terça-feira, 28 de outubro de 2014

BDR-SAPA: Base de Dados de Registo do Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio

Foi publicado, em Diário da República, a Portaria nº 192/2014, relativa à criação da Base de Dados de Registo do Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio (BDR - SAPA), que tem como objetivo garantir a eficácia do sistema, a operacionalidade e a eficiência dos mecanismos do Sistema de Atribuição de Produtos de Apoio, promovendo uma aplicação criteriosa do mesmo.

O referido diploma estabelece a criação e manutenção da BDR - SAPA, através de uma aplicação informática centralizada, bem como o tratamento da informação no que respeita à referenciação, prescrição, atribuição, comparticipação e reutilização de produtos de apoio.

A BDR - SAPA permitirá a desburocratização, a desmaterialização e a simplificação do SAPA, tornando possível o controlo da atribuição dos produtos de apoio a nível nacional, de uma forma mais eficiente e célere, permitindo aos organismos envolvidos, a caracterização e a consulta da informação dos seus beneficiários.

Fonte: Plural & Singular

Autocarro 736 em Lisboa

Hoje estou cansada, não sei a quem recorrer pois já não é a primeira vez que esta situação acontece.
Sou tetraplégica e tenho a felicidade de ter um trabalho. Moro em Lisboa e com muito esforço consigo sair de casa, apanhar o autocarro da carris e ir trabalhar. Apanho o autocarro 736 quando este para na paragem para eu entrar. Muitos passam e acenam que não têm rampa ou que está avariada. Hoje foi mais um daqueles dias em que a minha viagem durou horas.

O autocarro parou e o motorista amavelmente carregou no botão e a rampa encostou ao passeio. Entrei e ... a rampa não encolhia, estava avariada. O motorista com um sorriso agarrou numa suposta alavanca mas estava partida. Avisou todos os passageiros que a situação iria demorar e o melhor seria mudarem para o outro autocarro que vinha atrás. Saíram todos a correr, umas mulheres queriam pegar na minha cadeira com as mãos e colocar no passeio mas uma voz gritou a tempo ... não lhe toquem na cadeira que podem avariar...e fiquei sozinha com o motorista. 

O outro motorista apressado ia arrancar quando um grupo de passageiros gritava para que esperasse por mim. Ouvi os gritos dele ... nem pensem que eu vou abrir a rampa do meu autocarro que vai ficar também empenada. Os passageiros gritavam para ele abrir e o colega bateu na porta para ele parar e esperar por mim . Pressionado gritava "não pensem que é má vontade isto está tudo velho e com umas gotas de chuva fica tudo empenado e eu se abro a rampa vou ficar também aqui", mas fez inversão de marcha enquanto eu saia do autocarro. Já no passeio vi que era estreito e tinha um candeeiro no meio, a minha cadeira não podia passar... e o outro autocarro acabou por arrancar e fiquei com o motorista e o autocarro avariado... 

Esperei mais 45 minutos pelo próximo... preciso de trabalhar mas a Carris nem sempre tem os autocarros preparados para nós."... desculpa foi um desabafo. 

Ana 

o que é que ela pode fazer??? quem dá uma ideia ?

Fonte: Movimento (d)Eficientes Indignados

Preso sem ter cometido nenhum crime

Que engraçado, estou preso sem ter tido cometido nenhum crime, apenas tenho paralisia cerebral e sou totalmente dependente. Isto é crime?! Se for, quanto tempo vai durar a minha pena, Senhor Primeiro-Ministro? Sim... Quero saber porque os condenados também sabem até quando vai as suas penas!

Desculpe mas, eu já não vou para novo, tenho idade para trabalhar, veja lá, mas nunca me deram oportunidade para mostrar o meu valor! Tem dúvidas que eu fosse capaz de trabalhar? Então porquê não faz como São Tomé? Ver para querer! Eu não tenho dúvidas do meu valor, nem das potencialidades da maioria das pessoas com paralisia cerebral! Eu, como as outras pessoas com deficiência, só quero uma oportunidade e já agora, também queria que se cumpram as leis de incentivo ao emprego para pessoas com deficiência. 

Senhor primeiro-Ministro, até quando, vou estar preso à instituição que me dá tudo que pode mas na minha vida é quase nada! Eu já não vou para novo, e como imagina a mãe também não. Será justo estar a sobrecarregar a mulher que me dá vida durante toda vida! Não, Senhor primeiro-ministro, não é justo. Já é tempo para retribuir um pouco com a minha vida, toda vida que ela me dá!
A vida independente não é um capricho, é um direito. Afinal de contas, só tenho paralisia cerebral!

José Henrique Rocha em Movimento (d)Eficientes Indignados

domingo, 26 de outubro de 2014

Minha parceria com a Mithós-Associação Apoio Multideficiência

Estava nos meus planos criar uma associação de tetraplégicos, mas para além de ser mais uma associação no meio de tantas outras, seria mais um projeto a exigir muito de mim. Porque não unir-me a uma já existente? Unir no lugar de dividir. Foi essa a opção que tomei e a partir de hoje é com muito prazer que anuncio a minha parceria com a Mithos - Associação Apoio Multideficiência, que muito me apoiaram na minha recente viagem de protesto.
 
Abaixo o comunicado da Mithos:

O nosso associado Eduardo Jorge, que muitos conhecem como o Tetraplégico que fez 180 km em cadeira de rodas, de Concavada a Lisboa, a lutar pelo direito a uma VIDA INDEPENDENTE e ativista do Nós Tetraplégicos passará a trabalhar em conjunto com a Direção da Mithós, tendo a mesma decidido atribuir-lhe, depois de conversações com o mesmo, o estatuto de assessor para a área da ação e direitos sociais, com capacidade para representar a associação em juízo e fora dele.

Este novo estatuto permite que o trabalho do Eduardo Jorge seja agora apoiado e suportado juridicamente pela Mithós-Histórias Exemplares.

Cremos que esta "união" irá beneficiar a luta pelos direitos das pessoas com deficiência, pois...JUNTOS SOMOS MAIS FORTES!

Cumprimentos,
Manuela Ralha
Presidente da Direção

Um tipo todo torto que insiste em ter uma vida normal

Ela pediu-lhe que se casassem. Pensou muitíssimo antes de lhe fazer o pedido. Ouvira tantas vezes as pessoas mais importantes da sua vida, os seus pais, dizerem que aquela relação tinha tudo para correr mal. Onde já se vira uma rapariga saudável unir-se a um rapaz com um grau de incapacidade de 98%?!

— Então e se eu ficar surdo? — perguntou ele, que já mal vê, só dá pequenos passos, apoiado em alguém.
— Já pensei nisso tudo.

Pensara. Pensara em todos os cenários imagináveis. Pensara, sobretudo, no pior possível: ele, numa cama, incapaz de falar com ela, incapaz de a ouvir, capaz apenas de reagir ao seu toque. Por vezes, na brincadeira, punha-se a escrever palavras simples nas costas dele e ele punha-se a adivinhá-las. O nome dele: “João.” O nome dela: “Sofia.” A palavra que tantas vezes lhes vem à boca: “Amo-te.”

Ele também tinha medo. Ainda tem. “Tenho medo que se concretize o que ela teme. Eu sou um tipo todo torto que insiste em ter uma vida normal, o mais normal possível, num país que não está feito para isso. Nem posso sair à rua sozinho! Tenho calçada portuguesa à porta de casa. A maior parte está maltratada, mas, quando se fala em alterá-la, as pessoas vão aos arames. Pronto, querem os velhinhos e os deficientes dentro de casa. E assim conseguem, assim conseguem!”

