quinta-feira, 29 de setembro de 2016

Braga inaugura centro de desporto adaptado

O Município de Braga acaba de lançar um Centro Municipal de Desporto Adaptado, permitindo desta forma que as instituições que trabalham na área da deficiência desenvolvam a formação desportiva e o bem-estar físico dos seus utentes. O projeto, resultante de uma parceria com a CERCI Braga, vem possibilitar a prática de várias modalidades, nomeadamente atletismo, dança, escalada, karaté e snagolfe, às quais se juntará, a breve trecho, a modalidade de patinagem.

“No que diz respeito ao desporto adaptado este projeto vem colmatar uma grande lacuna detetada aquando da elaboração da Carta Desportiva de Braga. Pretendemos alargar a atividade física ao maior número possível de praticantes e, com este Centro, estamos a lançar sementes para que surjam outros clubes que apostem nestas modalidades e formem equipas competitivas no desporto adaptado”, referiu Sameiro Araújo, vereadora do Desporto do Município de Braga, durante a sessão de lançamento do projeto, que decorreu esta quarta-feir no gnration.

Como explicou a vereadora, em Braga existem 132 clubes com atividade desportiva e apenas a APD – com basquetebol, andebol e atletismo na vertente de corrida – e o S.C. de Braga (boccia), têm desporto adaptado. “Se compararmos os números de praticantes a discrepância mantêm-se, uma vez que se incluirmos o desporto escolar e universitário, Braga tem cerca de 1500 atletas de 52 modalidades, sendo que pouco mais de 50 são referentes ao desporto adaptado organizado, com apenas quatro modalidades”, disse Sameiro Araújo, sublinhando que este projeto “contribui para que Braga tenha uma oferta desportiva eclética e variada para os cidadãos com deficiência”.

Este projeto conta ainda com a parceria da União de Freguesias de Ferreiros e Gondizalves, que cede o Pavilhão Municipal de Ferreiros gratuitamente para a realização das atividades, assim como a Associação Synergia que disponibiliza o seu espaço no Braga Shopping para a modalidade de escalada.

As atividades têm horários e dias já definidos para a sua realização. À segunda-feira, entre as 10h00 e as 12h00, decorrem as aulas de dança, e das 14h00 às 16h00 é a vez do karaté. O Snagolfe tem lugar à quinta-feira entre as 10h00 e as 12h00 e o atletismo decorre à sexta-feira das 10h00 às 12h00. Todas estas atividades têm como palco o Pavilhão Municipal de Ferreiros. Já a modalidade de escalada, que decorre no espaço Synergia do Braga Shopping, tem lugar à terça-feira, das 10h00 às 12h00 e à quinta entre as 14h00 e as 16h00.

Fonte: Braga TV

Presidente do Comité Paralímpico sonha com a profissionalização dos atletas

Humberto Santos apontou hoje a profissionalização dos atletas como a meta para o próximo ciclo até Tóquio2020, escusando-se, contudo, a revelar se vai recandidatar-se à presidência do Comité Paralímpico de Portugal (CPP).

"Nós nestes quatro anos temos de criar condições de trabalho totalmente distintas para todos os agentes envolvidos. Para os atletas, para os treinadores. Todos têm de ter condições diferentes, porque não é possível mantermos este nível de amadorismo que temos tido", defendeu Humberto Santos, em declarações à margem do oitavo aniversário da entidade.

O dirigente considerou que os atletas paralímpicos nacionais têm feito "um trabalho extraordinário", uma vez que muitos trabalham durante o dia e treinam apenas à noite, e sublinhou que estes necessitam de mais apoios.

"O maior apoio pode não ser só financeiro. Há também a necessidade de encontrarmos outras formas de disponibilização daqueles que são hoje profissionais noutras áreas e não querem fazer a sua desvinculação profissional. Temos de encontrar aqui um conjunto de medidas que associadas possam ajudar. Nalguns casos será, incontornavelmente, financeira. Mas não só: há também o quadro legal que precisa de ser ajustado", começou por enumerar, antes de se deter com o argumento de que, em primeira instância, o tema tem de ser debatido com o Governo português.

Em cima da mesa estará a celebração de um novo contrato-programa para Tóquio2020, que suceda ao dos Jogos Rio2016, que rondou os 3,6 milhões de euros.

Apesar dos projetos para o futuro, Humberto Santos não sabe se embarcará num quarto ciclo paralímpico. "Vamos ver. É uma decisão que não está tomada. Vamos ponderar sobre essa situação dentro de algum tempo. As eleições no CPP têm de ser feitas até 31 de março e até lá muita coisa pode vir a acontecer", disse.

No entanto, o máximo responsável pela entidade espera que, independentemente da sua decisão, pelo menos alguns elementos que fazem parte da atual Comissão Executiva se mantenham na direção do CPP.

"Considero que o trabalho que têm feito tem sido muito meritório, o reconhecimento público que está a ser feito ao trabalho do CPP é fruto desse trabalho muito intenso, dedicado, determinado. E eu, como cidadão, não gostaria de ver perder esta dinâmica, até porque nós temos um grande desafio. O grande desafio é aumentar as condições de trabalho para atletas e federações, ou seja, criar condições para haver uma maior equidade no tratamento financeiro deste projeto", destacou.

Santos, que frisou não estar a menosprezar as capacidades de futuros candidatos, acredita que com a saída de todos os elementos da direção, o Comité poderia perder informação, conhecimento e até capacidade de interação.

Nos Jogos Paralímpicos Rio2016, subiram ao pódio Luís Gonçalves, nos 400 metros T12 (deficiência visual), Manuel Mendes, na maratona T46 (deficiência motora), José Macedo, no torneio individual de boccia BC3 e a equipa de boccia BC1/BC2, constituída por António Marques, Abílio Valente, Fernando Ferreira e Cristina Gonçalves.

Além das quatro medalhas, os atletas garantiram 25 diplomas, número também superior aos 16 conseguidos em Londres2012.

Fonte: Sapo Desporto

sábado, 24 de setembro de 2016

Governo atribui 5 milhões para adaptar espaços públicos e turísticos a pessoas com deficiência

O Governo lançou sexta-feira, dia 23/9/2016, duas linhas de financiamento no valor global de 5 milhões de euros para promover a adaptação dos espaços públicos e turísticos a pessoas com deficiência, revelou à Lusa a secretária de Estado do Turismo.

“Vamos tentar acelerar a preparação e a capacitação dos nossos destinos para estarem em condições de receberem todas as pessoas. Vamos lançar guias de apoio à adaptação de espaços públicos, hotéis, restaurantes e [espaços de] animação turística para pessoas com mobilidade [reduzida] e vamos também lançar duas linhas de financiamento”, disse a secretária de Estado do Turismo, Ana Mendes Godinho.

Esta iniciativa insere-se no âmbito da Semana do Turismo, que hoje se inicia e que decorre até ao dia 01 de outubro, com iniciavas em várias zonas do país.

As linhas de financiamento e apoio que hoje serão apresentadas inserem-se no programa “All for All” e destinam-se “quer aos municípios, quer à oferta turística, para se prepararem e adaptarem para estarem aptos a receber todas as pessoas”, destacou Ana Mendes Godinho.

“Serão lançadas duas linhas: uma para apoio à adaptação dos espaços públicos e outra para apoio à reconversão e adaptação de hotéis, alojamento turístico, restauração e animação turística, no valor global de cinco milhões de euros”, explicitou a governante.

A tónica desta Semana do Turismo, cujo Dia Mundial se assinala a 27 de setembro, assenta no apoio à inclusão, sendo o “All for All” “um programa inclusivo que pretende sensibilizar os operadores turísticos para as necessidades das pessoas com deficiência”, destacou ainda a secretária de Estado.

Entre as várias iniciativas que se realizam ao longo desta semana, de destacar o lançamento hoje, em Elvas, da linha de apoio a projetos Wi-Fi, que visam a instalação de redes de acesso gratuito à internet em centros históricos, com o intuito de atrair turistas a outras zonas do país.

No próximo dia 28, em Coimbra, será lançado o Revive, um programa conjunto dos ministérios da Economia, da Cultura e das Finanças, que pretende valorizar o património ao abandono.

Neste dia, o Governo vai anunciar dez dos 30 edifícios que, até ao final do ano, vão ser concessionados a privados, com o compromisso de que sejam recuperados, reabilitados e acessíveis ao público. Um dos edifícios abrangidos será, segundo Ana Mendes Godinho, o Mosteiro de Santa Clara, em Coimbra.

Será ainda lançado esta semana o programa Algarve 365, com iniciativas diárias ao longo de 365 dias para combater a sazonalidade e atrair turistas o ano inteiro.

Fonte: Observador

Deputado Jorge Falcato faz Governo repensar corte na isenção de IUC para deficientes

O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais manifestou hoje disponibilidade para acolher propostas do BE para aumentar o limite de isenção de imposto de circulação a carros para deficientes e que novas regras não incluam carros já comprados.

"Não vê o Governo nenhuma objeção a que seja corrigido o limite por forma a que sejam abrangidos outros veículos que mereça abranger", anunciou Fernando Rocha Andrade no parlamento.

Esta tinha sido uma reivindicação enunciada antes pelo deputado do BE Jorge Falcato e constante de uma apreciação parlamentar apresentada pelos bloquistas, assim como a que foi também acolhida de que se "deve apenas aplicar aos carros futuramente adquiridos" e não a carros que as pessoas já possuam.

O deputado do CDS-PP João Almeida tinha criticado outra norma do diploma, defendendo que "sujeitar as pessoas com deficiência a terem um determinado nível de emissões de CO 2 nas suas viaturas para poderem continuar a ter isenção é de uma insensibilidade social totalmente inaceitável".

"O que está em causa não é a deficiência da pessoa, o nível de deficiência, a percentagem de deficiência, não é se o carro polui mais ou menos. Como se as pessoas que têm uma dificuldade tivessem agora de se preocupar com o nível de Co2 da sua viatura para puderem continuar isentos. É uma vergonha", defendeu.

