Malditas escaras...iniciei no texto anterior este assunto.
A primeira escara atingiu-me na região do cóccix durante o primeiro internamento, enquanto estava acamado na cama tipo Stryker e com tração cervical. Demorou a fechar, mas não alterou em nada a minha rotina. Não fazia ideia o que era uma escara, cóccix... a segunda aconteceu-me meses depois, enquanto estava internado numa clínica particular. Desta vez, no trocânter direito. Atrasou minha reabilitação e deixou-me num estado lastimável. Sofri muito até me ver livre dela. Foi necessário cirurgia plástica e vários meses de cama e tratamento. Fui transferido para o Hospital Curry Cabral. Ainda bem, porque fizeram um grande trabalho e nunca mais tive problemas naquela região. Inclusive, cada vez que outros médicos vêm a grande cicatriz (só numa parte aplicaram 76 agrafos) falam em voz alta que está ali um excelente trabalho. Para mim está feio e esquisito...mas o certo é que resultou e sei que não foi fácil. Tiveram que raspar uma parte do osso e o orifício aberto infectado tinha uma respeitável dimensão e profundidade. Inclusive, os enfermeiros, ao mudar o penso, comentavam com frequência que o buraco comia imensas compressas.
Tive outras menores, não úlceras devido a pressão, mas sim queimaduras nas pernas e pés por me terem colocado saco de água quente. Como não tenho sensibilidade nenhuma, as queimaduras foram graves. Demorou bastante tempo até fecharem por completo. Era inverno e usar sapatos e meias de gola alta como lhes chamo (aquelas de algodão -agora térmicas- que nos protegem até a virilha) não facilitava a cicatrização.
Tive outra queimadura profunda na axila. A única maneira que conseguia me alimentar enquanto acamado era virado em decúbito esquerdo. Ficava com o braço direito livre (sendo o que tem mais força e coordenação) e conseguia levar a comida à boca, sem ajuda. Neste caso, era sopa. Tinha que ficar com a tigela bem encostada ao braço esquerdo para não cair e entornar o conteúdo. A tigela estava muito quente e queimei-me. Foi mais fácil a cicatrização porque era num lugar onde não fazia pressão e podia estar sem penso.
Não posso deixar de relatar uma história muito esquisita e até sinistra que me aconteceu. Há dias que eu era obrigado a ficar sozinho o dia todo na cama. Quando sou obrigado a ter de ficar mais de 4 horas no mesmo decúbito, como é o caso nos dias em que fico sozinho, fico de decúbito ventral (barriga para baixo). Esta é uma posição difícil e desconfortável e no início temos dores insuportáveis, ou devido reconstrução da coluna cervical, ou falta de ar…mas vamos nos acostumando. Não tive ninguém que me levantasse e lá tive que ficar de cama o dia todo e, neste caso, deitado de barriga para baixo. Ao chegarem a casa e ao me virarem depararam com um grande concentrado de formiguinhas (aquelas minúsculas que surgem no verão) de volta do meu tornozelo do pé direito.
Existia uma imensidão destes insetos em cima do meu pé, e o tornozelo estava sem pele. Já tinham comido literalmente a pele e continuavam a avançar. Demorou algum tempo a cicatrizar. Este episódio mexeu bastante comigo. Casa limpa, embora saibamos que estas pragas de formiguinhas, todos os verões, nos criam problemas, mas se apareciam, íamos no seu formigueiro e, através de inseticidas próprios, resolvíamos a questão, mas nunca pensei que acontecesse algo parecido. Pior foi a sensação de saber que estava tranquilo e elas a alimentarem-se de mim sem perceber nada. O médico achou que deveria estar com os valores de Glicemia no sangue altos e que elas o pressentiram, mas fiz análises e tudo estava normal.
E, por fim, minha última escara aconteceu entre 2001 e 2005. Certo dia apareceu uma mancha de cor esquisita no ísquio, por baixo nádega esquerda. Ao examinar a nádega verificou-se uma pequenina greta. Para mim o melhor tratamento é não fazer pressão sobre a região afetada e foi essa a minha primeira preocupação, por isso fiquei de cama e nunca mais me virei para cima da região afetada. O médico examinou-me, medicou-me e dois meses depois tudo estava aparentemente normalizado. Comecei a fazer levanto para a cadeira de rodas pouco a pouco, primeiro dia durante 45 minutos, segundo dia uma hora...e fui prolongando o tempo. Ao quarto dia ao deitar-me penso tinha sangue. Primeira decepção...comecei tudo outro vez...cama até que fechasse e cicatrizasse...pequenos levantes...voltou a verter sangue.
