS VERGONHA DE QUEM SOMOS, AS NOSSAS VIDAS
SERÃO VISTAS COMO INÚTEIS.
- ENQUANTO FICARMOS EM SILÊNCIO, SERÃO OUTRAS PESSOAS A
DIZER-NOS O QUE FAZER.
Fontes: Adolf Ratzka – Independent Living Institute – 2005;
Movimento (d)Eficientes Indignados e
Eduardo Jorge