quinta-feira, 9 de julho de 2015

Vou ser institucionalizado. O sistema venceu?

Há vários dias que procuro em vão palavras para iniciar este texto.

Até agora não surgiram.

Chego a sentir que estou a fugir do assunto, a adia-lo, que não o quero fazer, outras vezes penso que é necessário esperar o momento e o local certo...

mas hoje, dia 01/07/2015, 22h14, ao som do Rui Veloso, deitado como me deixou a Rafaela e até que a Euridice não me venha voltar a posicionar lá pela meia-noite, esboço um tentativa de finalmente começar a escrever.

Isto de deitar cá para fora através da escrita o que vai na alma pelos vistos não é fácil.
Ainda por cima quando se trata de resumir emoções desconhecidas. Estou a viver um turbilhão de sentimentos e sensações, pior de tudo é esta sensação de não estar a fazer o certo, sinto-me como se estivesse a fazer algo muito errado, a desiludir alguém, a entregar os pontos e a dar-me como vencido...neste momento é o que sinto, e magoar os outros, mas principalmente a mim, é algo que quero evitar.

A minha luta pela desinstitucionalização é conhecida por todos, mas eu vou institucionalizar-me dia 21 de Julho próximo. Esse facto está a fazer-me muito mal. É difícil não sentir uma sensação de derrota.

É muito complicado estar nesta posição. Sinto-me muito confuso.

Mas tenho que aceitar de uma vez por todas que continuar a viver sozinho, durante 16 horas do dia, neste estado frágil de saúde que me encontro não posso continuar. Suores persistem, escara idem, intestinos e bexiga não me dão sossego.

É impossível continuar a viver nestas circunstâncias.

Além do factor saúde e impossibilidade de continuar sozinho existiram outros motivos que me levaram a optar por me mudar para um lar. São eles: Uma fantástica e inesperada oferta de emprego que me foi dirigida pelo Centro de Apoio Social da Carregueira (CASC); a impossibilidade de continuar a trabalhar onde me encontro, com contrato após o término do estágio profissional que estou a realizar na União das Freguesias de Alvega e Concavada (UF), e o facto da proposta de emprego me ter sido dirigida por pessoas muito especiais e que têm a minha admiração pela maneira humana como administram a minha futura Instituição. Pessoas essas que conheci aquando da realização da minha viagem de protesto até Lisboa em cadeira de rodas.

Ter um trabalho hoje em dia é um enorme privilégio, ser-se desejado como foi o meu caso é uma sensação maravilhosa. Após adquirir a minha deficiência só tive direito a estágios ao abrigo dos programas de emprego subsidiados pelo IEFP e (contratos de emprego-inserção +) praticamente mendigando…sem dúvida que o factor emprego conta muito, mas não vou deixar de ser obrigado a habitar num lar de idosos.

Vamos aos factos: irei mudar-me para o CASC, no dia 21 próximo, e iniciarei funções a partir do dia 01/08/2015. Estive hoje na Instituição a escolher o quarto e a esclarecer últimas dúvidas.

Agora é preparar a mudança e retribuir com trabalho a confiança que a direcção do CASC depositou em mim.

DESISTI DE LUTAR?

Não, desistir nunca será uma opção, mas as minhas limitações levaram a melhor por enquanto. Vou tentar resolver os problemas de saúde que me têm surgido, e criar condições para poder continuar ainda mais forte e convicto.

Tinha a continuação da greve de fome programada para o passado dia 10/6, mas nestas condições e circunstâncias era impossível realiza-la, facto que me doeu muito e ainda dói.

TRISTEZA

Sair da minha casa e meu ambiente social, onde adoro viver e queria continuar. Separar-me dos meus cães Aramito com 5 anos, e Kiko com 1, assim como das plantas que me foram deixadas pela minha mãe e minha horta, está a ser muito doloroso.

AGRADECIMENTOS

Principalmente à população da Concavada e Ribeira do Fernando, assim como restantes moradores da União das Freguesias por tudo que me ensinaram.

Ficarão para sempre no meu coração.

Cá no fundo existe a esperança de voltar um dia, por isso deixo não um adeus mas um até breve.