Jorge Falcato, do BE, contrapôs que, do estudo de mercado que fez, concluiu pela "existência de uma grande oferta de automóveis com características adequadas ao transporte de cadeira de rodas, que correspondem aos parâmetros estabelecidos neste decreto de lei, que têm emissões abaixo de 180 gramas de CO2".

"Não há grande problema aí, o problema está com as carrinhas, porque alguns modelos ultrapassam o patamar de isenção introduzido por este decreto de lei. Nós não defendemos a benesse de compra de carros de luxo só porque uma pessoa tem uma deficiência, defendemos que é necessário que as pessoas tenham acesso a carros adequados à sua deficiência", afirmou.

Fonte: DN

Alunos com deficiência impedidos de ir à escola

O caso, esta quinta-feira noticiado pelo CM, de Flávio Angélico, de 5 anos, criança com multideficiência que está impedida de ir à escola, na Moita, por falta de um auxiliar, está longe de ser exemplo único.

Dezenas de alunos com deficiência continuam em casa mais de uma semana após o arranque das aulas, devido à falta de funcionários para os apoiar ou acesso a transporte escolar. "As escolas iniciaram o ano letivo com um número muito reduzido de assistentes operacionais e não conseguem ter elementos para apoiar os casos que precisam de apoio permanente", afirmou ao CM Ana Simões, responsável da Fenprof pela Educação Especial. 

A estrutura sindical anunciou para hoje uma conferência de imprensa onde vai denunciar diversos casos de incumprimento da lei. Um deles é o de um agrupamento na Grande Lisboa onde mais de meia centena de alunos com deficiência está impedida de frequentar a escola. A falta de transporte escolar está também a afetar alunos que frequentam escolas com unidades especializadas.

 A Fenprof denuncia pelo menos dois casos no concelho da Amadora. Nas situações em que os alunos frequentam unidades fora da área de residência, o Estado tem de pagar transporte.

Fonte: CM

quarta-feira, 21 de setembro de 2016

António Costa volta a prometer prestação única para a pessoa com deficiência

O secretário-geral do PS afirmou dia 17/9 que o Governo estabeleceu como meta que, no final de 2017, todos os portugueses tenham acesso a médico de família e prometeu que adotará a prestação única para a pessoa com deficiência.

Este objectivo foi assumido por António Costa no encerramento da ‘rentrée' política do PS, em Coimbra, num discurso que dedicou em larga medida a questões sociais como a qualificação, o acesso à educação e à saúde, a inclusão e o combate às discriminações, sobretudo no que respeita a pessoas com deficiência.

Com o fundador do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e também presidente honorário do PS sentado na plateia, António Arnaut, o líder socialista sustentou a tese de que o seu Governo iniciou funções com cerca de 1,2 milhões de portugueses sem médico de família, número que se reduzirá no início de 2017 para cerca de 500 mil.

"Não estamos conformados e vamos continuar a trabalhar para daqui a um ano podermos dizer que deixou de haver portugueses sem acesso a médico de família", declarou, antes de prometer igualmente novas valências ao nível de Unidades de Saúde Familiares, sobretudo no que respeita à saúde oral.

Ainda em matéria de Estado social, o primeiro-ministro referiu que já existem desde o princípio do ano mais 684 camas destinadas a cuidados continuados e que, em breve, ao nível da concertação social, "arrancará a discussão sobre a estratégia de combate à pobreza infantil".

Na sua intervenção, o secretário-geral defendeu que, atualmente, o principal combate contra a discriminação social é a que atinge cidadãos com deficiência.

O primeiro-ministro falou então "numa prestação única para as pessoas com deficiência, com uma base comum, mas com uma segunda componente que tome em linha de consideração as necessidades específicas de cada um".

"Um adulto, por exemplo, já não precisa de uma componente de apoio para a educação, e um idoso pode precisar de cuidados reforçados na saúde. Por isso, para sermos mais eficazes, temos de ter uma base diferenciada de apoios em função das necessidades específicas de cada pessoa com deficiência", justificou.

António Costa falou ainda numa terceira componente dessa prestação única, que "deverá variar em função do rendimento, porque também entre as pessoas com deficiência é preciso combate as desigualdades com origem no rendimento e apoiar mais quem mais precisa".

"A prestação única é uma ambição histórica de todas as associações representativas de pessoas com deficiência, apoiando-se mais quem mais necessita, quem mais necessidades apresenta ao nível de apoios específicos e quem menores rendimentos dispõe. Esta será uma mudança estrutural para deixarmos de ter uma sociedade de incluídos sem deficiência e de excluídos com deficiência", acrescentou.

Fonte: Jornal de Negócios

Comitiva paralímpica recebida em festa em Lisboa

"Superámo-nos. Quero deixar uma palavra de consideração a atletas, treinadores, aos parceiros de competição e todos os que contribuíram para a coesão deste grupo onde todos nos manifestámos satisfeitos pelos resultados dos outros colegas", afirmou Rui Oliveira, chefe da missão portuguesa.

Já Humberto Santos, presidente do Comité Paralímpico de Portugal fez um balanço positivo da prestação portuguesa. "Quatro medalhas, em Londres, em 2013, três. O número de diplomas foi significativo, tínhamos 37 atletas em competição, 25 dos quais conseguiram estar entre os oito melhores do mundo", enalteceu o dirigente.

Manuel Mendes (Maratona T46 ) Luís Gonçalves (400 metros T12), José Carlos Macedo (boccia/torneio individual BC3) e a equipa BC1/BC2 de boccia (Abílio Valente, António Marques, Cristina Gonçalves e Fernando Ferreira), conquistaram as medalhas portuguesas no Rio, todas elas de bronze.

Assista AQUI á reportagem.

Acessibilidades em Lisboa

Não sei como nem quando acabarão todas estas obras em curso, mas estamos mais que a tempo de vistorias para verificar se cumprem os requisitos da livre acessibilidade. Pode garantir que isso acontece?

Caro Presidente da Câmara Municipal de Lisboa,

Neste tempo de estaleiro e obras, neste caos que atravessa várias avenidas, ruas e artérias da cidade, antecipando já o inferno que se segue quando começar o mau tempo e o trânsito ficar ainda mais demorado do que já está, não consigo não lhe escrever uma carta aberta. Por muitas razões, mas em especial por nesta semana ter sido inundada de testemunhos reais brutais, relatos em primeira primeira mão, de pessoas com mobilidade reduzida ou altamente condicionada por serem cegos ou portadores de outras deficiências. Fui inundada de escritos por eu própria ter escrito uma crónica neste mesmo jornal sobre a necessidade imperativa de calçarmos os sapatos uns dos outros. Mais precisamente, sobre a urgência de nos sentarmos em cadeiras de rodas para tentarmos perceber como vivem e o que sofrem todos os que se deslocam desta forma dia após dia, durante vidas inteiras.

Entre esses relatos, houve um que gritou mais alto e continua a gritar, num eco quase insuportável que me faz ter este impulso de lhe escrever, tentando pousar directamente sobre a sua secretária, no seu gabinete, uma carta que não se perca nos labirintos administrativos, por assim dizer.

Ainda antes mesmo de lhe dizer o que gostava de dizer, validando o que de bem tem feito fazer nesta cidade, mas pedindo também que ouça estes e outros gritos, começo por transcrever o testemunho de Carlos Nogueira, 49 anos, paraplégico desde os 14 meses depois de ter tido poliomielite em virtude de não ter sido vacinado, devido a uma ruptura de stock de vacinas. Vivia no interior de Angola.

“Certa noite, depois de cumprir a minha jornada de trabalho e de assistir às aulas na universidade em regime pós laboral, cheguei a casa (na minha anterior morada) por volta das 00h00. Estava cansado e a desejar cair na cama para recuperar forças e repetir a dose no dia seguinte. Chovia muito e ao chegar junto à porta do meu prédio verifico que mais uma vez o lugar de estacionamento que me estava reservado pela CMLisboa se encontrava ocupado. Acontece quase todos os dias, mas naquela noite, como se não bastasse, tinha dois carros estacionados em frente, à entrada do prédio, que, de tão próximos, apenas deixavam entre si espaço para passar uma pessoa em pé.

Ora, a minha cadeira de rodas mede 60cm de largura pelo que dei comigo a perceber que, se calhar, teria que ficar na rua naquela noite em que chovia torrencialmente…

Liguei para a PSP da área, de onde me responderam não ser possível fazer nada porque àquela hora não tinham reboques disponíveis para resolver a situação e nem sequer foram autuar os infractores. Chovia demais para isso, talvez.

Pensei ligar à minha irmã ou a um vizinho para me ajudarem, mas entre os vários telefonemas para a PSP, passou mais de hora e meia, já era tarde e achei que não devia incomodar pessoas que também tinham compromissos no dia seguinte e a necessidade e o direito ao seu repouso. Ali fiquei dentro do carro sem saber o que fazer, já com as lágrimas a correrem cara abaixo…

Reagi e optei por ir estacionar o carro longe de casa (onde encontrei lugar) e vir de cadeira de rodas, com a dificuldade agravada de ter de andar num piso de calçada. Lá consegui chegar junto da entrada do meu prédio completamente encharcado pela chuva e pelas lágrimas que não parava de chorar. Ali chegado, ainda tinha que vencer um último obstáculo: os dois carros estacionados em frente da porta.

De que forma o fiz? Da única possível: desci da minha cadeira para o chão, rastejei entre os dois carros a tentar nunca largar a cadeira de rodas, arrastando-a sempre comigo, depois consegui encontrar maneira de a elevar de forma a conseguir passá-la, à força de braços, por cima dos carros, tudo isto sempre debaixo de chuva intensa, até que finalmente consegui voltar a sentar-me na cadeira. Acho que ninguém imagina o esforço de ter de subir do chão para uma cadeira de rodas contando unicamente com os braços.

