Das 8h às 11h00 o tempo foi gasto em: levantar da cama, colocar na cadeira sanitária, realizar treino intestinal e banho, transferir para a cama, desinfetar e proteger o orifício de entrada do cistocateter, hidratar o corpo, vestir a roupa, servir o pequeno almoço e medicação, transferir mais uma vez, (desta vez para a cadeira de rodas do dia-a-dia), vestir o resto da roupa, calçar...ufa! É notório o cansaço no rosto da auxiliar que me realizou todas estas tarefas.
Fica espantada ao pedir-lhe que me vista um casaco polar. Atira: “credo”! Não me diga que está com frio! Eu estou cheia de calor. No tempo que esteve comigo, sempre que os meus afazeres lhe davam uma folga, lá ia ela atender uma campainha que tocava, apoiar uma colega numa transferência de outro utente, mudar uma fralda, colocar outro na sanita, adiantar outro serviço…
Como não estar cansada? Dou muito trabalho porque sou totalmente dependente. Pouco ou nada consigo colaborar. O simples vestir-me umas calças torna-se uma tarefa muito cansativa. Além disso, a auxiliar que me está a apoiar entrou ao serviço às 7h00 da manhã e já realizou outros banhos, e depois de mim ainda “fará outros utentes” do lar, (expressão como definem a tarefa). Costumam dizer, muitas vezes com manifesta satisfação: - “já fiz X utentes, só me falta X”.
Esta rotina é diária. Se estiver a trabalhar no turno da tarde, felizmente comigo o trabalho diminui. Mais trabalhoso será o deitar-me. Transferir-me para a cama, despir-me, posicionar-me, e se nada de imprevisto acontecer, só voltará para me mudar de posição na cama, 3 horas depois, mas com a maioria dos restantes utentes continuará a ter o mesmo trabalho.
A vida de quem trabalha numa ERPI - Estrutura Residencial para Pessoas Idosos não é tarefa fácil. Além da força física, é necessário também muita força anímica, paciência, resiliência e muita capacidade de amar. Um lar de idosos hoje em dia é um espaço de retaguarda ao serviço dos hospitais. Se não há cama vaga na unidade hospitalar, transfere-se o paciente para as estruturas residenciais. Atrevo-me a afirmar que a maioria das convalescenças são realizadas pelos lares, transformando-os numa espécie de hospitais de segunda linha.
Quantas vezes o paciente é levado ao hospital, e passadas umas horas é “devolvido à proveniência” para no dia seguinte ter que voltar, e ficar em internamento, numa espécie de vai vem, como se de mercadoria se tratasse?
Por cada ERPI construída com o apoio dos fundos europeus, o Estado fica automaticamente com direito a 20% das suas vagas abrangidas pelos acordos que comparticipa, quando comparticipa, e dá-lhe o uso que entender. Na maioria das vezes os utentes que envia chegam com patologias graves e num estado clínico muito complicado, e a necessitar de cuidados de saúde permanentes e personalizados. Além disso é necessário material para tratamento de escaras, algaliação, sondas gástricas para alimentação, antiescaras, hidratantes, bons produtos de apoio, produtos de higiene, roupa, produtos pessoais, transporte adequado para realização de exames diagnóstico, análises e consultas, etc., na maioria dos casos a resolução fica à responsabilidade dos lares. A Segurança Social descarta-se também de mais esse “problema”.
Esquizofrenias, depressões e outras perturbações psiquiátricas, infectocontagiosas, demências, como alzheimer, parkinson e outras, sequelas de AVC, lesão medular, neurodegenerativas, escareados, ataxias, alcoolismo, e mais um sem número de patologias e situações, são o universo de pessoas recebidas por estes espaços e muitas delas enviadas pela Segurança Social.
Quanto a mim esta responsabilização e imposição por parte da Segurança Social e Ministério da Saúde colocada a estes espaços é uma cobardia. Vejo muito pouca gente a denunciar este facto e a opor-se a esta anormalidade e desrespeito por estes doentes/utentes, seus familiares e espaço que os recebe.
Esquizofrenias, depressões e outras perturbações psiquiátricas, infectocontagiosas, demências, como alzheimer, parkinson e outras, sequelas de AVC, lesão medular, neurodegenerativas, escareados, ataxias, alcoolismo, e mais um sem número de patologias e situações, são o universo de pessoas recebidas por estes espaços e muitas delas enviadas pela Segurança Social.
Quanto a mim esta responsabilização e imposição por parte da Segurança Social e Ministério da Saúde colocada a estes espaços é uma cobardia. Vejo muito pouca gente a denunciar este facto e a opor-se a esta anormalidade e desrespeito por estes doentes/utentes, seus familiares e espaço que os recebe.
