O turismo europeu perde 142 mil milhões de euros por ano – quase 400 milhões por dia – devido à falta de acessibilidades, revela um estudo recente da Universidade de Surrey, no Reino Unido. Se todos os destinos europeus fossem acessíveis, seriam ainda criados 3,4 milhões de empregos no setor. Hugo Vilela e Luís Filipe Silva, dois jovens empreendedores do Porto, criaram a Places4All para tornar Portugal acessível e mudar mentalidades.
“Os deficientes motores, sensoriais ou cognitivos não são incapazes, nem estão fechados em casa, escondidos do mundo como noutros tempos”, reclama Luís Filipe Silva, 43 anos, cuja companheira se desloca em cadeira de rodas desde que um atropelamento lhe retirou a autonomia que a maioria toma por certa.
No dia a dia, quem não acompanha ou sofre de algum tipo de deficiência, na maioria das vezes não se apercebe da quantidade de obstáculos à mobilidade – desde o buraco na rua à falta de rampas na entrada dos serviços, passando pelos degraus de acesso às lojas, hotéis e restaurantes. Quem não vê, raramente encontra instruções sonoras em museus ou num simples elevador. E os surdos, a quem o empregado grita o prato do dia, como se assim se fizesse ouvir?
Pois isto é a realidade de um em cada cinco portugueses que, diariamente, procuram acessibilidades para levar a cabo as suas atividades normais, de acordo com os dados compilados pela Places4All.
“A autonomia não tem de ser limitada porque nos deslocamos em cadeira de rodas ou porque somos cegos ou surdos”, defende Hugo Vilela, 34 anos, a quem a distrofia muscular diagnosticada aos 4 anos de vida acabou por retirar mobilidade no início da idade adulta. Licenciado em Economia e com um mestrado em Inovação e Empreendedorismo Tecnológico, Hugo Vilela estudou a questão da mobilidade no âmbito de um projeto académico que contemplava a criação de um serviço de aluguer de sistemas de mobilidade que chegou a ganhar alguns prémios de empreendedorismo. “Percebi, contudo, que o projeto não funcionava sem acessibilidades e daí nasceu a Places4All”.
Este projeto de empreendedorismo social consiste num sistema de avaliação baseado em quatro parâmetros – acessos (inclui estacionamento e transportes públicos, por exemplo), exterior (aqui avaliam-se rampas ou obstáculos, entre outros), percurso interior (além da mobilidade, analisa-se a informação visual ou sonora) e os bens e serviços – que dão origem a uma classificação de 0 a 100 e que será divulgada como “selo de qualidade” dos locais. Entre os 55 locais já avaliados em todo o país contam-se as áreas de serviço Eurest nas autoestradas, o Museu da Eletricidade, Oceanário, EDP, World of Discoveries ou a Torre dos Clérigos, entre outros.
A Torre dos Clérigos é um exemplo: criou uma sala onde a vista do topo é transmitida em tempo real e em todas as direções. Foto: Rui Oliveira / Global Imagens) “A Torre dos Clérigos é um bom exemplo de uma atração turística inacessível não só a deficientes, mas também a pessoas idosas”, refere Luís Filipe Silva. As últimas dezenas de degraus nunca serão transponíveis para quem tem dificuldades motoras, mas a direção percebeu que a melhor forma de acrescentar visitas ao meio milhão que já contabiliza anualmente é atrair novos mercados aumentando a qualidade. Assim, no último piso acessível de elevador, montaram uma sala especial onde câmaras transmitem, em tempo real, tudo o que pode ver-se do cimo da torre.
“A acessibilidade afeta o deficiente ou o idoso, mas também toda a família que o acompanha. Qualquer saída ou viagem tem de ser planeada mediante a acessibilidade, por isso estamos ainda a desenvolver uma app que indicará, no raio de 500 metros, os locais acessíveis”. A formação de mais auditores e de recursos humanos na hotelaria e restauração, bem como a consultoria de obras – que não quiseram incluir no portfólio de serviços, para manter a credibilidade dos relatórios – estão nos planos de futuro próximo da startup, que não pretende ser lucrativa, apenas sustentável.
“A acessibilidade é a minha missão de vida e, agora, é também o meu trabalho. E não vou descansar enquanto não deixar de ser encarada como facultativa. Tem de ser universal”, remata Hugo Vilela.
Fonte: Dinheiro Vivo
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