Consegui finalmente entrar no prédio, com a roupa suja e rasgada, ferido de uma raiva incomensurável. Naquele momento senti que, para as autoridades do meu país, não passava de um número que só tem peso na hora de ser chamado a honrar as suas responsabilidades perante um estado que o ignora e lhe vira as costas todos os dias!”

O que me faz escrever é isto, Senhor Presidente. É saber que episódios como este são recorrentes, diários, numa cidade como Lisboa, onde cidadãos e autoridades nem sempre cumprem os seus papéis. Uns porque insistem em estacionar os carros onde não devem, outros porque aparentemente se esquecem de fiscalizar o que deviam.

Todos os testemunhos que recebi me fizeram ligar de volta a quem enviou contactos, mas também a outras pessoas com mobilidade reduzida que vivem apostadas em tentar melhorar as condições de vida nesta cidade. A boa notícia é que todos reconheceram que a cidade está muito melhor. Nos últimos anos aconteceram coisas extraordinárias em Lisboa, muito para além da emblemática sucessão de passadeiras rebaixadas, com piso tactil, no perímetro da Av. Alexandre Herculano, que realmente permitem a cegos e a pessoas em cadeiras de rodas circularem com mais conforto. Falo de passeios mais largos e caminhos alternativos espalhados por vários pontos da cidade que já permitem ou vão permitir que muitas pessoas os possam percorrer com mais conforto e liberdade.

Mas há tanto por fazer, que não podemos descansar nem um segundo. As autoridades camarárias têm absolutamente que vigiar melhor e multar mais as pessoas que estacionam indevidamente nos lugares prioritários ou para deficientes. A EMEL, que carrega consigo vários odiosos, tem que ser capaz de assegurar que ninguém ocupa indevidamente estes espaços e, neste zelo, provar que é mais pelos cidadãos do que contra eles. E mais, os passeios mal rebaixados têm que ser milimetricamente revistos e rapidamente refeitos, pois como escrevi na crónica anterior provocam quedas e fracturas expostas. À população em geral, mas acima de tudo a pessoas para quem uma ferida facilmente se transforma em escara e demora meses a cicatrizar. Meses de paralisia, frustração e desespero, como deve imaginar.

Não sei como nem quando acabarão todas estas obras em curso, mas à vista desarmada estamos mais que a tempo de vistorias detalhadas para verificar se cumprem os requisitos da livre acessibilidade. Pode garantir que isso acontece?

Quanto a transportes públicos, Senhor Presidente, estamos ainda pior que os passeios e as falsas rampas: no Metro os elevadores e escadas rolantes estão demasiadas vezes avariados; nas ruas os autocarros chegam e partem, sucedendo-se durante longas horas, sem terem condições para serem utilizados por pessoas em cadeira de rodas, porque os sistemas de elevação estão invariavelmente estragados. Ou seja, pessoas com necessidades especiais e sem carro próprio esperam e desesperam diariamente no Metro e nas paragens de autocarro, sem saberem o que fazer. Como A CP exige telefonemas diários e longos tempos ‘on hold’ para marcar idas e voltas em cadeiras de rodas e os transportes alternativos para deficientes também não chegam para as solicitações, tudo isto é altamente erosivo e devastador.

Mais coisas, Senhor Presidente? Os restaurantes! Os restaurantes baratos e caros que já existem ou acabam de abrir portas e nunca têm rampas nem casas de banho acessíveis. E os monumentos e edifícios públicos, sempre que se revelam inacessíveis e fazem bradar aos céus. E o pavimento das ruas! Não tendo V.Exª culpa nenhuma da calçada portuguesa que tanta beleza acrescenta a Lisboa, mas também tantas dores de cabeça (e pernas e braços) dá a quem nela escorrega e cai, acha que pode fazer o favor de atender às queixas mais que legítimas dos cidadãos que não podem percorrer livremente zonas recém-recuperadas como a Ribeira das Naus e outras, por ter sido ali colocado um piso altamente trepidante (e inseguro até para motas, dadas as pedras arredondadas que marcam o eixo da via) e não terem sido acautelados certos preceitos que possibilitariam uma melhor circulação. Sei que sabe que a trepidação da calçada aumenta exponencialmente os espasmos, dores e desconfortos dos deficientes e, por saber que sabe isso, fico um pouco mais descansada.

Termino esta carta aberta, que para si já vai longa, mas para mim e certamente para todos os que sofrem as vicissitudes de uma cidade de mobilidade difícil, ainda só vai no início. E termino partilhando consigo, enquanto cidadã, as responsabilidades que nos cabem. A uns, gritar, a outros amplificar esses mesmos gritos e a outros tomarem as decisões certas para evitar mais sofrimentos desnecessários.

Laurinda Alves no Observador

Resultados dos Paralímpicos "ficam para a história"

O presidente do Comité Paralímpico de Portugal considerou este domingo que os Jogos Rio2016 vão ficar para a história do desporto luso, mas voltou a defender a necessidade de o país tratar de forma igual os atletas de excelência.

Num balanço logo após o final das competições, Humberto Santos destacou o facto de Portugal sair dos Jogos Rio2016 com quatro medalhas, todas de bronze, superando as três conseguidas há quatro anos em Londres2012.

"Desde Sydney2000 que tínhamos vindo a diminuir o número de medalhas conquistadas, desta vez conseguimos inverter essa tendência. Além disso, temos de associar as quatro medalhas a um conjunto de resultados de excelência e ao surgimento de atletas de grande relevância desportiva", afirmou, acrescentando: "Os Jogos do Rio vão ficar para a nossa história".

Humberto Santos frisou que "os objetivos do contrato-programa foram mais do que cumpridos, mas também foram cumpridos os objetivos internos do CPP, que eram ter uma prestação semelhante à dos Jogos Londres2012".

No final das competições dos Jogos Rio2016, o presidente do CPP considerou que as quatro medalhas de bronze conquistadas - duas no boccia e duas no atletismo - mostram que "apesar do aumento qualitativo, Portugal até está a conseguir acompanhar outros países".

Com o contrato-programa em vigor até 2017 e ainda sem ter tomado uma decisão sobre uma eventual recandidatura à presidência do CPP, Humberto Santos considerou essencial uma aproximação cada vez maior entre as condições dadas aos atletas olímpicos e paralímpicos.

"Estamos a falar de atletas de excelência, que estão a ser tratados pelo mesmo país de forma diferenciada, e hoje com o nível que os Jogos Paralímpicos têm não há razão para haver essa diferenciação", referiu.

Apesar do contrato-programa de preparação para o Jogos Rio2016, que rondou os 3,6 milhões de euros, ter superado em cerca de 1,5 milhões de euros o de Londres2012, Humberto Santos referiu que o aumento das verbas não é a questão central.

"Não podemos ficar por uma questão de duplicação de verbas, temos de criar condições para haver um tratamento de equidade dos atletas de excelência do nosso país. Temos sugestões, temos propostas. Agora vamos para a mesa de negociações tratar disso", disse.

Humberto Santos reiterou a ideia de que é preciso olhar para os Jogos Paralímpicos, que nesta edição juntaram 4.350 atletas de 164 países, como um evento multidesportivo de alta competição.

"Aquele olhar para os Jogos Paralímpicos enquanto espaço de confraternização, ao qual as pessoas vinham para fazer umas provas, passou à história. Estamos a falar de competição ao mais alto nível, e para isso temos de ter as melhores condições que o país puder disponibilizar", disse o presidente do CPP, organismo que completa oito anos de existência no final deste mês.

Nos Jogos Rio2016, Portugal esteve representado por 37 atletas, que competiram em sete modalidades - tendo-se estreado no judo e no tiro -, facto que leva o presidente a afirmar que a renovação do desporto paralímpico está a ser feita, apesar de haver modalidades nas quais isso está a ser feito mais rápido do que noutras.

"A renovação está a ser feita de forma gradual, estão a chegar novos atletas. Aqui nos Jogos Rio2016, houve um acréscimo de modalidades e aumentámos o número de medalhas e de resultados de excelência, o que para nós foi decisivo", disse.

Nos Jogos Paralímpicos Rio2016, subiram ao pódio Luís Gonçalves, nos 400 metros T12 (deficiência visual), Manuel Mendes, na maratona T46 (deficiência motora), José Macedo, no torneio individual de boccia BC3 e a equipa de boccia BC1/BC2, constituída por António Marques, Abílio Valente, Fernando Ferreira e Cristina Gonçalves.

Além das quatro medalhas, os atletas garantiram 25 diplomas, número também superior aos 16 conseguidos em Londres2012.

Após a sua nona participação paralímpica, Portugal soma agora 92 medalhas paralímpicas, com o atletismo a liderar o número de conquistas, com 53, seguido do boccia, com 26.

Fonte: JN

Um novo modo de olhar a deficiência

O ensaio “Pessoas com deficiência em Portugal”, de Fernando Fontes, vale cada minuto que nele se possa empregar. É tão pouco o que nós, sociedade, sabemos sobre esta realidade. Nem sequer percebemos o quão não inocente é a forma como tendemos a encarar as pessoas com deficiência.

“Das culturas clássicas às sociedades modernas a diferença tem sido, não raras vezes, transformada em factor de exclusão e de discriminação em benefício da hegemonia daquilo que é considerado normal”, começa por explicar aquele investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra. E isso é cristalino quando o assunto é deficiência.

O desenvolvimento da ciência moderna teve o condão de arrumar a visão mágico-religiosa. Em contrapartida, potenciou o controlo da vida destas pessoas pela medicina e pelos profissionais da saúde, o que fez florescer estruturas segregadoras. A deficiência deixou de ser demonizada, foi “reduzida às falhas do corpo”, passou a ser vista como “uma tragédia individual”.

No Portugal de hoje, como em muitos outros países, há um modo hegemónico de pensar a deficiência. Entende-se que as pessoas têm um problema que é delas, que é médico, que deve ser tratado; que as suas limitações “derivam directamente das suas incapacidades reais ou imputadas”; que elas têm necessidades especiais e têm de se esforçar para se adaptarem ao meio que as rodeia.