A avaliar pelos últimos censos, 17,4% das pessoas entre os 15 e os 64 anos têm dificuldade em fazer pelo menos uma destas coisas: ver, mesmo com óculos; ouvir, mesmo com prótese auditiva; andar, descer ou subir degraus; sentar-se ou levantar-se, dobrar-se, esticar-se, levantar ou transportar, agarrar, segurar ou rodar algo; memorizar ou concentrar-se; comunicar, compreender ou fazer-se compreender. E tudo se agrava com a idade. Ultrapassa os 50% entre os maiores de 70 anos.

Estamos na sala de casa da mãe dele, que é a casa deles desde que, há quase um ano, se tornaram um casal com papel passado. Ele está sentado numa poltrona. E ela está bem junto a ele, sentada no braço da poltrona, um pouco torta, a sorrir. De vez em quando, solta uma pequena gargalhada.

Talvez esteja tudo naquele sorriso. Ele fá-la rir desde o princípio. Ela podia dizer-lhe qualquer coisa banal, como: “Ó João, vês isto aqui?” E rir-se ao ouvi-lo retorquir: “Ver! Tu sabes bem que eu não posso ver!” Ele brinca tanto com a sua situação que ela depressa aprendeu a fazer o mesmo.

Logo no início, não estava Sofia habituada ao desequilíbrio que João tem no andar, ele segurou-se no braço dela e ela olhou para um lado e para o outro e comentou: “As pessoas que olharem para nós hão-de pensar que apanhámos uma piela desgraçada.” E ele, divertido, contou-lhe que, certa ocasião, fora com uma amiga comprar cinco litros de vinho e ela lhe pedira que levasse a carga. Também aí ele se perguntou, como ela se perguntava naquele momento, o que diria quem olhasse para ele, “todo desengonçado, com uma box de cinco litros numa mão”. E a amiga pôs-se a imaginar: “Olha aquele, acabou-se-lhe o vinho e foi comprar mais!” Risos.

João Sousa e Silva sentia-se “casado” sem notário e padre, mas Sofia Casal e Silva queria ter firmeza nos passos e acreditava que essa firmeza seria maior se houvesse reconhecimento de humanos e bênção de Deus. Nunca pensaram que, casando, ele perderia direito à pensão social de invalidez.

A pensão destina-se a quem tem rendimentos inferiores a 167,69 euros. Se for casado, 251,53 euros. “Um político pode acumular até dois mil euros. Um deficiente pode acumular até 251,53. Isto é imoral”, insurgiu-se ele. Lembraram-lhe que nunca descontou para a Segurança Social. “É claro que não descontei! Não descontei porque não me deram oportunidade. Estou desertinho por descontar.” Os estudos disponíveis são esparsos, mas apontam para taxas de desemprego entre pessoas com deficiência e incapacidade duas vezes e meia superiores à média.

A voz do jovem, de 30 anos, altera-se ao falar neste assunto, que também afecta a mulher, quatro anos mais nova:

— O Estado decidiu que, casando, ou eu e a minha mulher viveríamos na miséria ou a minha mulher ganharia muito bem, o que não é o caso, e teria de me sustentar. Teria de ser um fardo. Não teria direito a ter qualquer dinheiro no bolso a não ser por caridade da minha mulher.
— Nunca seria por caridade! — atalha ela.
— É uma situação altamente indigna.
— É uma pensão não contributiva. Acaba o Estado por apenas garantir que a pessoa está…
— Ligada à máquina!

Escreveu para a Provedoria de Justiça a protestar. Explicaram-lhe, por escrito, que tal pensão “assenta na solidariedade de toda a comunidade, sendo as despesas inerentes às mesmas custeadas pelo Orçamento do Estado e, isto é, pela generalidade dos contribuintes”. “Perante tal circunstância, o Estado condicionou o acesso a estas prestações sociais aos rendimentos dos beneficiários e dos respectivos agregados familiares, apenas a elas podendo aceder os requerentes cujos proventos económicos próprios e dos respectivos agregados familiares sejam inexistentes ou mínimos.”

Na opinião de Fernando Fontes, da Universidade de Coimbra, que fez tese de doutoramento sobre o movimento de pessoas com deficiência em Portugal e está a fazer pós-doutoramento sobre violência e crimes de ódio, tudo isto combina bem com a ideia dominante de deficiente dependente de familiares. “A questão é que tem consequências terríveis”, salienta o especialista. Reforça a dependência, o cansaço, o desgaste da relação conjugal. Havendo violência, a vítima pode sentir-se tão destituída, tão dependente, que nem pede ajuda.

A luta pela vida independente, que surgiu nos Estados Unidos na década de 1970, só agora desponta em Portugal. É reivindicada por novos movimentos, como o (D)Eficientes Indignados. E por activistas como Eduardo Jorge, tetraplégico que a 23 de Setembro iniciou uma viagem de 180 quilómetros em cadeira de rodas — de sua casa, em Abrantes, até ao Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, em Lisboa. Já no ano passado, fez greve de fome junto à Assembleia da República até o Governo prometer avançar com legislação destinada a promover a vida independente dos cidadãos com deficiência. No mês passado, o Governo anunciou os primeiros projectos-piloto de formação de assistentes pessoais.

A busca pela normalidade é permanente. João veste calças de ganga rotas no joelho e T-shirt preta, como qualquer pessoa da sua idade, mas sente que tem mais necessidades e menos oportunidades, apesar de antes de ele nascer a Organização das Nações Unidas ter estipulado que as pessoas com deficiência têm os mesmos direitos e as mesmas responsabilidades que as outras.

— Uma pessoa como eu precisa de mais dinheiro, não de menos dinheiro. Não posso comprar um telemóvel de 20 euros, tenho de comprar uma coisa como deve ser.
— O telemóvel básico não está adaptado a ele.
— Preciso de calçado caro e não é luxo, é necessidade. Tenho de usar calçado seguro, que não me caia dos pés. Ainda há pouco saía sozinho, ia ao café ter com alguém, ia levar o lixo, ia ao banco pagar o condomínio, agora já não posso fazer isto. Não saio sozinho. Não posso apanhar o autocarro para ir à Acapo [Associação de Cegos e Ambíopes de Portugal], preciso de apanhar boleia ou táxi.

Qualquer actividade corriqueira, como gozar uns dias de praia no Verão, implica cuidados. Nada de parque de campismo ou hostel. Só lugares com acessibilidade. A acessibilidade determina até a escolha da praia. E, neste primeiro ano, escolheram a do Paraíso, na Costa da Caparica.

— Eu detesto praia! Fui por causa da Sofia. Quis que tivesse um bocadinho de praia antes de eu ser operado, se não coitadinha…. E lá está, sai caríssimo.
— Não gostaste da praia? — pergunta ela.
— Gostei de andar à beira-mar contigo! A parte da areia é que… alcatroava aquilo tudo!
— Eu sei que é muito difícil para ti andar na areia, mas aquela praia é fantástica. Tem uma rampa espectacular e logo a seguir barraquinhas.
— Preciso de uma barraquinha. Não tenho agilidade para fugir do sol. Nem pele para estar ao sol, mas até fiz surf.
— Nem se via!
— Ia deitadinho na prancha.

Conheceram-se em 2012, no picadeiro, na Quinta do Pinheiro Manso, na periferia de Leiria. João tinha sessões de hipoterapia, abordagem que recorre ao passo, ao trote, ao galope de cavalo para melhorar a percepção do movimento humano. E Sofia, fisioterapeuta, ia lá levar um rapaz que estava a acompanhar.

