quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Entrevista com tetraplégico que inspirou o filme Intocáveis

Abaixo, entrevista com Philippe Pozzo di Borgo, tetraplégico, cujo livro da sua autoria Segundo Suspiro inspirou o filme de enorme sucesso Intocáveis.

EU: Vi o filme e sinceramente não achei nada demais. Prefiro mil vezes filmes do estilo de O Escafandro e a Borboleta que este género. De qualquer maneira fixei duas frases que me dizem muito. Ambas ditas por Philippe (personagem tetraplégico) quando passeavam a altas horas da noite junto ao Rio Sena. 1ª frase: "Não sinto nada mas sofro" e 2ª: "Há muito que não via paris a esta hora". Pela negativa destaco uma cena onde o Driss (seu cuidador) despeja chá em alta temperatura propositadamente para suas pernas e se certificar que Philippe não tinha sensibilidade.

Eduardo Jorge

Por que o senhor acha que o filme fez tanto sucesso?

Vivemos em uma época de ansiedade muito grande, por causa da situação econômica e política mundial. Então, acho que as pessoas ficaram felizes de ver que dois caras em péssimas condições ainda podiam aproveitar muito bem a vida e ajudar um ao outro. Há uma grande necessidade de reconciliação, de aceitação das diferenças e das fraquezas, de aproveitar o momento. Isso, somado ao grande talento dos diretores, atores e produtores envolvidos, foi o responsável pelo sucesso do filme.
Uma das cenas do filme “Intocáveis”.



Por que decidiu contar sua história em um livro?

Depois da morte da minha mulher, eu passei por uma depressão terrível, que eu não tinha vivido apos o acidente que me deixou paraplégico, ocorrido três anos antes. Quando Beatrice morreu, suas ultimas palavras foram: ‘Você tem que seguir em frente, e expressar sua dor em palavras vai te ajudar’. Dois anos depois, eu estava deitado há meses, com dor, e comecei a gravar frases em um gravador portátil. Pouco a pouco, pelos próximos dois anos, eu revivi minhas memórias, a maioria delas no silêncio da noite, e comecei a me reconstruir. Então comecei a gostar das palavras, e passei a trabalhar no livro.

Qual foi a parte mais difícil de se tornar deficiente físico?

Não conseguir pegar minha mulher e meus filhos no colo.

O que mudou na forma como o senhor vê a vida? Muitas coisas. Primeiro de tudo, ver o mundo de uma cama ou de uma cadeira de rodas não é o mesmo que vê-lo em pé. Eu descobri que eu era frágil, não era eterno, e que o tempo contava. Mas, especialmente, que a dor me deixa desconfortável e que, portanto, cada momento que eu me sinto bem tem que ser completamente aproveitado. Eu não gasto meu tempo em coisas desnecessárias. Ser totalmente dependente dos outros requer que você seja agradável com eles, do contrário, eles me esquecerão. Antes do acidente, eu costumava usar muito a minha influência para conseguir o que eu queria. Não é a melhor maneira e a sociedade seria muito mais agradável se nós pedíssemos as coisas gentilmente. Eu aprendi a ser paciente, especialmente durante as noites longas de insônia, e a conviver com o silêncio.

Qual foi a primeira coisa que passou pela sua cabeça quando conheceu Abdel? E por que decidiu contratá-lo?

Pensei: ‘Esse é exatamente o cara que eu preciso, ele é inteligente, relaxado, rápido, forte, vai conseguir me ajudar a cuidar da minha mulher e da minha condição física’.

Como está Abdel? Qual é a relação de vocês hoje?

Ele está casado há 8 anos, tem 3 filhos dos quais ele se orgulha muito. Ele está um pouco fora de forma e por isso prefere ser gentil a entrar em uma briga. Esses dias ele me disse: ‘Se eu cruzasse com o antigo Abdel, perderia.’ Nós nos vemos constantemente, ou na França ou no Marrocos, e às vezes nos encontramos em eventos para a imprensa. Os filhos dele me chamam de “tio” e minhas filhas o tratam da mesma maneira.

Muitos diretores procuraram o senhor e Abdel antes de Olivier e Eric. Por que deixaram que eles fizessem o filme?

Eu gostei muito da generosidade e da inteligência com que eles levaram o filme. Eu já fui procurado por grandes nomes, mas nunca tinha consentido porque faltava senso de humor. Embora eles tenham adaptado a história, minha mulher e eu ficamos com a impressão de que os detalhes ainda estão lá. Ao mesmo tempo, nossos amigos estavam rindo e chorando ao mesmo tempo, então sentimos que alguma coisa havia acontecido. Na première em Paris, as pessoas bateram palmas por vários minutos em pé. Os diretores merecem esse sucesso, pois acertaram o tom. Uma semana depois, eles mostraram o filme no hospital para deficientes físicos no qual eu passei algum tempo nos últimos 20 anos, e somente as pessoas mais debilitadas podiam entrar. Você devia ver as risadas deles.

Entrevista e informação completa: Deficiente Ciente

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