Uma nova perspectiva já vingou noutros países e está a ser impulsionada em Portugal por alguns activistas que agem em nome individual, como Eduardo Jorge, e por novos movimentos, como o (D) Eficientes Indignados. Em seu entender, “não é a deficiência que impede a pessoa de participar na vida em sociedade, mas sim a forma como a deficiência é socialmente construída”; “as barreiras sociais, políticas, físicas e psicológicas criadas pela sociedade é que limitam a vida das pessoas”. Cabe à sociedade remover obstáculos, preparar-se para a diferença.

O investigador critica o modelo dominante, médico ou individual, e revê-se neste modelo social. “O foco na construção social da deficiência não nega, de forma alguma, a experiência do corpo e o impacto das incapacidades na vida das pessoas com deficiência; procura, sobretudo, prevenir um excesso de atenção aos aspectos biológicos que tem criado a ideia de que se trata de um problema eminentemente individual e médico, absolvendo a sociedade e as suas lógicas de funcionamento na produção de exclusão de pessoas com deficiência”, argumenta.

O livro, agora editado pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, é resultado de muitos anos de estudo. Com base em dados concretos, Fernando Fontes acusa a sociedade e o Estado de desrespeitarem as pessoas com deficiência, convidando para a mudança. Já há qualquer coisa a acontecer, nota. Em Portugal, estão a ser dados os primeiros passos para encontrar soluções de vida independente para pessoas com deficiência, em detrimento dos lares residenciais, que, apesar de terem crescido (e melhorado) nos últimos anos, nem chegam para as encomendas.

Fonte: Dnoticias.pt

Qual é a situação das pessoas com deficiência em Portugal?

Pressão nas famílias, pobreza, falta de inclusão, barreiras físicas e sociais por resolver. Fernando Fontes diz que somos mais condescendentes com quem “fica deficiente” do que com quem “nasce deficiente”; sublinha que vemos a deficiência como uma sentença de morte e refere que só quando temos de andar com um carrinho de bebé num pavimento desnivelado é que percebemos as dificuldades de uma pessoa em cadeira de rodas.

O sociólogo e investigador do Centro de Estudos Sociais da Universidade de Coimbra, especialista em políticas de deficiência e crimes de ódio contra pessoas com deficiência, é o autor do ensaio “Pessoas com deficiência em Portugal”, da Fundação Francisco Manuel dos Santos. Em entrevista ao Observador, conta tudo o que viu e aprendeu sobre a deficiência.

No livro fala numa tríade de fenómenos ligados à deficiência: opressão, pobreza e exclusão social. A deficiência nunca vem sozinha?
Muito dificilmente. Os recentes estudos dizem que existe uma forte ligação entre a deficiência e estes fenómenos. A opressão e a falta de inclusão têm a ver a forma como as pessoas com deficiência são vistas na sociedade portuguesa. São vistas como sendo inativas e como não tendo capacidade de trabalho. O seu corpo é perspetivado como um objeto estranho.

E a parte da pobreza? São pessoas que têm muitos gastos e, ao mesmo tempo, têm poucas possibilidades de arranjar emprego?
Exatamente. Têm custos acrescidos porque vivem em sociedades que não estão abertas à diferença, com constantes barreiras à participação e à mobilidade. Os subsídios são mínimos. O subsídio mensal vitalício, para pessoas com mais de 24 anos, é de 176,76€. Alguém consegue viver neste país com este valor? Há despesas médicas acrescidas, há despesas de deslocação que é preciso ter em conta, uma vez que os transportes públicos muitas vezes não são acessíveis a estas pessoas. E mais: há que ter em conta o custo de ter um elemento da família a despender imenso tempo com aquela pessoa.

A família pode sofrer tanto ou mais que a pessoa com deficiência?
Sim, até porque muitas das consequências abatem-se sobre a família. O que eu verifiquei na minha investigação é que, no caso das crianças, a grande maioria das mães acaba por deixar o posto de trabalho ou por perdê-lo. Ter uma criança com deficiência significa levá-la muitas vezes à terapia e ter consultas médicas que podem durar uma manhã inteira ou um dia inteiro. Aquela mãe perde uma manhã inteira de trabalho para estar ali. Isto tem um impacto direto na sua vida profissional e depois, quando é altura da renovação do contrato, isso não acontece. Ou então acaba por deixar o seu local de trabalho, uma vez que não confia nos serviços de saúde para tomar conta do filho, ou sente-se responsável e acaba por ficar em casa a tomar conta dele.

Os pais têm medo do que vai acontecer aos filhos depois de morrerem?
Sim, sem dúvida. Têm pânico de morrer. Pensam muito no que vai acontecer aos filhos. Por isso é preciso dar ferramentas às pessoas com deficiência para que elas se autonomizem e para retirar alguma pressão das famílias.

E como é que isso se faz?
Estamos a dar passos importantíssimos em Lisboa com o projeto “Vida Independente”, financiado pela Câmara Municipal de Lisboa. Foi constituído um Centro de Vida Independente (CVI) que tem funcionários que são assistentes pessoais das pessoas com deficiência e que as ajudam nas tarefas do dia-a-dia, como a higiene pessoal, o vestir, acompanhar ao trabalho, acompanhar à universidade, preparar refeições, e tudo o que aquela pessoa não consiga fazer sozinha. É preciso fazer uma avaliação às competências das pessoas com deficiência, para determinar o número de horas de assistência que necessitam. E depois são essas pessoas que pagam ao assistente pessoal, com o dinheiro do projeto. E podem recrutar, treinar e gerir o seu assistente, sem a mediação de terceiros.

O que é que isto vai fazer? Vai autonomizá-las das suas famílias. Vai dar-lhes as rédeas da sua vida e das suas decisões. Isto não significa que estas pessoas venham a ser independentes, até porque nenhum de nós é totalmente independente. Todos nós somos dependentes de um conjunto de coisas: de tecnologias, de eletricidade, de água… Isto significa, sim, que estas pessoas têm um apoio para poderem funcionar na sociedade. A ideia é que depois o projeto seja implementado em outros municípios.

Ainda sobre a família. Também há algumas que se separam por causa da deficiência, certo?
Sim, sobretudo em casos de deficiência adquirida. Por exemplo, eu estive envolvido num projeto de pessoas com lesão medular, que é uma lesão que pode acontecer por causa de um acidente ou por infeção na espinal medula. É uma coisa repentina — uma pessoa tem uma vida sem qualquer incapacidade e, de um momento para o outro, fica paraplégica ou tetraplégica. Isto depois tem um impacto muito grande nas relações dos casais. Muitas vezes as pessoas acabam por se divorciar, porque há uma “deserotização” da relação. Um dos elementos do casal transforma-se num prestador de cuidados ao outro. E tem sempre o peso todo sobre si. É uma pressão enorme.

No livro diz que somos mais condescendentes com a deficiência adquirida do que com a deficiência de nascença. Porquê?
É uma postura que já dura há séculos. Há visões diferentes. No caso da diferença congénita, basta falarmos com pessoas de mais idade. Trabalhei com crianças dos 0 aos 6 anos com deficiência visual, que nasceram assim, e fiz a minha tese de mestrado em políticas de apoio a famílias de crianças com deficiência visual. Nas entrevistas era recorrente ouvir pessoas a dizer: “Ai, valia mais que Deus o levasse!”. Ou seja, valia mais que tivesse morrido, que não tivesse nascido. Isto é uma coisa que magoa muito os pais e que muita gente diz. A ideia de vida humana que está aqui, sobre o que é ou não viável, é absolutamente terrível.
Por outro lado, quando a deficiência é adquirida num momento da vida, há mais condescendência. Em termos históricos, as crianças com deficiência eram abandonadas para morrerem, mas se fosse uma deficiência adquirida em resultado da guerra já havia médicos para tratar — na altura das Cruzadas, foram criados abrigos para homens que cegaram. A grande maioria dos direitos que as pessoas com deficiência hoje têm em Portugal, ao nível da Segurança Social, foram estabelecidos após o 25 de abril. Estes direitos foram para os deficientes das Forças Armadas — os militares que lutaram na Guerra Colonial e que regressam a Portugal. Isto ajudou a criar alguma consciência política da sua situação.

No livro fala em “crimes de ódio” contra deficientes. Não é um pouco estranho usar esta expressão aqui? Porque é que associamos mais um “crime de ódio” ao racismo, por exemplo?
Bom, historicamente os crimes de ódio surgem ligados aos crimes de racismo, de xenofobia ou até da homofobia. Mas percebo a questão. Para nós, no caso das pessoas com deficiência, é um pouco inconcebível: “Como é que as pessoas podem odiar as pessoas com deficiência?”. Mas é assim. Um crime de ódio contra uma pessoa com deficiência é um crime cometido com base no preconceito. Os agressores têm um conjunto de ideias sobre estas pessoas que as leva a atacá-las, a assaltá-las e a violá-las.

O abuso sexual e a violação são os principais crimes cometidos contra estas pessoas em Portugal, certo?
Sim, são sobretudo crimes de abuso sexual e violação. As vítimas são mulheres entre 20 e 30 anos com dificuldades de aprendizagem e deficiência mental. Porque é que estes homens abusam destas mulheres? Porque existe a noção de que estas mulheres não são testemunhas credíveis e de que elas não vão dizer a ninguém o que está a acontecer, porque ninguém vai acreditar nelas. As vítimas até podem contar, mas ninguém acredita no que elas dizem. Depois, por cá, também há casos de escravização. Lembro-me de um caso de uma família no Norte que escravizou um afilhado durante 20 anos. Utilizavam-no para trabalhar na agricultura, ele vivia numa barraca ao lado da casa da família, comia os restos que sobravam da própria família.

Noutros países, como por exemplo em Inglaterra, os crimes têm outra natureza. Lembro-me do caso de uma senhora que tinha uma filha com deficiência intelectual e que foi atacada durante anos pelos jovens da comunidade. Anos a fio. Partiam-lhe os vidros, atiravam lixo para o jardim, pegavam fogo às árvores, destruíam-lhe as janelas. Ela ligava para a polícia e nada foi feito. Um dia, ela acaba por se suicidar. Vai para um beco, leva a filha dela, pega fogo ao carro e mata-se a ela e à filha.