Nada nele chamava a atenção dela. “Eu sou um estupor”, brinca ele. “Ela via-me, trombudo, num canto, a fumar como uma chaminé.” Poucas palavras trocavam. Um dia, puseram-se a conversar. Ela interessa-se muito por terapias alternativas. E ele tem neurofibromatose tipo 2, doença genética que afecta o sistema nervoso central e se caracteriza pela ocorrência de tumores.

Sofia acabara de aprender terapia sacro-craniana, técnica baseada no toque de suavidade extrema. Não se sentia ainda capaz de o ajudar. Contactaria os professores. Tantas vezes os ouvira dizer que podiam ajudar a resolver problemas que se pensavam sem solução. Eles não lhe responderam.

Esgotou-se o Verão. Ia o ano em Setembro quando tornaram a cruzar-se. Ela estava a entrar e ele estava a sair da Unidade de Cuidados Continuados Dr. Manuel de Aguiar, no centro de Leiria. A mãe dele, que sofre da mesma doença, estava nos cuidados continuados e ele, o cuidador, fora vê-la.

— Olá!
— Olá!
— Pois é! Desculpa! Nunca mais te disse nada. Os meus professores nunca mais me responderam e eu acabei por me esquecer.

“Foi um encontro espectacular”, goza ele. “Eu estava inchadíssimo, a tremer, por causa dos corticóides. Tinha feito mais uma cirurgia.” Ela lembra-se do que pensou ao vê-lo: “Ó, meu Deus!” Tinha de o ajudar. Ele telefonou-lhe volvido um só dia. Encontraram-se para conversar, com vagar. O quadro clínico dele parecia-lhe tão bicudo. Ela achava que não tinha arte para tamanha complicação, mas não queria deixá-lo sem resposta. Foi para casa pensar e escreveu-lhe: “Vou dar o meu melhor.” E ele dispôs-se a aceitar o melhor dela, fosse qual fosse o melhor dela.

João descobriu a doença aos 11 anos. “Foi-me levando coisas de que eu gostava de fazer. Apesar de ver mal, andava de bicicleta. Andar de bicicleta era a minha maior alegria. Ia comprar peças quando notei que alguma coisa estava mal. Não conseguia levantar bem os pés.”

Os médicos perceberam logo. A opacidade subocular pode ser o primeiro sinal da doença. Ele sempre vira mal. E neurofibromatose tipo 2 fora diagnosticada à mãe dele aos 29 anos, ia ele nos oito. Teve de ser operado. Uns tumores comprimiam-lhe a medula. “A minha estrutura óssea ficou comprometida.”

Durante meses, usou uma ortótese da cintura ao queixo. Parecia a pintora Frida Kahlo. Um dia, fartou-se de tanto desconforto: tirou aquilo. “É pá, não preciso assim tanto de andar com a coluna tão direitinha! Prefiro ficar um bocado marreco e sentir-me um bocado bem no dia-a-dia.”

Naquela altura, não tinha grande noção do que lhe estava a acontecer. Entristecia-o não poder andar de bicicleta, mas tinha alternativa: os videojogos. Passava horas agarrado às consolas. Apareceram-lhe outros tumores. Regressou à mesa de operações. “Fiquei com a mão esquerda muito afectada. Deixei de poder jogar com consolas. Virei-me para o computador.”

Não é que não perca a paciência, não pragueje, não solte palavrões. “Palavrões, digo um, dois, 20, 30, 50. Sou um malcriado de primeira. A questão é que não posso desistir. Desisto e depois? Como é que faço? Não tenho feitio para isso! Felizmente, sou bastante plástico. Vamos ver até quando…”

Sofia gaba-lhe a resiliência — aquela mistura de optimismo, confiança, capacidade de manter a calma perante a adversidade, habilidade para analisar o ambiente, posicionar-se no melhor ponto. “Ele quer andar para a frente”, diz ela. Ainda há pouco, com uma lupa digital, conseguia ver as letras no teclado, escrever depressa. “De há dois meses para cá, a perda de visão agravou-se. Ainda se revoltou, mas já consegue escrever outra vez”, prossegue ela. O teclado tem sinais que o ajudam a orientar-se.

Usa tecnologias de assistência. Fala com o telemóvel e com o computador e o telemóvel e o computador “falam” com ele. Não em todos os programas. É nisso que está a trabalhar. Tem uma utopia: “Se não todas, pôr pelo menos a maior parte das aplicações a funcionar com suporte de leitor de ecrã”, isto é, com resposta sonora.

Não se limita a imaginar. Fez licenciatura e mestrado em Informática no Instituto Politécnico de Leiria. “Teve 19 valores na tese de mestrado”, orgulha-se ela. Registou a patente de um método para aumentar a acessibilidade e interacção em transportes públicos. Está a fazer doutoramento na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro. O seu objectivo é introduzir etapas de acessibilidade no desenvolvimento de software — projectos Web e aplicações móveis.

Não vai à universidade. “Vou lá nas avaliações e vamos ver até quando.” Ao ouvi-lo, Sofia dá-lhe uma palmadinha no ombro. E ele percebe naquele gesto um modo de lhe pedir que não diga tal coisa, mas continua: “Não tenho bolsa, não tenho apoios, não tenho dinheiro. E as propinas têm de se pagar.”

“As minhas idiossincrasias apontam para investigação”, resume. “É o que sei fazer. É o que posso fazer. E dá-me muito prazer. Gosto de estar em frente ao computador, de ler, de pensar, de escrever. Gosto de tecnologia, de saber o que existe, de desenvolver novas soluções, de optimizar.”

Por duas vezes candidatou-se a bolsa da Fundação para a Ciência e Tecnologia. “Faço o projecto e na avaliação aparecem críticas a dizer que há coisas que não estão esclarecidas e as coisas estão ultra-esclarecidas. Com o meu jogo de cintura, precisava de uma coisa mais previsível.”

A experiência diz-lhe o quão necessário seria avançar na acessibilidade digital. E não está a pensar só nos deficientes, como ele. “Queremos pessoas activas aos 70 anos? Essas pessoas vão ver mal, ter menos destreza, ter problemas de audição, precisar de condições de acessibilidade.”

Arranjou uma empresa disposta a acolhê-lo na modalidade estágio de inserção para pessoas com deficiência ou incapacidade. Temeu que o recusasse. O Sistema de Verificação de Incapacidades atribuiu-lhe 98% e no Instituto de Emprego e Formação Profissional disseram-lhe que os manuais não contemplam casos de incapacidade acima de 90%. “Não sei por que me deram 98 e não 95 ou 90%, por exemplo. Sou uma cenoura que por acaso escreve uns artigos científicos!”

Um dia depois desta conversa receberia notícias: “A questão dos ‘mais de 90% de incapacidade’ existe, mas a pessoa venceu, ou seja, a informática não foi chamada. A pessoa responsável disse-me para não me preocupar, se houver problema, é com ela! Agora, preparo-me para fazer o melhor na empresa.” Começou no passado dia 14. Pela primeira vez nos seus 30 anos de vida, entrou numa empresa como trabalhador, a GAIP Consultores, em Gândara dos Olivais. Tem um ano pela frente.

Dia feliz, aquele. Mesmo assim, não tanto como o do casamento de ambos, na Igreja de Santo Agostinho. Ele gostou da ideia de se casar na igreja do santo cientista. E ela gostou da ideia de se casar numa igreja luminosa e sem degraus. Muito perto da unidade de cuidados continuados onde, por acaso, se reencontraram, ela a entrar com um paciente, ele a sair para apanhar um táxi.