É muito grave, e embora não seja jurista arriscaria acrescentar que se trata de um ato inconstitucional esta prática por parte da tutela. Estes espaços não são unidades de convalescença e nem foram criados para esse fim. Segundo a Segurança Social estes espaços são destinados a alojamento coletivo, de utilização temporária ou permanente, para idosos, com a finalidade principal de contribuir para a estimulação de um processo de envelhecimento ativo e potenciar a sua integração social.
Mas não é isso que acontece. Estes espaços foram transformados em serviço de cuidados continuados integrados e unidades hospitalares de segunda, ou até em muitos casos, de primeira linha. Pelo menos realizam praticamente as mesmas funções. De acordo ainda com a Segurança Social, têm direito à prestação de cuidados continuados integrados todas as pessoas, independentemente da idade, nas seguintes situações:
● Dependência funcional transitória decorrente de processo convalescença ou outro (por estar a recuperar de uma doença, cirurgia, etc.);
● Dependência funcional prolongada;
● Idosos com critérios de fragilidade (dependência e doença);
● Incapacidade grave, com forte impacto psicossocial;
● Doença severa, em fase avançada ou terminal;
● Alimentação entérica;
● Tratamento de úlceras de pressão e ou feridas;
● Manutenção e tratamento de estomas;
● Terapêutica parentérica;
● Medidas de suporte respiratório, designadamente a oxigenoterapia ou a ventilação assistida;
● Ajuste terapêutico e/ou de administração de terapêutica, com supervisão continuada.
Como se pode verificar acima, estes utentes deveriam ser recebidos por estes serviços e não nas ERPI.
E porque razão são encaminhados para o lar de idosos e não para espaços adequados às suas necessidades? Em primeiro lugar porque fica muito mais barato ao Estado. Por cada utente em lar, a Segurança Social contribui mensalmente com 383,16€ Na rede de cuidados continuados um internamento diário ronda os 110,00€, fora as comparticipações familiares. E a uma unidade hospitalar? Sei que no Centro de Reabilitação de Alcoitão em 2009 uma diária rondava os 400,00€
Estas pessoas deveriam ser colocadas em espaços adequados e ter direito aos melhores, e mais adequados cuidados de saúde que cada caso clínico exige. Serviço de cuidados continuados, paliativos, residências autónomas, centros de reabilitação, etc. apoiados por recursos humanos adequados às suas necessidades e deixar as Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas cumprir as suas funções. Deste modo é impossível estes espaços funcionarem em pleno. Pelo contrário, ao obrigarem os lares a realizar as funções para as quais não foram criados e nem se encontram preparados estão a prejudicar os utentes com alguma autonomia e outros objetivos de vida. Conviver diariamente com pessoas em elevado grau de demência ou doença, faz com que a sua saúde se degrade.
Estes espaços na maioria das vezes e como descreve a Segurança Social, deveriam servir para reabilitar e manter o idoso ativo. Como poderá isso acontecer lidando esse idoso com tantos outros utentes com sofrimento físico e/ou psicológico acentuado? Além disso não existe uma equipa multidisciplinar para acompanhar cada pessoa com os seus problemas inerentes. Mas como se sabe, nem nas unidades hospitalares, ou outros espaços preparados supostamente para receber estes doentes têm condições estruturais e humanas para esse efeito. A grande questão é que os lares não estão equipados para atender às necessidades de pessoas com tantos problemas, mas a falta de outras respostas institucionais deixa-os sem opção.
Perante tudo isto como não estar cansada a auxiliar ou a ajudante de lar, o nosso principal cuidador? São exigências profissionais complexas em demasia para as suas capacidades e para o parco valor que recebe como compensação mensal.
Já que o Estado obriga as ERPI’s a realizar o trabalho para o qual não foram criadas, deve assumir também a responsabilidade de lhes criar condições físicas, humanas e financeiras para realizarem um trabalho que vá de encontro às necessidades dos seus utentes, e lhes permita recompensar os seus colaboradores de acordo com as tarefas realizadas e de uma forma justa. Não é com os 383,16 € actuais que disponibiliza por utente que se poderão fazer milagres.
O Estado somos todos, mas as responsabilidades da resolução dos nossos problemas, neste concreto, no que respeita à saúde, cuidados básicos, envelhecimento com qualidade, num estado de direito como o nosso é designado, está delegada no Governo a quem “quase todos nós” pagamos para fazer bem, o qual resulta do veredicto resultante das eleições periódicas.
Da minha parte, enquanto utente, um grande obrigado a todas as cuidadoras e cuidadores formais e informais, principalmente ás do Centro de Apoio Social da Carregueira onde me encontro.