Vamos às barreiras que ainda existem em Portugal. Ainda estamos na questão das rampas?
Ainda há imensas barreiras físicas, que se veem no dia a dia: as escadas que não têm rampas (ou que as têm mas que não respeitam as normas de inclinação), os elevadores que não têm a largura suficiente para uma pessoa em cadeira de rodas… Mas depois temos as barreiras psicológicas, que são as que têm a ver com o preconceito: as ideias preconcebidas sobre a pessoa com deficiência e sobre o seu corpo.

É como se se ficasse inútil?
Sim. Para já, olhamos para a deficiência como uma tragédia que acontece na vida daquela pessoa. E isso torna-a incapaz de trabalhar, incapaz de tomar conta da sua vida, incapaz de constituir família, incapaz de ter sexualidade. Incapaz de ter uma vida igual a qualquer outra pessoa. E isso não é verdade. Nós nem reparamos neste tipo de barreiras até passarmos por uma situação dessas. E isto verifica-se sobretudo na questão das barreiras físicas.

Por exemplo?
Olhe, você só repara que o piso não está em condições para uma pessoa em cadeira de rodas se tiver de circular numa cidade com um carrinho de bebé. É a primeira vez que se depara com isto. Agora imagine alguém que vive isto todos os dias. Naquele projeto que tivemos aqui no Centro de Estudos Sociais, que se chamava “Da lesão medular à inclusão social”, analisámos todo o processo de reabilitação médica, de estabilização e depois a reintegração na comunidade daquelas pessoas. Um entrevistado, que tinha estado no centro de Alcoitão, disse-nos: “Aquilo lá era um paraíso, era a terra prometida. Não há barreiras ali. Eu até me esquecia que sou uma pessoa com deficiência. Quando chego cá fora a um sítio e tenho umas escadas, há imediatamente um sininho a tocar a dizer: ‘Eu sou uma pessoa com deficiência'”.

Mas o que é que impede a integração plena das pessoas com deficiência?
As nossas sociedades são herdeiras de uma cultura que nunca foi simpática para as pessoas com deficiência. As nossas bases estão na Grécia e na Roma antiga, que eram sociedades muito centradas na perfeição do corpo e do culto da beleza. A deficiência era absolutamente excluída. As crianças com deficiência nas sociedades gregas e romanas eram expostas e colocadas ao abandono em grutas, prestes a morrerem. Martinho Lutero dizia que as crianças com deficiência eram uma massa de carne quase sem alma e que valia mais deixá-las morrer. A própria Bíblia tem algumas noções da deficiência como forma de pecado e de impureza.

Mas a Igreja também está ligada à caridade e à ajuda aos deficientes.
Sim, a questão da caridade ainda prevalece na nossa sociedade. A moral judaico-cristã ainda nos molda muito. A Bíblia tem essas duas visões: a visão penalizadora da deficiência e a visão da caridade com os deficientes. Ao longo do tempo, a Igreja foi tendo um apoio importantíssimo a estas pessoas. Os primeiros abrigos, os primeiros hospitais, faziam parte da Igreja Católica.

Os Jogos Paralímpicos 2016 estão a terminar. Que efeito tem um evento destes na valorização das pessoas com deficiência?
Dão visibilidade. Dão voz e imagem às pessoas com deficiência. Se não tivéssemos os Paralímpicos, se calhar grande parte dos artigos da comunicação social sobre as histórias destas pessoas não saíam. Depois, integra estas pessoas no desporto. Existem desportos específicos para pessoas com deficiência e são pessoas que não iriam competir em pé de igualdade com pessoas sem deficiência.

Mas a questão do “herói” também pode ser complicada. Uma vez, uma senhora de uma direção de uma instituição perguntou-me: “Porque é que será que, para que a sociedade nos valorize, temos de ser os melhores em tudo aquilo que fazemos?” Na altura, eu percebi que aquele pensamento era uma forma de opressão social. Têm de ser os melhores porquê? A pessoa com deficiência tem de ser muito boa naquilo que faz para parecer que nem tem deficiência. Para mostrar que não é igual às outras pessoas com deficiência. Só aí é que ela é valorizada. É uma questão que merece cuidado.

No livro tem esta frase: “O aumento da esperança média de vida, os avanços da medicina e o envelhecimento da população transformaram cada ser humano numa potencial pessoa com deficiência”. Isto é um pouco assustador, não?
É, mas é a mais pura realidade. É um despertar para todos os nós. Tudo aquilo que nós fizermos para o bem-estar e para a qualidade de vida das pessoas com deficiência, pode influenciar-nos a nós também. Um acidente de carro, uma infeção, uma doença súbita. Todos nós podemos vir a ser pessoas com deficiência.

Fonte: Observador

sábado, 17 de setembro de 2016

Audição pública sobre Vida Independente na Assembleia da República

A implementação de projetos-piloto de Vida Independente foi incluída no atual Orçamento de Estado por proposta do partido Bloco de Esquerda. Trata-se de um primeiro passo para a materialização desta tão ansiada aspiração da comunidade de pessoas com deficiência e das suas familias.


Importa agora discutir que Vida Independente queremos.
-Quem deve gerir os projetos-piloto;
-Quem tem direito a participar e como;
-Quem serão os assistentes pessoais.

Estas e outras questões precisam de ser debatidas por nós. Com o objetivo de fomentar este debate, o Bloco de Esquerda promove uma audição pública que terá lugar na Assembleia da República, no dia 27 de setembro de 2016 ás 15h.

Gostariamos muito de contar com a sua participação nesta audição.

NADA SOBRE NÓS, SEM NÓS.

Entrada livre. Agradecemos a sua confirmação para:

cristina.andrade@be.parlamento.pt ou 213919066

Produtos para prevenir e tratar escaras

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São superfícies de apoio em silicone redistribuidoras de pressão e ajudam a proteger a pele em doentes de risco, como parte de um programa de prevenção de úlceras de pressão. Este deve incluir também o posicionamento regular do paciente em diferentes decúbitos e a inspecção da pele.

KerraProTM é feito a partir de silicone puro. O silicone é flexível, resistente e tem a capacidade de redistribuir a pressão e, deste modo, proteger a pele em zonas de proeminência óssea.

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Indicado como suplementação em indivíduos que apresentam úlceras de pressão ou feridas.

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Paralímpicos são “espetáculo grotesco” ou "paratotós"?

"Sou só eu a achar que os Jogos Paralímpicos são um espetáculo grotesco, um número de circo para gáudio dos que não possuem deficiência, apenas para preencher a agenda do politicamente correto?”, escreveu Joaquim Vieira.

Mais tarde, acrescentou uma nota à publicação, na qual dava conta de que a frase já lhe tinha valido “ameaças de morte”, para não falar das “pragas sobre os familiares mais próximos, que, coitados, não têm nenhuma responsabilidade no que penso e escrevo”.

No entanto, Joaquim Vieira admite que a forma “sintética” do post deu “origem a equívocos” e por isso, lamenta ter ferido a sensibilidade de muitos com esta opinião.

“Sou totalmente a favor da inclusão e dos direitos dos menos capacitados, e entendo mesmo que nesse terreno ainda existe muita coisa por fazer e reivindicar, designadamente quanto à vida quotidiana. Aceito também que tenham a ambição de enveredar por práticas desportivas, assim como de entrar em competição”, afirma o presidente do Observatório de Imprensa.

Na mesma nota explica ainda que a sua crítica se dirige ao “espetáculo montado com os Jogos Paralímpicos e não aos que neles participam”. “Choca-me a atribuição do estatuto de Jogos Olímpicos (ou equiparados) a estas provas, como se houvesse dois universos que se equivalessem ao mesmo nível e não se cruzassem (daí eu ter falado em apartheid desportivo). Mas Jogos Olímpicos só há uns, e, como eu também já disse, destinam-se a premiar os melhores da raça humana, homens e mulheres, em cada modalidade”, acrescenta.

Joaquim Vieira termina dizendo que não sabe a quem se destinam os Jogos Paralímpicos. “Condescendentes e paternalistas, os Jogos Paralímpicos criam nos seus participantes a ideia de que podem ser campeões (ou como os campeões) olímpicos. Não podem. Lamento desiludir muita gente, mas há só um Usain Bolt e um Mark Phelps. Não existe o Usain Bolt nem o Michael Phelps dos Paralímpicos. Por muito que alguns nos queiram convencer do contrário”. Fonte: Sol

Paralímpicos, paratotós

Resposta do Presidente da Pró-Inclusão – Associação Nacional de Docentes de Educação Especial, embaixador paralímpico em Pequim 2008.

Recentemente, um jornalista português referiu-se aos Jogos Paralímpicos com um espetáculo “grotesco” e “um número de circo”.

Estão ainda a realizar-se no Rio de Janeiro os Jogos Paralímpicos (JP). Trata-se de um evento que mobiliza muitos milhares de pessoas e que tem um impacto mediático incomparável com qualquer outra notícia que tenhamos acesso sobre as pessoas com condições de deficiência. Trata-se, sem dúvida, de um evento que desafia ideias feitas sobre a competição e a seleção “dos melhores”. Os JP atraem polémicas sobre múltiplos aspetos da atividade humana. Dou um exemplo: na cerimónia de abertura uma das portadoras da tocha olímpica que, com a ajuda de uma bengala, a conduzia com dificuldade, caiu durante o percurso. Perante o aplauso do estádio, levantou-se e levou a tocha até à pessoa seguinte. E pode-se perguntar: mas os aplausos não eram destinados aos que vão mais longe, aos que são mais fortes e aos que chegam mais alto (usando a trilogia dos Jogos Olímpicos da era moderna)?