Tanto riso nas fotografias de casamento. Dele, dela, mas também dos pais de Sofia, que tão mal reagiram quando souberam que a filha gostaria de passar mais tempo com João. Não era só por causa da doença, era também a religião. Ele é ateu. Ela faz parte do Caminho Neocatecumenal, um itinerário de formação católica. Ela ia buscá-lo para sessões de terapia sacro-craniana. Conversavam durante a meia dúzia de quilómetros que separam a casa dele, na Guimarota, da casa dela, em Marrazes. As conversas alongavam-se, depois, via Internet. Falavam de livros, de música, mas também da saúde e da doença, da vida e da morte, da amizade e do amor. Ela toca saxofone. Um dia, convidou-o para ir com ela e alguns amigos a um concerto da Orquestra de Jazz de Leiria. Era 21 de Dezembro de 2012. Pelas previsões dos maias, o mundo deixaria de existir, pelo menos, tal como o conhecíamos, nesse dia. E foi isso mesmo que aconteceu ao mundo deles. Quando João apareceu, Sofia correu para ele: “Estava desertinha de te ver!” Mal acabou de dizer aquilo, pensou: “Ai meu Deus, o que é que eu disse!” Ficou baralhada. Ficou até zangada. Aquela ânsia não era profissional. Como acontecera aquilo? Não era suposto sentir aquilo por um paciente. Apaixonara-se ao fazer terapia?

— Nunca me tinha acontecido e já tinha tratado outros rapazes bem bonitos — diz ela, agora.
— Não tanto como eu!
— É verdade.

Dias depois, no fim de uma sessão de terapia sacro-craniana, foram sozinhos até à margem do rio Lis. Sentaram-se num banco de madeira. Declararam-se. Beijaram-se. Quando ela tornou a casa, os pais estavam com os cabelos em pé. O pai ordenou-lhe que deixasse de falar com João. E ela chegou a telefonar-lhe a dizer que não se podiam voltar a ver, mas tudo aquilo lhe parecia tão absurdo que pouco depois voltou atrás. Para os pais, aquela relação não tinha sentido; para eles, tinha.

“Apesar das divergências de crenças, os valores são os mesmos”, acredita a rapariga. “E vi que nutria por ele um sentimento muito grande, muito genuíno de o querer ver bem, de o querer ver feliz e, pronto, tenho aquela mentalidade de que Deus providenciará, faço tudo o que estiver ao meu alcance e a partir daí acredito que há mais ajudas — de pessoas, de Deus.” Pôs todos os pontos em todos os is, não fosse o diabo tecê-las: “Não queria brincar. Tinha de ser uma coisa séria. Não ia deixar de ser crente. Não exigiria que ele fosse.”

Pensou tanto no que lhes estava a acontecer: “Queria perceber muito bem se não estava a iniciar uma relação para salvá-lo, se não estava a agir como uma madre Teresa de Calcutá. Fui percebendo que não era nada disso.” As pressões extremas prosseguiam — pais, amigos dos pais, familiares, amigos. “Diziam tantas coisas. Tinham medo. O que trouxe o medo? Evitamento. Quando começaram a ter contacto com o João, perceberam o que eu vi nele: uma pessoa fantástica.”

Primeiro foi a mãe dela. João precisa de caminhar. Caminha todos os dias, devagar, junto ao Lis. Antes de ir para a Jornada Mundial da Juventude, no Rio de Janeiro, em Julho de 2013, Sofia pediu à mãe que o acompanhasse. Ela começou por dizer-lhe que não, mas fê-lo. Durante três semanas, todos os dias foi buscá-lo. “Conversávamos imenso”, recorda ele. A reformada professora do ensino básico ficou rendida e contagiou o marido, responsável pelos transportes de uma empresa.

Já casada, Sofia apanhou um grande susto. Há semanas, João regressou ao bloco operatório dos Hospitais da Universidade de Coimbra. “Foi angustiante. Fiquei cinco horas sem saber dele. Deixaram-me vê-lo a seguir à operação. Quando o vi acordado, com aqueles bracitos no ar, foi maravilhoso. Ele falava, dizia piadas.” Passou as noites num hostel e os dias no hospital, a ajudá-lo. “Desejava estar lá. Tinha de estar lá e acabou. E senti um grande prazer em vê-lo a recuperar.”

Têm falado muito em ter filhos. Foram a uma consulta de genética ver se podem. Há 50% de probabilidade de passarem a doença ao bebé. Para garantir que tal não acontece, têm de recorrer à procriação medicamente assistida. Podem fazer um diagnóstico genético pré-implantatório.

— Não estou disponível para gerar uma criança com esta doença. Sei o que isto custa, não sou inconsciente.
— Dada a minha crença, estava disponível para aceitar uma criança doente. Acredito que podia ser feliz, mas eu nunca passei por lá.
— Eu sou contra. Não quero correr o risco de gerar alguém que tenha de viver na ansiedade em que eu vivo, na perspectiva de ficar surdo com uma mulher saxofonista. Como é que isto é possível?!

É o novo desafio: salvar a audição de João. Encontrar forma de fazer um tratamento quimioterapêutico que está disponível em Manchester, no Reino Unido. “Salvar a audição é uma coisa importante para toda a gente, mas torna-se premente quando a pessoa já é cega, não é? Ainda nem tivemos acesso ao orçamento. A primeira consulta são 500 libras.” Resta saber se o Estado comparticipa. “Há gente, muito humana, a tentar fazer com que isso aconteça. Depois, há a parte economicista que não se importa que eu fique surdo, cego, incontactável com o mundo.”

Enviado por José Mariano - Fonte. Público

Que fiquem em casa

"o Governo deixou cair o requisito da exigência de piso rebaixado nos autocarros, deixando para segundo plano a questão da acessibilidade para deficientes.” - In Público de 23 de Outubro de 2014
Quando pensamos que não é possível descer mais o nível eis que alguém nos surpreende com mais uma alarvidade digna de um bando de acéfalos. Não nos bastava as constantes violações da lei das acessibilidades, da lei anti-discriminação e até de tratados internacionais, e ainda conseguem violar directivas comunitárias, ao dizer explicitamente a quem ficar com as empresas STCP e Metro do Porto que podem comprar os autocarros que quiserem, sem qualquer tipo de acessibilidade, podemos assim afirmar que a empresa privada, que ficará a ganhar um rendimento fixo pago por todos nós, incluindo pessoas com deficiência, poderá ir à India comprar autocarros com 30 anos e nada lhes acontecerá.

Mais uma vez se prova que o Governo não está minimamente interessado nas pessoas, neste caso concreto as pessoas com deficiência, está sim interessado em beneficiar de forma escandalosa amigos posicionados em determinadas empresas, cujo objectivo é obter lucros astronómicos à custa das pessoas que necessitam dos serviços de transporte público. Não há preocupação nenhuma na melhoria dos serviços prestados, apenas a preocupação em livrar-se do activo que tem, as pessoas com deficiência no Porto irão sofrer e pagar toda esta desumanização, e Portugal entra mais uma vez no quadro dos melhores a retroceder civilizacionalmente, não evoluímos, mantemos os erros e ainda se faz com que estes se propaguem e perpetuem de forma estúpida e acéfala.

Este concurso público anedótico faz-nos prever que os próximos concursos públicos na área dos transportes irão reduzir a nada a acessibilidade aos mesmos, iremos continuar a piorar as acessibilidades, já de si difíceis, aos transportes públicos, tornando-nos um país que finge não ter pessoas com deficiência, onde as leis e as regras, a exigência e a lógica, não existem, são meros papéis.