Comecei a consultar vários especialistas, e solução não havia. Teria que ficar para sempre acamado, inclusive estive internado durante uns dias na CUF Infante Santo para ser examinado com calma, e nada. O veredito foi que se me operassem um ano depois estaria igual, invocavam que tinha pouco músculo para ser transplantado porque na primeira escara que tive tinham-me eliminado grande quantidade. Vim para casa muito desanimado e faltava-me consultar com uma diretora da cirurgia plástica do Hospital São José. Marquei a consulta e lá fui eu. Ao chegar, enfermeira e auxiliares transferem-me para uma marquesa e deixam-me de rabisque para o ar, tiram o penso e chega a médica, que a primeira coisa que diz foi: onde está o dreno? Eu respondi que nunca deixei chegar ao ponto de infectar e por isso não usava dreno. Prontamente respondeu que aquilo estava bem, ainda por cima saia sangue limpinho, tinha boa aparência e que não fizesse pressão sobre a região afectada. Mas tudo a mil por hora e desapareceu. Sai da sala e fui procurá-la.
Com muito custo, lá me atendeu no seu gabinete. Foi obrigada a ouvir toda a história. Que andava naquela situação há quase 3 anos. Foi quando assumiu que não era normal, que me receitaria uns produtos antiescaras novos (spenco) e que fosse dando notícias. Ainda comprei a almofada antiescaras mas nada resolveu. Nesse dia quase que minhas esperanças vão todas por água abaixo. Cheguei a pensar levantar-me para a cadeira e fazer uma vida normal para que assim a feridinha virasse feridona e infectasse ao ponto de ficar como a primeira. Se aquela médica achava que tinha dreno, era porque me esperava já com região podre...
Minha sorte foi não ter desistido. Certo dia ouvi falar muito bem sobre um cirurgião plástico que dava consultas no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa. Falei com a minha seguradora e lá vou eu. Ao ver minha pequena e, aparentemente, inofensiva feridinha logo me informou que só com cirurgia me podia resolver o problema. Nem quis acreditar. Pela primeira vez alguém me deu esperanças. Aceitei de imediato e fiquei logo internado para realizar exames e análises. Dois dias depois fui operado. O médico me visitou no dia seguinte e tentei saber o que tinha. Queria e precisava muito entender porque só ele me quis operar. Explicou-me que a coisa lá dentro estava feia. Parece que a infeção vinha de dentro para fora. Cá fora tudo mais ou menos normal porque nunca deixei infectar a feridinha, mas dentro havia uma grande infeção que era o que fazia a pele rebentar continuamente e verter líquidos. Que a operação tinha corrido bem, mas a partir daquele dia só poderia ficar sentado na cadeira de rodas o máximo de cinco horas seguidas e se não levasse esse fato em conta voltaria a ter a escara. Felizmente neste momento fico uma média de 8 a 9 horas contínuas e diárias sentado na cadeira de rodas e nunca mais tive problema algum. Criei foi algumas técnicas para tentar proteger a região da cirurgia, como por exemplo: aprendi a fazer um gênero de push-ups (aliviar rabisque da cadeira), enquanto acamado JAMAIS me viro sobre a região para não fazer pressão (dai ter optado por dormir de decúbito ventral)...
Devo minha melhoria de qualidade de vida àquele médico. Foram 3 anos praticamente acamado. Felizmente desde esse acontecimento (2005) que nunca mais tive nenhuma escara e espero continuar afastado delas por muito e bom tempo. Afinal comecei esta minha coluna para o Portal Vida Mais Livre, com intenção de finalizar (por agora) minha história, escrevendo sobre minha adaptação à vida fora dos hospitais e acabei por escrever sobre escaras e afins...sendo assim fica para a próxima vez o final.
Continua…
Forçs amigo, nunca desistir é isso mesmo, e vigilancia continua, ao minimo sinal de vermelhão tomar medidas, porque depois de piorar é mais difícil debelar. Já tive as minhas, e não e facil arranjar forças. Coragem, tudo de bom.
ResponderEliminarÉ verdade Jorge. Na prevenção está o segredo. Mas felizmente que têm andado afastadas de mim. Espero que assim continue.
ResponderEliminarBoa sorte e fica bem
Este tipo de informação já me foi muito útil.
ResponderEliminarObrigado! Força!
Horácio
Ainda bem que não acabou de nos contar sua história. Ela é incrível! Aprendemos muito.
ResponderEliminarAnsiosa pelo próximo capítulo!
Beijocas,
Mônica
tenho tbem ah 2 anos masestao bem pekenas ja valeu a infor sou cadeirante
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