Já tínhamos tido um indício da promoção de outros que não os “vencedores” na abertura dos Jogos Olímpicos quando a chama olímpica foi ateada por Vanderlei Lima, que tinha sido “só” medalha de bronze na maratona dos Jogos Olímpicos de Atenas em 2004. Relembrando, Vanderlei foi agarrado por um energúmeno quando ia em primeiro lugar na maratona e mesmo assim ficou em terceiro lugar. O que este realce mostra é que os Jogos são muito mais do que a celebração dos triunfadores, mas, como dizia Coubertin, o seu grande valor é a participação e a superação de cada um.

Quando pessoas com deficiência praticam este exercício de superação das suas capacidades pessoais suscitam múltiplos olhares e nem todos muito adequados. Cito dois deles: um que endeusa os atletas paralímpicos, dizendo que eles são os super-heróis, que são sobre-humanos. Quem diz isto, imaginaria que as pessoas com deficiência teriam igualmente uma deficiência na sua motivação, na sua determinação, no seu querer. Ao verem esta vontade férrea, imaginam que as pessoas com deficiência são mais que humanos. Na verdade – pensam elas – que humano teria esta tenacidade mesmo face a uma condição de deficiência? Esta atitude curiosamente retira aos desportistas com deficiência a posse das qualidades que lhe são comuns com qualquer outro desportista e por isso é, de certa forma, uma atitude que semeia a exclusão.

Outra é a atitude de grande desconforto, de perplexidade, por presenciar o desempenho de atletas com deficiência. Recentemente, um jornalista português referiu-se aos JP com um espetáculo “grotesco” e “um número de circo”. Não custa imaginar o desconforto destas pessoas ao ver um cego jogar futebol, ao ver um atleta com paralisia cerebral a jogar Boccia, ao ver um amputado de membro inferior a saltar em altura. Imagino o desconforto, mas não posso igualmente de deixar de imaginar a enorme ignorância e desumanidade que estas declarações demonstram.

Para as pessoas que acham que o lugar das pessoas com deficiência não são os espaços desportivos, para quem pensa que desporto não é para elas, deixo quatro pontos de reflexão.

Antes de mais as pessoas com deficiência têm direito, como quaisquer outras, a praticar desporto. Não aceitar isto seria uma grave violação dos seus direitos. Se não existisse este movimento paralímpico as pessoas com deficiência ficariam privadas da prática desportiva, ou pelo menos amputadas de uma das suas vertentes que é o desporto de alta competição. Será que alguém assume esta responsabilidade de amputar direitos a quem já tem tantos direitos amputados?

As pessoas com deficiência não se colocaram à margem do desporto: foi o desporto que as excluiu. Daí que o movimento do desporto paralímpico não seja um movimento de exclusão, mas sim de inclusão – isto é, de procurar recuperar uma prática que, se a nossa sociedade fosse menos segregadora, seria feita em estruturas e na companhia de atletas sem deficiência.

Os JP são uma fantástica contribuição para entender até onde os humanos (mesmo tendo uma condição de deficiência) podem chegar. Quantos estudantes universitários de desporto saltam, por exemplo, como um amputado de membro inferior, a marca de 1,89 metros? Os Jogos são uma fantástica demonstração das possibilidades quase ilimitadas que o ser humano pode desenvolver através da experiência e do treino.

Finalmente os Jogos Paralímpicos são uma cabal demonstração que o terno “de-ficiente” (“não eficiente”) é extraordinariamente injusto para designar quem de forma tão espetacular escancara os limites do desempenho humano. Os Jogos Paralímpicos mostram que, tal como o desporto, as pessoas com deficiência são úteis e são imprescindíveis para entendermos o que é “ser humano”.

Os jogos não são circo a não ser que consideremos circo todas as atividades humanas. Por exemplo: a vida de jornalista é um circo?

Os jogos não são grotescos. Grotesca – ainda que menos visível – é a segregação que estas pessoas sofreram e sofrem tendo sido injustamente condenadas a “vidas separadas”. Grotesca é a exclusão, grotesca é a invisibilidade a que milhões de pessoas estão condenadas a ser vistas como deficientes mesmo sendo “eficientes” e muitas vezes mais eficientes dos que aqueles que se permitem chamar grotescas às suas ações. Fonte: Público

NÓS: Entretanto os nossos atletas paralimpicos conseguiram trazer para Portugal, 3 medalhas de bronze:

-É de bronze a primeira medalha portuguesa nos Paralímpicos 2016


O que impede o desporto adaptado de evoluir?

Há talento, há competência e há comprometimento, mas há uma falha na cadeia de apoio aos praticantes que impede que o desporto adaptado vá mais longe. O diagnóstico é feito por Leonor Moniz Pereira, coordenadora da Pós-Graduação em Desporto Adaptado na Faculdade de Motricidade Humana. Em entrevista ao PÚBLICO, a professora catedrática sublinha a necessidade de uma maior articulação ao nível do ensino para facilitar a identificação de potenciais atletas.

Formar treinadores vocacionados para o desporto adaptado obriga a ajustes significativos no programa curricular? Que requisitos é que devem ter?
Há um padrão formativo genérico, mas com algumas especificidades. É preciso dar mais atenção à análise biomecânica do gesto e a avaliação da fisiologia do exercício tem de ser mais aprofundada, porque o tempo de recuperação dos atletas não é o mesmo e a sobrecarga exercida também varia. Puxar uma cadeira de rodas, por exemplo, é um movimento muito dependente do ombro e do braço, para além do tronco, e o corpo humano não está feito para a tracção feita pelo braço. Isso exige especificidade de conhecimento. Para não haver lesões e haver trabalho continuado, exige mais conhecimento específico.

De que forma é que o plano de treino se adapta às limitações individuais?
Partimos sempre de um padrão de treino, mais geral. Mas depois olhamos para cada atleta e temos de delinear um plano individualizado em função das características de cada um. Aquilo que tenho de saber é como introduzo no treino a assimetria entre o lado esquerdo e direito num atleta com amputação, por exemplo. Se há uma assimetria maior entre os lados esquerdo e direito, tenho de saber como é que ela influencia os exercícios. Tenho de fazer uma análise técnica e isso é mensurável.

E a gestão da fadiga precisa de atenção extra?
O esforço que cada um faz também depende muito da classe [funcional] em que o indivíduo se situa. Mas também depende muito do treino. Um dos grandes objectivos é conseguir incorporar a limitação no planeamento do treino. Quanto mais adaptado, menor será o gasto energético dos atletas. Qual a duração do treino, quantas vezes se treina, tudo deve ser feito em função do nível de desempenho do atleta naquele momento. No fundo, estamos a falar dos grandes princípios do treino, da preparação física, isso não é muito diferente. Depois, claro, há especificidades, em função da classe e do nível de desempenho dos atletas.

Essas especificidades estendem-se à nutrição?
A alimentação e a nutrição também podem variar em função da limitação, como variam de pessoa para pessoa em qualquer circunstância. Uma pessoa que não movimenta bem o tronco, que não respira da mesma forma, tudo isso tem influência, mas em todos os casos é uma questão a ter em conta e com impacto no rendimento.

Para os atletas com deficiência, a adaptação ao equipamento convencional de ginásio muitas vezes não é possível. Como se contorna o problema?
Não é muito possível, porque não estamos em igualdade de circunstâncias nesse sentido. É a mesma coisa que os atletas olímpicos que se treinam nos Centros de Alto Rendimento… Normalmente, quem tem melhor equipamento e apoio tem melhores resultados. Nesse aspecto, estes atletas são mais dependentes do equipamento de ginásio. Aqui, em Portugal, não temos algumas soluções que existem noutros países, como treinar no ginásio numa cadeira de rodas como se estivesse numa passadeira, no mesmo lugar. Esse equipamento existe, mas nós não o temos. E é evidente que isso traz diferenças nos resultados.

No seu entender, qual o primeiro passo que é preciso dar para garantir a evolução do desporto adaptado?
A primeira coisa que é preciso é convencer as pessoas de que todos têm direito ao desporto e que o desporto não é terapia, embora seja um contributo para uma melhor terapia. Mas é mais do que isso, porque tem uma capacidade de gerar autoconfiança que não existe na terapia. Isso leva as pessoas a não desistirem e a atingirem níveis que não se pensava que fossem capazes de atingir.

É um problema de mentalidade, portanto.
A verdade é que a mentalidade tem evoluído ao longo do tempo. A estrutura organizativa é que é um assunto mais complexo, um obstáculo. É muito mais difícil a uma pessoa com deficiência deslocar-se a um ginásio e às instalações de um clube. Onde está a estrutura para tornar isso mais fácil? Ainda não chegámos a esse ponto. É complexo resolver esse prolema. Se, por exemplo, alguém se treinar na cidade de Lisboa e morar na Amadora, como se vai buscar a pessoa ao outro lado para vir treinar?

Mas parece-lhe que prevalece ainda uma abordagem demasiado caritativa?
Já melhorámos muito, como disse, e há que reconhecê-lo. Temos é de ser capazes de olhar cada vez mais para o desporto da forma mais natural possível e perceber que todos os cidadãos devem ter direito ao desporto. É preciso afastar o lado caritativo, mas sem afastar os apoios, porque eles reflectem-se de forma muito directa nas condições de participação e, mais tarde, nos resultados.

A igualdade é um tema recorrente, mas não existe uma certa discriminação no sistema de classificação dos atletas, em particular dos atletas invisuais, para as competições?
O sistema de classificação tenta ser o mais igual possível. De acordo com o conhecimento científico, o melhor que se tem conseguido fazer é o sistema actual, que funciona menos bem nos casos dos cegos e dos atletas com baixa visão. Sabemos pouco sobre a forma como usamos a visão para executar um gesto. E tem-se muita dificuldade em classificar. Não é por acaso que se começou a classificação pelas deficiências motoras. É difícil fazer uma medição para pôr todos os atletas em pé de igualdade. Na verdade, para todos os níveis, eles nunca são 100% iguais, assim como o Francis Obikwelu não é 100% igual aos adversários. É difícil clarificar e, por isso, a classificação tem estado a ser mudada para haver classificação desportiva, para além da clínica. O que é ser igual, neste sentido? Esse é um objecto de grande estudo científico neste momento.