Fonte: Movimento (d)Eficientes Indignados

Seminário "Inclusão e Empregabilidade na Deficiência"

A Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, através da Divisão de Desenvolvimento Social, e em parceria com as organizações concelhias de apoio à pessoa com deficiência ( Mithós, CerciTejo, CerciPóvoa, AIPNE e APJ), encontra-se a organizar um Seminário subordinado ao tema “Inclusão e Empregabilidade na Deficiência”, que decorrerá no dia 6 de Novembro, entre as 09h30 e as 16h30, no Auditório da Fundação para o Desenvolvimento Comunitário de Alverca (CEBI), em Alverca do Ribatejo.

Serve o presente para os convidar  a estarem presentes neste Seminário cujo Programa se remete em anexo, solicitando-se também a melhor colaboração na sua divulgação.

A Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das Pessoas com Deficiência,adoptada em 2006 vem reiterar o dever da sociedade em assegurar que as pessoas com 
deficiências ou incapacidade possam usufruir de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais na mesma medida que qualquer outro cidadão. A Convenção aponta para a necessidade de fomentar o emprego e a empregabilidade enquanto estratégias ao serviço da inclusão das pessoas com deficiências ou incapacidade.
A integração da pessoa com deficiências ou incapacidade (PCDI) no mercado de trabalho é actualmente entendida como um factor decisivo para a inclusão social, independência económica e consequente valorização e realização pessoal destes cidadãos. 

Cerca de 386 milhões de pessoas em idade de trabalhar são deficientes, segundo a Organização Mundial do Trabalho (OIT). No seu caso, o desemprego atinge os 80%, em alguns países. Os empregadores partem, com frequência, do princípio de que as pessoas com deficiência não são capazes de trabalhar.

Pretende-se neste Seminário discutir as políticas actualmente em vigor de apoio à contratação e encontrar novos caminhos, pois segundo estimativas da Comissão Europeia a taxa de desemprego das pessoas com deficiência é duas ou três vezes superior à dos restantes cidadãos. 

A confirmação das  presenças e a de outros interessados, deverá ser feita através do preenchimento da ficha de inscrição que consta em anexo, devendo a mesma ser remetida para o e-mail da Mithós-Histórias Exemplares( mithos.associacao@gmail.com) ou para o e-mail accaosocial@cm-vfxira.pt ou patricia.macedo@cm-vfxira.pt.

Para qualquer esclarecimento poderão contactar com Dra. Patrícia Macedo através do telefone 263285625, telemóvel 969800055, fax 263283028, ou do e-mail accaosocial@cm-vfxira.pt ou patricia.macedo@cm-vfxira.pt ou para Manuela Ralha, presidente da Mithós, através do telemóvel 963065629.
Cumprimentos,
Manuela Ralha
Presidente da Direção

Enviada pela Mithos

Os nossos irmãos

No seu romance, intitulado "O meu irmão" e inspirado, segundo o próprio, em aspetos da sua vida pessoal, o laureado explora a realidade quotidiana de um jovem que tem um irmão com a síndrome de Down.

A questão das pessoas com deficiência é um tema versado pela Teoria da Justiça contemporânea. No seu livro sobre "Fronteiras da Justiça", a filósofa norte-americana Martha Nussbaum assinala que o contrato social clássico, concebido para pessoas com capacidade de participação política e destinado a proporcionar-lhes vantagens mútuas, tem de ser repensado.

Nós partilhamos fins essenciais com pessoas portadoras de deficiência e construímos com elas o sentido da vida humana. Essas pessoas são cidadãos plenos, compartilham a dignidade humana proclamada pelo artigo 1º da Constituição e não podem ser objeto de discriminações negativas – devendo, pelo contrário, beneficiar de certas discriminações positivas.

As conceções eugenistas, que prescrevem o assassínio de pessoas com deficiência, como a teoria nazi das "vidas sem valor", são eticamente reprováveis e incompatíveis com os fundamentos do Estado de Direito democrático. Será admissível, no entanto, o chamado "aborto eugénico", nos casos de grave doença ou malformação congénita (incuráveis) do nascituro?

O Código Penal português admite, desde 1984, a interrupção voluntária de gravidez nestas situações. Originariamente admitia-se a intervenção abortiva, no caso de "indicação eugénica", durante as primeiras 16 semanas de gravidez. Hoje, porém, o prazo é de 24 semanas, devido à dificuldade de realizar um diagnóstico fiável nas primeiras semanas de gestação.

O que está em causa é saber se é justo e razoável exigir à mulher, em quaisquer circunstâncias, que dê à luz uma criança deficiente numa sociedade madrasta, agressiva, excludente e competitiva.
É a angústia perante este quadro existencial (ou seja, perante o mundo real) que condiciona a dureza da lei e a impede de tratar a mulher como uma criminosa.

A permissão do chamado aborto eugénico e os direitos das pessoas com deficiência situam-se em planos diferentes. Confundi-los é reeditar uma discussão em que se obteve um assinalável consenso já há trinta anos, sem que tenham surgido novos argumentos ou a realidade se tenha alterado – a crise social profunda só pode ter contribuído para agravar o problema.

Por Fernanda Palma - Fonte: CM

sábado, 25 de outubro de 2014

3ª e última parte: 180 km em cadeira de rodas pelo direito a uma Vida Inddependente

Após o relato do que se passou no primeiro e segundo dia da viagem, hoje deixo-vos um resumo do acontecido no dia 25, último dia.

Na chegada á Praça de São Pedro em Alverca, tinha à minha espera o pessoal da Mithós que me seguia desde Vila Franca de Xira, alguns amigos, e também o Srº presidente da União das Freguesias, Afonso Costa e secretária Manuela Santos com o convite para pernoitar no Centro Social São Pedro. Ficamos na confraternização enquanto a Manuela Santos e a responsável pelo Centro preparavam a nossa estadia. Rapidamente a noite, o forte vento de Alverca e o meu cansaço nos obrigou a recolher. Já na cama recebi a visita de muitos amigos. A Anabela Fernandes e família trouxeram um magnífico bolo de chocolate e deliciosa ginjinha caseira, a Cristina Miguel uns deliciosos pastelinhos de bacalhau…juntamente com a sopa de legumes trazida pela Fátima H. Figueiredo e marido, jantar ficou resolvido.

Todos colaboraram. Fui muito mimado em Alverca. Inclusive ganhei mais um cuidador. O José Dias juntou-se à minha cuidadora Cristina Fernandes, e ficou connosco durante a noite para a ajudar. Foi muito importante a sua ajuda. As forças da Cristina e as minhas estavam a esgotar-se. Era muita coisa junta.

 Noite correu bem. Logo cedo recebi a visita da Maria Letra e Sara Dias prontas para nos oferecerem o pequeno-almoço. Pelas 9h da manhã seguimos em direção a Lisboa. Sentia-me confiante e melhor fiquei quando surge o Zé Cunha, ciclista amador que já tinha percorrido 83 km, desde a Azinhaga, terra do nosso eterno José Saramago, para me acompanhar no último trajeto da viagem. Grande ser humano. Já fez o favor de me vir visitar a minha casa. Graças aos excelentes agentes da polícia que nos apoiavam o problema trânsito com mais ou menos dificuldade ficou resolvido e até Lisboa tudo correu dentro do previsto.

Na Praça de Alvalade tinha um grupo de amigos, e alguma imprensa a aguardar-me, e juntos seguimos até ao Ministério da Solidariedade e Segurança Social, onde juntamente com o Jorge Falcato do Movimento (d)Eficientes Indignados, entreguei uma carta aberta destinada ao Srº Secretário de  Estado Agostinho Branquinho, carta essa, que contém um prazo para cumprimento do que prometeu na primeira reunião tida na Assembleia da República em Outubro de 2013. Vou aguardar serenamente. Sabia que esta viagem de protesto não iria resolver a questão Vida Independente, mas siim para mostrar que não me esqueço do que foi prometido e que estou preparado para continuar a luta.