Saio com a convicção de dever cumprido. Nunca esquecerei estes quase 4 anos de crescimento e aprendizagem, numa área que quanto a mim não é explorada como deveria ser no percurso académico, pois existe cada vez menos preocupação em promover a dignidade e o valor das pessoas no interior do nosso país, anos esses que me deixam com uma sensação de conquista e vontade de continuar a aprender e desafiar as minhas capacidades, desta vez noutro lugar.

Espera-me um novo desafio que será encarado com enorme orgulho e a mesma determinação e paixão de sempre.

Também não poderia deixar de agradecer ao anterior executivo da Junta de Freguesia da Concavada, assim como aos actuais membros que dirigem atualmente a recém criada União das Freguesias de Alvega e Concavada, pela oportunidade que me deram de trabalhar numa área que tanto prazer me dá (Serviço Social), a todos os meus colegas, Câmara Municipal de Abrantes, Centro de Reabilitação Infantil de Abrantes, principalmente Drº Humberto Lopes, e ainda a Dra Lurdes Botas do Serviço de Emprego de Abrantes pelo excelente trabalho que está a realizar em prol da empregabilidade das pessoas com deficiência no nosso Concelho.

Um obrigado muito especial ao Sr Joaquim Catarrinho pela sua dedicação e carinho ao  cuidar das minhas maleitas físicas e não só durante vários anos, e às minhas cuidadoras Lidia Correia, Euridice Varela e Rafaela Fialho pela paciência que tiveram comigo. Deveria agradecer a muitas mais pessoas, mas o espaço não o permite, sendo assim quero que saibam que ficarão sempre no meu coração. A todos vocês o meu muito obrigado!

Para finalizar quero deixar bem claro que me sinto um afortunado por poder continuar a trabalhar, e sou muito grato a quem me realizou o convite. Minha grande angústia reside no facto de ainda não ter conseguido, através das ações de luta que me propus, alterar esta politica da institucionalização compulsiva levada a cabo pelo nosso Governo. Meu grande dilema não é institucionalização em si, mas o facto de ser obrigado a isso, de não existirem outras alternativas para quem depende do apoio de terceiros, mas principalmente o facto de eu não ter ainda conseguido reverter esta situação através das ações de luta que tenho realizado.

Eduardo Jorge

8 comentários:

  1. Com tudo isto conseguiste emocionar-me !!! Há três coisas na vida que nunca voltam atrás: a flecha lançada, a palavra pronunciada e a oportunidade perdida.
    (provérbio chinês)....pensa bem neste proverbio e vais ver que tem o seu fundamento....

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    1. Tu fazes parte desta mudança. Entraste numa altura complicada da minha vida.
      Ajudaste-me a curar muitas feridas na alma.
      Obrigado por tudo e desculpa qualquer coisa.

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  2. Olá querido amigo,
    Fico triste e contente pela tua decisão.
    Julgo que é racional, tu que tanta lutas-te e lutas contra o sistema pelos vistos vais cair nele, sei pelo que tu dizes que é para o teu bem e assim sendo não há sistemas que registam. Só te desejo tudo como fosse para mim...
    Um grande abraço e vamos continuar a nos ver ...

    Miguel Loureiro

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    1. Disseste bem. Não me deram saída. Engoliram-me amigo. Engolem-nos a todos.
      Mas eu voltarei. Eles que me aguardem.

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    2. Eduardo, voltas e vais voltar FORTE. Só nos cruzámos uma vez mas podes contar comigo se em algum caso considerares que posso ajudar. Deixei a BP após 23 a trabalhar numa multinacional muito competitiva. Fui desafiado pela SCML a implementar um projeto de comunicação interna. Já abordei o teu caso no âmbito da agenda da Santa Casa mas a questão passava por uma situação similar a que vais enfrentar agora. Vai iniciar-se um projeto que nomeei com Reabilitar (con) Vida que passa por uma oferta de um serviço que pode vir a ser parecido com aquele por quem tens lutado. Ainda vai demorar algum tempo. estarei atento e darei noticias. Um abraço do Fernando Cardoso (fernando.mcardoso@scml.pt). FORÇA.

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    3. Quantas novidades Fernando...desejo-te boa sorte nesta nova eetapa e obrigado pela solidariedade.
      Vai dando noticias sobre o projeto "Reabilitar (con) Vida".
      Fica bem

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