Que interesse é que tem gerado o desporto adaptado junto dos alunos da Faculdade de Motricidade Humana?
Nós não pomos os alunos numa posição de alternativa. Dizemos-lhes que se querem ser treinadores, de futebol, andebol, natação, o que for, têm que saber o que é o desporto adaptado. E depois algumas dessas especificidades são analisadas e trabalhadas com eles. A maioria dos alunos, como não vê isso como alternativa, acha importante fazer esse percurso. Depois pode terminar a pós-graduação com um plano mais dedicado à investigação e ao treino na área adaptada.

Como é feita essa articulação?
Na pós-graduação, têm de trabalhar com pessoas com deficiência. Eles, normalmente, gostam de fazer esse trabalho e estão interessados, mas enfrentam dificuldades porque na escola as pessoas não estão classificadas por classificação desportiva e torna-se difícil sabermos onde estão para formar um grupo. Muitas vezes isso é facilitado pelo trabalho das federações. Falta captar atletas para irem treinar-se por causa dessa dicotomia. No plano individualizado de ensino, não está contemplado, como está nos EUA, um objectivo para a área do desporto. Se tiver de cumprir esse objectivo, é mais fácil identificar e promover qualquer atleta. A escola não consegue fazer essa ligação, isso não está bem articulado. Muitas vezes a escola também tem poucas condições e não tem capacidade de cumprir essa função. Repare, no caso de um aluno paraplégico, há uma data de desportos que não pode fazer e, por isso, não consegue cumprir o mesmo número de horas de prática desportiva. Às vezes, os professores de Educação Física fazem um bom trabalho e até os iniciam no desporto, mas depois é preciso toda uma estrutura, familiar e de apoio, para que possam continuar a praticar.

Fonte: Público

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Circular de cadeira de rodas em Lisboa

Andar de cadeira de rodas numa cidade como Lisboa é uma experiência brutal. Uma verdadeira tortura. Não há palavras para descrever a bestialidade de certos (ir)responsáveis pelo espaço público.

Há a agenda dos políticos e há a agenda dos cidadãos. Infelizmente uma e outra coincidem muito pouco. Enquanto uns fazem slogans e bandeira de temas que interessam a minorias, há maiorias expressivas a sofrer sem nada poderem fazer. Falo de pessoas portadoras de deficiência, de gente com necessidades especiais e mobilidade reduzida, por exemplo. Mas também falo de uma legião de homens e mulheres, velhos e crianças com doença crónica, que sofrem o que Deus sabe, sem nunca terem estes mesmos políticos do seu lado.

Andar de cadeira de rodas é uma tragédia neste país, sobretudo nas grandes cidades, onde tudo é obstáculo e aparentemente nada existe para facilitar a vida. Mas ninguém pense que são só os deficientes que sofrem. Esses são massacrados diariamente de manhã à noite, é certo, mas não são os únicos. Os doentes incuráveis são outra casta altamente sofredora. Desde logo, pela longevidade da própria enfermidade, bem como pelas dores e desconfortos associados às suas doenças, mas também pelos muros, tantas vezes invisíveis, que os mantêm à margem de uma vida dita normal e começam nas perversidades do sistema nacional de saúde, sempre que não recebem a atenção e os cuidados que lhes são devidos.

Há um par de anos o ministro finlandês da Saúde fez o que todos os políticos ligados às questões que tocam nas fibras mais sensíveis das populações deviam fazer: durante um dia inteiro simulou ser um doente crónico mimetizando o comportamento de um jovem com doença de Crohn. Para quem tem a felicidade de não saber do que se trata, deixo aqui o essencial sobre uma doença inflamatória do intestino que afecta principalmente jovens adultos entre os 16 e os 40 anos: dor ou cólica abdominal severa, febre, diarreias brutais e recorrentes (perdoem-me a escatologia, mas é mesmo esta a realidade da esmagadora maioria dos doentes).

O dia que o ministro da Saúde finlandês guardou na sua agenda para assumir as dores e desconfortos (simulados, note-se) de um jovem doente, foi passado a copiar exactamente o ritmo deste mesmo rapaz. Recebeu dezenas de sms no seu telemóvel indicando sintomas e procedimentos. Durante a manhã e ao longo da tarde foi obrigado a interromper as reuniões de trabalho vezes sem conta para se sentar na retrete durante pelo menos dez minutos seguidos (felizmente sem desconforto nenhum, já que estava apenas a simular, insisto) e assim imitar o quotidiano daquele jovem.

Abstenho-me de enunciar aqui detalhes que seriam insuportáveis para quem lê uma simples crónica de jornal, habitualmente sem cheiros nem cores, mas posso garantir que ao fim do dia o ministro da Saúde estava estafado, enervado, frustrado e sem mais capacidade de resistência. Mesmo tendo apenas simulado ser um doente de Crohn e não passando realmente pelas dores e desconfortos, o ministro terá desabafado: “Não sei como é que conseguem viver assim todos os dias que duram as crises, nem como se atravessa uma vida inteira com uma doença crónica”.

No dia seguinte retomou a normalidade, coisa que não aconteceu com o rapaz, nem acontece com os doentes crónicos nem com os portadores de deficiências ou doenças incapacitantes, claro. Tenho a certeza de que a experiência de se pôr na pele de um doente mudou para sempre a perspectiva deste responsável pela saúde pública e privada de todo um país e, por isso mesmo, tenho a certeza de que os nossos políticos humanizariam para sempre o seu olhar e, acima de tudo, a sua acção se dessem passos no mesmo sentido.

Como? Muito fácil. Os presidentes de câmaras e autarcas poderiam começar por passar um dia em cadeira de rodas. Um dia apenas das suas vidas. Sair de casa de manhã e voltar à noite, tentando fazer a sua vida normal. Tenho a certeza absoluta (a máxima certeza!) de que muita coisa mudaria em si e à sua volta. E não tenho uma dúvida de que todos ganharíamos com a pedregosa experiência.

Andar de cadeira de rodas numa cidade como Lisboa, que é onde moro e a que melhor conheço, é uma experiência brutal. Uma verdadeira tortura. Não há palavras para descrever a bestialidade de certos (ir)responsáveis pelo espaço público. Falo por conhecer bem o dia a dia de tetraplégicos, pois tenho quatro amigos que, tendo nascido e vivido muitos anos sem qualquer condicionante, foram vítimas de acidentes que os deixaram em cadeira de rodas para o resto da vida. Mas também falo como voluntária de uma associação apostada em melhorar a qualidade de vida às pessoas com mobilidade reduzida e necessidades especiais. Ou seja, felizmente não falo por mim, mas por uma multidão de aflitos que muitas vezes (vezes demais!) opta por nem sair à rua. Escolhe tristemente ficar enclausurado em casa para não ter que se confrontar com um rol de barreiras e obstáculos que fariam qualquer mortal querer desistir de existir ao primeiro entardecer.

O ministro finlandês assumiu-se incapaz de viver como um doente crónico ao fim de um dia de esgotante simulação, mas aposto que a maior parte das pessoas que constroem casas e passeios, recuperam monumentos e praças, multiplicam estradas e edifícios públicos nunca calçaram os sapatos de quem lá vive e é obrigado a percorrer diariamente (ou a tentar sobreviver, para ser mais exacta) esses caminhos tortuosos.

Chateia-me a incoerência de alguns políticos, decisores e planeadores urbanos. Enervam-me as batotas dos que dizem que fazem mas não fazem, dos que fingem que rebaixam passeios e eliminam barreiras, mas deixam tudo às três pancadas, provocando novos acidentes e gerando mais feridas que não cicatrizam. E irritam-me certos slogans a defender as grandes questões do povo, quando muito deste povo é literalmente ignorado nas suas dores e fracturas, quando é silenciosamente seviciado, torturado, dia após dia, mês após mês, durante todos os anos da sua vida. Julgam que exagero? Experimentem andar de cadeira de rodas um dia, apenas um, e verão se exagero.

Fonte: Observador

quinta-feira, 15 de setembro de 2016

Rede de serviços e equipamentos sociais

Dar a conhecer a diversidade e abrangência da Rede de Serviços e Equipamentos Sociais é um dos objetivos da Carta Social.
Enquanto serviço público de informação ao cidadão, a página da Internet da Carta Social tem vindo a incorporar novas funcionalidades que visam melhorar a sua utilidade na pesquisa por serviços e equipamentos sociais, procurando aproximar os Cidadãos e as Instituições em função das suas necessidades e respostas, respetivamente.

Assim, a partir da página www.cartasocial.pt, é já possível, por exemplo:

- Pesquisar um equipamento localizando-o num mapa interativo até ao nível de freguesia;
- Identificar por listagem as respostas sociais existentes por área geográfica, até ao nível de freguesia;
- Saber se uma Instituição tem um Sistema de Gestão de Qualidade que lhe confira a Certificação de Qualidade ISO 9001, EQUASS ou Marca de Qualidade ISS, IP;
- Identificar a localização aproximada do equipamento em mapa, visão satélite e híbrida;
- Conhecer algumas das outras atividades que as Instituições desenvolvem para além das respostas principais;
- Ver algumas imagens das Instituições que disponibilizaram esses elementos.

A atualidade e rigor da informação produzida decorrem naturalmente da disponibilidade e iniciativa das Instituições em manter o seu registo atualizado, pelo que se agradece a colaboração de todos para que seja mais fácil dar a conhecer aos Cidadãos as respostas sociais que existem em funcionamento em cada momento, de forma a rentabilizarem-se os serviços e ao mesmo tempo contribuirmos para a satisfação das necessidades dos utentes e suas famílias.

Fonte e mais informações: Carta Social

domingo, 11 de setembro de 2016

Produtos de apoio como cateteres. fraldas e sacos coletores vão ser disponibilizados pelas farmácias

Foi publicado na 2.ª série do Diário da República, o Despacho n.º 10909/2016, de 8 de setembro, relativo ao financiamento dos produtos de apoio a pessoas com deficiência.