Esta viagem nunca poderia ter acontecido sem o grande apoio da Cristina Fernandes, Manuel Feijão, motorista João e todos os que de uma maneira ou de outra também colaboraram. A todos vocês o meu obrigado do fundo do coração.

Eduardo Jorge

Análise dos parâmetros eletrofisiológicos descritivos dos reflexos interlimb contralateral em pacientes tetraplégicos

Sou Tiago Araújo, Engenheiro Biomédico, docente convidado da cadeira electrónica aplicada na FCT-UNL e neste momento estou a terminar doutoramento na área da electrofisiologia humana. Estou a escrever-vos como um entusiasta pela causa dos pacientes lesionados e para divulgar uma publicação recente no âmbito dos meus trabalhos de doutoramento que poderão ter interesse em conhecer.

O trabalho recentemente publicado, vem no seguimento de uma estadia científica na UNICAMP - Brasil, no final de 2013. Nesta estadia de 3 meses estive integrado na unidade de reabilitação de lesionados medulares do Hospital de Clinicas em Campinas. Tive a oportunidade de aplicar as metodologias que desenvolvi nos 3 primeiros anos do PhD em pacientes tetra e paraplégicos, numa das melhores alas de reabilitação do mundo com o professor Alberto Cliquet, detentor de um cv vastíssimo na área da reabilitação de pacientes com lesão da espinal medula. 

Tive a excelente oportunidade de testar um protocolo de electroestimulação desenvolvido por mim, em pacientes com lesão na espinhal medula, e os resultados foram surpreendentes.

http://www.nature.com/sc/journal/vaop/ncurrent/full/sc2014169a.html

Espero que esta contribuição seja base para muitos avanços na qualidade de vida dos pacientes lesionados 
Grande abraço e qualquer ajuda na disseminação será bem vinda.

Cumprimentos
Tiago Araújo

Adaptable.pt

O projecto ADAPTABLE tem como objectivo o desenvolvimento de vestuário inclusivo, através da adaptação de peças de vestuário disponíveis no mercado às necessidades específicas de pessoas com necessidades especiais (deficiência, incapacidade ou outras, temporárias ou permanentes), englobando também uma vertente de formação na área do tailoring, orientada para pessoas com deficiência ou incapacidades, de forma a potenciar a sua integração no mercado de trabalho.


Informação completa: Adatable.pt

PCeye Go: Sistema de Acesso e Controlo pelo Olhar

A Fundação PT tem-se afirmado como motor de uma nova lógica social que assenta na inclusão digital das populações com necessidades especiais. Desta forma, decidiu apostar no sistema PCeye Go como uma das suas soluções de apoio a pessoas com necessidades especiais.

O PCeye Go está disponível nas lojas da Fundação pelo preço de 699 euros mediante a apresentação da Certidão de Incapacidade Multiuso (Igual ou superior a 60%).

O Pceye Go é um Sistema de Acesso e Controlo pelo Olhar que funciona em computadores portáteis, de secretária ou tablets Windows 8, permitindo ao utilizador trabalhar com qualquer aplicação que também possa ser controlada com o rato.

É compatível com softwares de comunicação como o GRID 2 ou Boardmaker com Speaking Dynamically.

Quem pode beneficiar deste sistema?
- Esclerose Lateral Amiotrófica
- Paralisia Cerebral
- Lesões Vertebro Medulares
- Doenças Degenerativas
- Síndrome de Rett

Avaliações
A ANDITEC efectua avaliações com o sistema PCeye para determinar se o sistema é o adequado.
Para pedidos de avaliação, por favor, envie-nos um email para info@anditec.pt com o seu nome, descrição do caso e contacto telefónico.
Preço
ALUGUER (30 dias) - Pode experimentar o sistema PCeye durante o periodo de 30 dias em sua casa, trabalho ou escola. Mais informações contactar: info@anditec.pt
COMPRA
Fundação PT (Lojas Meo) - 699 Euros PVP (Saiba mais informações sobre as condições especiais)

ANDITEC - 1.990 Euros PVP

Informação completa: Anditec

quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Homem paralisado voltou a andar após transplante usando células do seu nariz

A técnica, descrita como sendo um avanço pioneiro num estudo do jornal científico "Cell Transplantation", envolveu transplantar células olfativas para a espinal medula e construir uma "ponte" de nervos, para ligar as duas pontas danificadas da coluna.

Darek Fidyka é a primeira pessoa com uma lesão no nervo da coluna vertebral desta gravidade a conseguir recuperar desta forma.

"Acreditamos que a intervenção é o avanço que, à medida que for mais desenvolvida, resultará numa mudança histórica nas perspectivas para os que sofreram lesões na coluna", diz Geoffrey Raisman, professor no instituto de neurologia da University College London's (UCL), que liderou a investigação.

O professor disse à BBC que o que os investigadores conseguiram é "mais notável do que o homem ter caminhado na Lua". Darek Fidyka, 38 anos, ficou paralisado em 2010, depois de sofrer múltiplos ferimentos provocados por facadas. Segundo a Reuters, depois de 19 meses de tratamento, recuperou algum movimento voluntário e alguma sensação nas suas pernas.

Fidyka consegue agora conduzir e viver de forma mais independente. Em declarações à BBC, diz que voltar a andar, ainda que com a ajuda de um suporte, é "uma sensação incrível", acrescentando que "quando não se consegue sentir metade do corpo, sentimo-nos impotentes, mas quando a sensação começa a voltar, é como nascer de novo".

O tratamento revolucionário usou dois tipos de células olfativas que possibilitam que as fibras nervosas do sistema olfativo se regenerem de forma contínua. Estas células contribuem para a reparação de nervos danificados, abrindo novos condutores de ligação aos bolbos olfativos do cérebro. Raisman acrescentou ainda que fazer uma ponte na espinha com enxertos de células do doente já era usada em animais há anos, mas nunca tinham sido usadas aquele tipo de células. O tratamento é inovador, tanto que "o mecanismo da interação entre as células não é ainda claro", admitiu o investigador.

Especialistas não envolvidos na investigação reconhecem que estes resultados dão nova esperança, mas alertam que é preciso mais trabalho para perceber o que é que levou a este sucesso, antes de se saber exatamente qual é o real potencial deste tratamento. O plano dos investigadores é repetir o tratamento em novos pacientes nos próximos anos, para que se possa "optimizar os procedimentos", disse Raisman à Reuters.


Fontes: JN e RTP

Pais com filhos com deficiência juntos em apelo à inclusão

Enviado por Cristina Fernandes

sábado, 18 de outubro de 2014

Ai a bexiga...suprabúbica ou uretrotomia?

Dias atrás queixei-me da minha bexiga. Como sabem o sistema urinário de um tetraplégico por lesão medular, a partir do momento da lesão deixa de funcionar normalmente, e há que encontrar uma solução/alternativa para esvaziar a bexiga. Ou seja, espera-nos muitos problemas. No meu caso particular, a minha bexiga foi "reeducada" para ser esvaziada através de manobras (era o nome atribuído e método utilizado em 1991, altura do meu acidente) e nos primeiros 17 anos da lesão foi isso que aconteceu. Consistia em estimula-la através de alguns batimentos na região da bexiga, e a urina drenava através de um dispositivo introduzido no pénis em direção a um saco coletor de urina, ou urinol.