Dos governantes espero e exijo muito mais. Exijo que estejam à altura de honrar os compromissos inerentes aos cargos que aceitaram. É para isso que lhes pagamos!
Mas não é isso que acontece. Estes espaços foram transformados em serviço de cuidados continuados integrados e unidades hospitalares de segunda, ou até em muitos casos, de primeira linha. Pelo menos realizam praticamente as mesmas funções. De acordo ainda com a Segurança Social, têm direito à prestação de cuidados continuados integrados todas as pessoas, independentemente da idade, nas seguintes situações:
● Dependência funcional transitória decorrente de processo convalescença ou outro (por estar a recuperar de uma doença, cirurgia, etc.);
● Dependência funcional prolongada;
● Idosos com critérios de fragilidade (dependência e doença);
● Incapacidade grave, com forte impacto psicossocial;
● Doença severa, em fase avançada ou terminal;
● Alimentação entérica;
● Tratamento de úlceras de pressão e ou feridas;
● Manutenção e tratamento de estomas;
● Terapêutica parentérica;
● Medidas de suporte respiratório, designadamente a oxigenoterapia ou a ventilação assistida;
● Ajuste terapêutico e/ou de administração de terapêutica, com supervisão continuada.
Como se pode verificar acima, estes utentes deveriam ser recebidos por estes serviços e não nas ERPI.
E porque razão são encaminhados para o lar de idosos e não para espaços adequados às suas necessidades? Em primeiro lugar porque fica muito mais barato ao Estado. Por cada utente em lar, a Segurança Social contribui mensalmente com 383,16€ Na rede de cuidados continuados um internamento diário ronda os 110,00€, fora as comparticipações familiares. E a uma unidade hospitalar? Sei que no Centro de Reabilitação de Alcoitão em 2009 uma diária rondava os 400,00€
Estas pessoas deveriam ser colocadas em espaços adequados e ter direito aos melhores, e mais adequados cuidados de saúde que cada caso clínico exige. Serviço de cuidados continuados, paliativos, residências autónomas, centros de reabilitação, etc. apoiados por recursos humanos adequados às suas necessidades e deixar as Estruturas Residenciais para Pessoas Idosas cumprir as suas funções. Deste modo é impossível estes espaços funcionarem em pleno. Pelo contrário, ao obrigarem os lares a realizar as funções para as quais não foram criados e nem se encontram preparados estão a prejudicar os utentes com alguma autonomia e outros objetivos de vida. Conviver diariamente com pessoas em elevado grau de demência ou doença, faz com que a sua saúde se degrade.
Estes espaços na maioria das vezes e como descreve a Segurança Social, deveriam servir para reabilitar e manter o idoso ativo. Como poderá isso acontecer lidando esse idoso com tantos outros utentes com sofrimento físico e/ou psicológico acentuado? Além disso não existe uma equipa multidisciplinar para acompanhar cada pessoa com os seus problemas inerentes. Mas como se sabe, nem nas unidades hospitalares, ou outros espaços preparados supostamente para receber estes doentes têm condições estruturais e humanas para esse efeito. A grande questão é que os lares não estão equipados para atender às necessidades de pessoas com tantos problemas, mas a falta de outras respostas institucionais deixa-os sem opção.
Perante tudo isto como não estar cansada a auxiliar ou a ajudante de lar, o nosso principal cuidador? São exigências profissionais complexas em demasia para as suas capacidades e para o parco valor que recebe como compensação mensal.
Já que o Estado obriga as ERPI’s a realizar o trabalho para o qual não foram criadas, deve assumir também a responsabilidade de lhes criar condições físicas, humanas e financeiras para realizarem um trabalho que vá de encontro às necessidades dos seus utentes, e lhes permita recompensar os seus colaboradores de acordo com as tarefas realizadas e de uma forma justa. Não é com os 383,16 € actuais que disponibiliza por utente que se poderão fazer milagres.
O Estado somos todos, mas as responsabilidades da resolução dos nossos problemas, neste concreto, no que respeita à saúde, cuidados básicos, envelhecimento com qualidade, num estado de direito como o nosso é designado, está delegada no Governo a quem “quase todos nós” pagamos para fazer bem, o qual resulta do veredicto resultante das eleições periódicas.
Da minha parte, enquanto utente, um grande obrigado a todas as cuidadoras e cuidadores formais e informais, principalmente ás do Centro de Apoio Social da Carregueira onde me encontro.
Dos governantes espero e exijo muito mais. Exijo que estejam à altura de honrar os compromissos inerentes aos cargos que aceitaram. É para isso que lhes pagamos!
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