Para efeitos do estabelecido no diploma, considera-se produtos de apoio os produtos, dispositivos, equipamentos ou sistemas técnicos de produção especializada ou disponível no mercado destinados a prevenir, compensar, atenuar ou neutralizar limitações na atividade ou as restrições na participação das pessoas com deficiência.
O Diploma estabelece, para os produtos de apoio do ano 2016, uma verba global de € 13.980.000,00 comparticipada pelos Ministérios da Educação, do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, e da Saúde.
O Despacho introduz como novidade, a possibilidade dos produtos de apoio serem prescritos e fornecidos aos doentes internados nas unidades hospitalares, designadas pela Direção-Geral da Saúde, antes da alta médica, para utilização fora do internamento hospital.
Nova orientação, surge ainda, relativamente aos produtos de apoio consumíveis no âmbito da ostomia e produtos de apoio usados no corpo para absorção de urina e fezes, de utilização permanente e diária, para as pessoas abrangidas nos termos da legislação em vigor, e prescritos no Serviço Nacional de Saúde, para além de disponibilizados pelos hospitais, serão, a partir de 1 de novembro de 2016, fornecidos ou reembolsados pelas unidades de cuidados de saúde primários ou prescritos por via eletrónica e dispensados em farmácias de oficina.
Estes produtos, quando prescritos nos centros especializados designados pelo Instituto da Segurança Social, I.P., mantém os atuais processos e continuam a ser suportados pelo Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
Para saber mais consulte: Despacho n.º 10909/2016 
Fonte: INR

sábado, 10 de setembro de 2016

A solidariedade dos portugueses

O tema da minha crónica no Jornal a Abarca desta vez é a solidariedade que sempre tive por parte dos portugueses.

Todos os olhares se dirigem na minha direção e imediatamente alguém se levanta e pergunta: Precisa de alguma coisa? Sim, respondo eu, um copo de água por favor! Quer fresca ou natural? Pode ser fresca. Muito obrigado.

Esta troca de palavras surge sempre que me dirijo a um recipiente de água numa qualquer sala de espera. Tento disfarçar, olhar de longe para averiguar se consigo beber água sem ajuda de ninguém, mas nem sempre consigo chegar a uma conclusão, e lá vou até ao recipiente. Isto a propósito da boa vontade e disponibilidade para ajudar, que as pessoas anónimas sempre demonstraram para comigo.

O mesmo acontece ao tentar apanhar uma daquelas revistas/jornais espalhados pelas mesas das salas de espera. Gosto de tentar, mas antes que comece, de imediato aparece alguém e me entrega a revista. É que as manobras que tenho que fazer para tentar segurar na revista, dão nas vistas. Geralmente seguro-as com a boca para não me desequilibrar, e só depois as coloco no colo. Demora, mas vai. 

O ideal seria perguntarem se preciso de ajuda, mas como geralmente se levantam de imediato, evito dizer que vou tentar fazer sozinho e se não o conseguir pedirei ajuda. Sinto que ficar ali de pé alguém á espera que isso aconteça, pode ser mal interpretado e por isso aceito de imediato a oferta. Outro caso é quando vou abrir a minha carteira para tirar algo. Começo por pegar o fecho com a boca, e toca a corre-lo, logo quem estiver por perto me tenta ajudar. Neste caso costumo agradecer e dizer que consigo.

No meu trabalho, no Centro de Apoio Social da Carregueira, tenho outro exemplo lindo de solidariedade e entreajuda. Preciso que me sirvam e preparem os alimentos...chegar a uma pasta numa prateleira...abrir uma porta...Há sempre algum colega por perto que me ajuda com toda a naturalidade e boa vontade do mundo, mas neste caso, como sei bem o que consigo, ou não fazer, costumo pedir.

Como estes exemplos tenho muitos mais.

Isto para realçar que sempre senti o maior apoio, carinho, solidariedade e respeito pela parte dos portugueses. Nunca tive um episódio pior, discriminatório ou algo parecido.

O mesmo não acontece com o Estado. Esse sim discrimina-nos sem dúvida nenhuma. Mas isso é outra conversa. A todos os anónimos, colegas e conhecidos que sempre me apoiaram muito obrigado.

A lei é (d)eficiente?

Regresso hoje, estimado leitor, com todo o gosto, ao seu convívio. Findo o mês de Agosto, quis o calendário que esta crónica retomasse a um dia do início dos Jogos Paralímpicos, no Rio de Janeiro. Nesse contexto, o tema que lhe trago hoje prende-se com uma componente essencial para a prática desportiva dos cidadãos com deficiência: as acessibilidades.

Falar de acessibilidades para o desporto significa ainda um lamentável exemplo do fosso que muitas vezes existe, em Portugal, entre a teoria e a prática, entre a letra da lei e a realidade, entre as boas intenções e a crueza e a crueldade que se verificam no terreno.

Tentemos colocar-nos na pele do Manuel, deficiente, com mobilidade condicionada, que quer jogar basquetebol no pavilhão Municipal mas não encontra rampa ou elevador para lá entrar em cadeira de rodas. Ou no caso da Joana que quer nadar nas piscinas do clube do seu bairro, mas falta um acesso à água por rampa ou por meios mecânicos. Ou na situação da Maria cujo ginásio não dispõe de uma cabina de duche adequada à sua condição. Ou ainda no lugar do Eduardo, invisual, que experiencia diariamente múltiplas dificuldades, na deslocação do seu local de trabalho até ao campo onde treina futebol e, depois, à noite, no regresso a casa.

Podemos imaginar – só isso, imaginar – a frustração que invade o Manuel, a Joana a Maria e o Eduardo. E como eles, infelizmente, muitos outros.

Quem queira ter uma abordagem parcial e insensível, cingida à letra da lei, dirá a estes concidadãos que não têm razão de queixa.

"Mas ó Manuel, a nossa Constituição prevê o princípio da igualdade e consagra o direito ao desporto para todo e qualquer cidadão, pelo que não pode haver lugar a discriminações em razão da deficiência! E é isso mesmo que o Regulamento Municipal para a Acessibilidade e Mobilidade Pedonal garante!"

"Veja, Joana: o Estado tem obrigações muito claras para assegurar a plena integração e participação sociais do cidadão com deficiência, através do desporto. Para além da Constituição, existem as Lei de Bases – da Actividade Física e Desporto, por um lado, e da Prevenção, Habilitação, Reabilitação e Participação da Pessoa com Deficiência, por outro – que prescrevem a necessidade de haver "ajudas técnicas adequadas" que respondam às "especificidades" das "pessoas com deficiência", assim como exigem "medidas específicas necessárias para assegurar o acesso da pessoa com deficiência à prática do desporto e à fruição dos tempos livres, mediante, nomeadamente, a criação de estruturas adequadas e formas de apoio social"!"

"Maria, atenção! Existe já legislação específica para os ginásios, health clubs e academias que acode exactamente à sua situação! E mesmo a chamada ‘Lei das Acessibilidades’ diz lá, expressamente, que as normas técnicas se aplicam a ‘ginásios e clubes de saúde’!"

"Eduardo, tenha bem presente o seguinte: Portugal está vinculado a instrumentos supranacionais como a Carta Internacional da Educação Física e do Desporto, a Carta Europeia do Desporto, a Carta Europeia do Desporto para Todos, a Carta do Desporto dos Países de Língua Portuguesa ou a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Nestes compromissos internacionais existem normas gizadas para o ajudar precisamente a si, Manuel, e a outros colegas e amigos em idêntica condição!"

Quem fala a verdade? Todos.

Mas há uma outra verdade, que dói mais enfatizar: se há já, felizmente, muitos casos com solução diferente, aqueles que ilustrámos são bem reais, existem, não são pura especulação ou exercício hipotético.

Continua, de facto, a haver barreiras arquitectónicas que perturbam a liberdade de pessoas como o Manuel, a Joana a Maria e o Eduardo, praticarem desporto, que condicionam quem já tem mobilidade condicionada, que excluem em vez de incluir, que não asseguram uma igualdade de oportunidades. E não falo apenas de edifícios antigos. Muitos são novos.

Não nos podemos conformar. A lei tem de ser mais eficiente. Só assim servirá, em pleno, os direitos e interesses de quem é deficiente.

Por conseguinte, fica aqui este registo e um apelo conexo: o principal diploma nesta matéria – Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de Agosto – prevê a responsabilidade civil, contra-ordenacional [com coimas suficientemente dissuasoras] ou disciplinar para as "entidades públicas ou privadas" que não cumpram as suas obrigações legais em matéria de acessibilidades. Isto para além de sanções acessórias, que podem chegar a privação de direito a subsídios; interdição de exercício da actividade; encerramento de estabelecimento; e mesmo suspensão de autorizações, licenças e alvarás.

Importa, pois, aplicar o regime. O cerne da questão, como tantas outras vezes, não está, de facto, em ausência de previsões legais. Nisso costumamos, como neste caso, ser campeões. O problema está, outrossim, na ausência ou insuficiente fiscalização. A Administração Pública Central, as Câmaras Municipais, a ASAE, têm de envidar ainda mais esforços na sua acção fiscalizadora, devendo o Estado dotar aqueles de meios necessários e suficientes. E nós, todos nós, temos de denunciar, reclamar, em defesa de quem é mais desfavorecido, como sucede com os cidadãos com deficiência.

Que os magníficos exemplos de sacrifício e superação dos nossos atletas paralímpicos possam servir de fonte inspiradora e mobilizadora!

Em frente. Vai valer a pena.

P.S. Saiu no mês passado um livro que recomendo vivamente: "Pessoas com deficiência em Portugal", Fernando Fontes, Ensaio da Fundação Manuel dos Santos.

Alexandre Mestre é advogado, consultor na Abreu Advogados e também docente de Direito do Desporto. É ex-Secretário de Estado do Desporto e Juventude.

Fonte: Sábado