Foi uma época de poucas infeções urinárias, mas não deixava de ser complicado porque dispositivo descolava-se com frequência, e o resultado era a roupa toda molhada com urina. Mas menos mal. Em 2009 começaram os grandes problemas. Procuro especialistas e optamos pelo internamento no CMR Alcoitão para melhor estudar o problema. Estive internado durante 3 meses. Depois de vários exames, foi-me aconselhado o esvaziamento intermitente da bexiga através de um cateter, obviamente que não me foi possível. Eu não consigo realizar esse procedimento, que consiste em introduzir uma sonda várias vezes ao dia, através do pénis até á bexiga e esvazia-la, e também não tinha quem o fizesse por mim.

Conclusão, optou-se pela drenagem contínua da urina com todas as consequências que esse facto acarreta...ou seja, deterioração cada vez maior do sistema urinário. Ultimamente nem a sonda entra. Após a realização de uma uretrocistografia verificou-se que existe uma estenose (estreitamento) da uretra, e fui aconselhado a realizar uma suprabúbica (incisão através do abdómen direto á bexiga) e depois de uma consulta ao Dr Rogério Gouveia, que foi para esquecer, ainda bem que resolvi ouvir mais uma opinião de um especialista em bexiga neurogénica, fui a uma consulta com o Dr Paulo Vale, que me sugeriu uma uretrotomia interna. Aceitei. Estou a realizar exames/análises e serei internado no dia 6 de novembro na CUF Descobertas.

Eu no programa "Agora Nós" da RTP


Ainda a minha viagem de protesto 180 km em cadeira de rodas.

Minha participação no programa "Agora Nós" da RTP, a partir do minuto 22.

http://www.rtp.pt/play/p1629/e168324/agora-nos/385609

Encontro sobre deficiência, igualdade e diferença em Abrantes

Serão abordadas as temáticas: respostas sociais, educação, integração, sexualidade e reabilitação. Haverá, também, a partilha de testemunhos de vida e a apresentação do livro "Unidos no Amor contra a Indiferença" de Isabel Barata.


Em breve programa completo

Porto, uma cidade inclusiva

A minha visão sobre as acessibilidades no Porto foi modificando de acordo com três fases distintas de mobilidade e autonomia na minha vida, que irei nomear e descrever em seguida:
1) Quando era totalmente autónomo na locomoção. 
2) Quando me deslocava com a ajuda de uma canadiana.
3) Quando senti a necessidade de me deslocar definitivamente numa cadeira de rodas eléctrica. 
1) Primeira Fase
Nesta fase a minha mobilidade e autonomia eram totais. Assim, vi e senti verdadeiramente o encanto e a mística do Porto nas diferentes actividades a que me fui dedicando, como a ida às compras com a minha mãe na Rua de Santa Catarina, ou,mais tarde, quando saia à noite e frequentava os bares da Ribeira com os meus amigos, ou participava nos jantares, serenatas da minha tuna e nas suas actuações no Coliseu do Porto; ou quando ia aos jogos do FCP ou passeava na Foz e no centro da cidade; e também quando tinha de tratar dos meus assuntos pessoais. 

Universia e Fundação Universia favorecem a inclusão de pessoas com deficiências nas universidades ibero-americanas

Fundação Universia lança a Plataforma ‘Universidade e Incapacidade na Ibero-américa’, um portal que tem como objetivo sensibilizar e favorecer o acesso de pessoas com deficiências ao ensino superior. Este portal, que recolhe exemplos reais de boas práticas, oferece um diretório de livre acesso, único até ao momento, onde se podem consultar os serviços especiais para pessoas com deficiências, de todas as universidades dos países ibero-americanos.

A Fundação Universia, juntamente com a colaboração do Universia, acaba de lançar este portal que tem por objetivo ser o ponto de referência para a difusão das boas práticas já existentes, e de consulta das unidades ou serviços responsáveis pelas questões relacionadas com estas matérias, de todas as universidades ibero-americanas.

De caráter permanente, a plataforma ‘Universidade e Deficiência na ibero-américa’, que conta com a colaboração da Fundação ONCE e da Fundação de PwC, tem um duplo objetivo: sensibilizar e favorecer o acesso de pessoas com deficiência ao ensino superior e incrementar o desenvolvimento de uma universidade inclusiva. Para conseguir este objetivo, o site conta com duas secções, cuja missão é divulgar a informação sobre as universidades participantes.

A secção de “Boas Práticas” que visa desenvolver e divulgar um catálogo de ações inclusivas que podem ser partilhadas e replicadas noutras universidades, serve também como repositório de experiências positivas. Entre as distintas categorias, encontram-se propostas sobre o acesso ao emprego de universitários com deficiências, novas tecnologias da comunicação, procedimentos de recolha e orientação de bolsas, ajudas e prémios a estudantes com deficiência, entre outras áreas temáticas.

Relativamente à secção "Espaço Universidades ibero-americanas", pretende-se contar com um diretório de áreas/serviços especiais para os estudantes ibero-americanos com deficiência, único até ao momento, e aberto para consulta a qualquer pessoa interessada. Com este objetivo, toda a comunidade universitária que desenvolve trabalho no âmbito da igualdade de oportunidades está convidada a participar, partilhando as suas experiências positivas e os seus programas.

III Encontro de Reitores

O lançamento desta plataforma enquadra-se no III Encontro Internacional de Reitores Universia. Fruto de um acordou assinado entre a Fundação ONCE, a Fundação de PwC e a Fundação Universia para fomentar a formação superior de pessoas com deficiência, contou com a colaboração do Ministério dos Assuntos Exteriores. O acordo foi celebrado no âmbito de um painel em que foram analisadas as questões relacionadas com a inclusão das pessoas com deficiência no âmbito universitário.

Participaram neste encontro Marcelo Fernandes de Aquino, reitor de UNISINOS (Brasil), Ignacio Sánchez Díaz, reitor da Pontifícia Universidade Católica (Chile), Jose Eduardo Hernández Nava, reitor da Universidade de Colima (México), José Eduardo Hernández Nava, reitor da Corporação Interuniversitária Ibero-americana (Colômbia), Rafael Stand Niño, presidente do Centro Internacional de Responsabilidade Social & Sustentabilidade (Colômbia) e Manuel López Pérez, reitor da Universidade de Zaragoza (Espanha) e presidente da Conferência de Reitores de Universidades Espanholas (CRUE).

Para além disso, fruto do III Encontro de Reitores, foi assinada a Carta do Rio, uma espécie de roteiro para as Universidades Ibero-americanas. Neste documento, especialmente no ponto 2, será abordada a questão social: http://issuu.com/universiario2014/docs/carta_rio_final_pt_d87a0851130b82?e=0/8837835http://estudos.universia.net/portugal/curso/tipos-de-curso/licenciatura

Fonte: Rostos

Posição da ACAPO sobre o modelo de promoção da vida independente, anunciado recentemente pelo Governo

ACAPO marca posição sobre modelo de promoção da vida independente, anunciado recentemente pelo Governo.

Integrando, ao lado da Humanitas e Associação Portuguesa de Deficientes, a Comissão para a Deficiência, constituída no seio da Secretaria de Estado da Solidariedade e Segurança Social, a ACAPO teve oportunidade de conhecer as propostas do Governo quanto ao modelo de promoção da vida independente, o qual consiste na realização de formação de assistentes para pessoas com deficiência, para apoio em atividades da vida diária. Este programa de formação, que já se encontrava aprovado no passado mês de janeiro e que foi recentemente anunciado pelo Governo, será realizado em parceria com a União das Misericórdias Portuguesas. 

Quando recebeu o esboço do programa de formação proposto, a ACAPO teve a oportunidade de propor alterações ao mesmo, tendo em vista a inclusão, como matérias do curso, noções básicas de orientação e mobilidade, AVD’s e Braille. Quanto à realização e conteúdos da presente formação, a posição da ACAPO foi de não a obstaculizar, tendo em atenção que a mesma já havia obtido financiamento para avançar e, não sendo a solução adequada para fazer frente a este problema, seria um primeiro passo no sentido da formação de possíveis futuros assistentes pessoais. 

Contudo, deixou claro perante as instâncias governamentais que, tanto os conteúdos formativos, como o perfil dos candidatos a assistentes pessoais, não eram os mais indicados, devendo a solução experimental passar pela seleção de pessoas com maior proximidade aos destinatários destes serviços, bem como por um modelo de formação mais prático e direto entre prestador e destinatário. Por outro lado, entende igualmente, contrariamente ao defendido pelo Governo, que no âmbito do conceito de vida independente devia ser reconhecida à pessoa com deficiência, autonomia para decidir sobre a sua própria vida, devendo esta poder escolher o seu assistente pessoal, treiná-lo e avaliando o seu desempenho, poder até dispensá-lo. 

O comunicado do Governo sobre este assunto poderá ser lido através do site www.portugal.gov.pt na área do Ministério da Solidariedade, Emprego e Segurança Social.

Fonte: ACAPO

domingo, 12 de outubro de 2014

2ª parte: 180 km em cadeira de rodas pelo direito a uma Vida Independente

Dias atrás contei-vos como foi o primeiro dia da minha viagem, desta vez irei fazer-vos um resumo do que aconteceu no segundo dia, no trajeto entre Almeirim e Alverca do Ribatejo.
A noite passada no átrio do edifício da CM em Almeirim, não deu para descansar o suficiente. Após uma higiene “à gato”, seguimos na companhia da Gracinda e Cláudia Constantino durante uns quarteirões, e lá fomos diretos a Benfica do Ribatejo que praticamente não deu pela nossa passagem. Neste segundo dia também se juntou a nós (eu, Cristina e Sr João) o Manuel Feijão no quadriciclo Canta.
Após Almeirim saído do nada surge uma senhora a incentivar-me e a correr ao meu lado. Soube muito bem a sua companhia durante uns metros. As surpresas continuam. Mais á frente uma grande emoção, vejo à beira da estrada o João Ramalho, uma pessoa que admiro, marido de uma pessoa muito especial para mim, e a passar por momentos muito difíceis, e de quem tenho muitas saudades. Foi a segunda vez durante o inicio da viagem em Concavada que parei. Aquele abraço trocado foi muito reconfortante.
Até ali ouvia esporadicamente buzinas dos veículos que se cruzavam connosco a tocar e gritos de incentivo, mas de repente começo também a ouvir com frequência a frase. “Força Eduardo Jorge!”. Foi muito estranho e surpreendente. Pensava para comigo, mas como sabem o meu nome? Ainda estou para o saber, mas que soube muito bem, soube. A juntar ao apoio dos condutores que se iam cruzando connosco, existiam também algumas pessoas paradas junto aos seus veículos a baterem palmas e tirar fotografias, mas se mesmo assim surgisse a solidão lá vinha a incansável Cristina Fernandes começar a cantar ao megafone o “alecrim aos molhos” e por aí fora. Eu acompanhava-a com gestos da cabeça. Era uma animação. Quando já não aguentava mais, levantava o braço esquerdo, encostava a cadeira á berma da estrada e segundos depois lá estava literalmente em cima de mim a Cristina a abraçar-me, beijar-me e preocupadíssima a perguntar se estava bem, o que queria, se era uma barrita de chocolate, água, despejar-me a bexiga…etc. E Sr João, nosso motorista, menos interventivo, mas a cobrir-me com seu olhar meigo e ternurento.
Um desses momentos foi à entrada de Muge. O braço que comandava o joystick da cadeira de rodas mais uma vez estava esgotado, ouvidos doíam sem parar, bexiga idem…mas todo esse desgaste é amenizado porque do nada surge outro banho de amor e solidariedade. Aparece a Fátima Henriques Figueiredo e marido com uma bela sopa para o almoço, uma senhora que nos tinha visto no noticiário da SIC a disponibilizar-nos a sua casa em Benavente para descansarmos, mais alguns carros que pararam e pessoas fizeram questão de me cumprimentar, e também carro de reportagem do CM para me realizar uma entrevista em direto. Antes de voltarmos à estrada combinou-se que desta vez o piquenique/almoço seria em Porto Alto.

Em Benavente foi maravilhoso ver a Mónica Silva, uma amiga tetraplégica que não via há uns anos, como a troca de um abraço ou beijo entre tetras dá uma grande trabalheira, optei por cumprimenta-la através de uns carinhos na sua pernoca sem sensibilidade, mas aquele gesto, tenho a certeza que o sentiu. Em Marinhais/Salvaterra de Magos juntam-se a mim duas moças que faltaram ao trabalho para me acompanharem. Fizeram-no durante vários quilómetros. Iam-se revezando. E uma delas fez o favor de agravar a sua tendinite. Foram momentos muito especiais. Dois seres humanos movidos por causas. Quero muito voltar a vê-las.
Em Porto Alto paragem à beira da estrada para almoço/piquenique. Souberam muito bem as pizzas que sobraram do jantar em Almeirim, a sopa da Fátima e Davide reservou-se para o jantar. Já na saída surge uma amiga a correr ao meu lado com o carrinho da sua filha Carolina recém nascida, graças à paragem obrigatória junto aos agentes policiais que nos aguardavam para apoiar, foi possível conhecê-la. Desde a Chamusca que não tínhamos o apoio da polícia. Mas a sua simpatia e disponibilidade recompensou a ausência dos colegas. Até aquele momento praticamente não existiu interação entre mim e polícias de trânsito, eles limitavam-se a cumprir o seu serviço e eu o meu objetivo, mas com estes agentes tudo mudou. Foi como se mais alguém se juntasse à causa.
Na entrada para a reta do cabo junta-se a mim o Vitor Martins na sua cadeira de rodas. Penso para comigo, “estou em casa”. É muito bom sentir o apoio dos ditos normais, mas dos “coxos” como eu, ainda sabe melhor. Mas por mais que tentássemos ludibriar a Cristina, pondo-nos na cavaqueira, lá surgia ela com megafone em punho, “meninos é muito perigoso”, a pôr-nos literalmente em linha. Mal entro na reta, cadeira de rodas esgotou suas forças e foi complicado trocar de cadeira num lugar tão movimentado, mas o trânsito foi muito bem controlado pelo agentes e tudo correu bem. Lá seguimos, mas estava a ver que nunca mais chegava à ponte de Vila Franca de Xira. Que grande reta…é caso para dizer que valeu a pena esperar. As paisagens vislumbradas a partir da ponte são fantásticas.
Em Vila Franca de Xira, lá estava a Mithós em peso. Vi-os ao longe e comovi-me mais uma vez. Agradeço-lhes de coração aquela calorosa receção. Eram muitos e bons. Seguimos juntos até à porta da CM onde tínhamos a aguardar-nos o seu executivo. Tudo a correr tão bem, até que lá nos aparece uns bons metros daquele piso irregular que de tanta trepidação quase nos saltam as vísceras pela boca. Mas na companhia de tanta gente boa, até se fez bem. Gente boa que nos fez questão de acompanhar até Alverca, onde fomos recebidos maravilhosamente. Como tudo se passou contarei na última crónica sobre a viagem. Até lá.

Continua...
Eduardo Jorge