sábado, 4 de abril de 2020

As pessoas com deficiência não podem ficar esquecidas

Vivemos uma situação excecional que implica algumas limitações à liberdade individual que se compreendem. Está em causa o bem comum.


O que não podemos aceitar é que os constrangimentos que enfrentamos ponham em causa direitos humanos fundamentais quando se trata de pessoas com deficiência. Que exista, na prática uma discriminação em razão da deficiência.

As medidas que estão a ser tomadas, que são necessárias e fazem sentido no combate a epidemia, não podem vir agravar as já difíceis condições de vida das pessoas com deficiência nem colocá-las em situações de risco. Para as pessoas com deficiência dependentes de terceiros, o confinamento e isolamento social pode significar não sair da cama, não fazer a sua higiene diária, não ter o que comer ou mesmo como comer se não tiverem quem os assista.

Têm chegado ao CVI, Associação precursora da vida independente em Portugal, relatos verdadeiramente alarmantes de situações que vão ao arrepio da lei nacional e da Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência. Falamos concretamente de Centros de Apoio a Vida Independente (CAVI), regulamentados pelo decreto-lei nº 129/2017 que instituiu os projetos-piloto de assistência pessoal para pessoas com deficiência, que de forma unilateral cessaram ou restringiram ao mínimo os serviços de assistência pessoal, indispensáveis para a saúde, segurança, dignidade e independência dos seus utilizadores. Contrariando, deste modo, não só o Modelo de Apoio à Vida Independente (MAVI), como também todos os princípios que norteiam a filosofia de vida independente.

A resposta dos CAVI, de todos os CAVI em Portugal, deve ser em contraciclo nesta fase pandémica e assegurar todos os serviços contratualizados, respeitando, como é evidente, planos de contingência que prevejam todas as medidas necessárias à redução de riscos de contágio de utilizadores e de assistentes pessoais.

A redução ou a cessação da prestação de assistência pessoal através dos CAVI ou de serviços de apoio domiciliário, contra a vontade dos destinatários, não é admissível. O que deverá ser equacionado é o aumento de horas de assistência quando tal se demonstrar necessário

Na eventualidade da colocação de cuidadores e prestadores de serviços em quarentena ou isolamento o estado tem de garantir os apoios necessários por forma a não deixar pessoas com deficiência sem os serviços ou apoios que necessitam.

As pessoas com deficiência são um grupo particularmente vulnerável, não só pelas consequências agravadas resultantes de uma possível infeção, dadas as debilidades de saúde muitas vezes associadas, mas também pela situação de fragilidade económica e social em que vivem. Há, por isso, que ter em consideração as suas necessidades específicas para não se agravar a exclusão a que estão sujeitas.

É, por isso, necessário que o Governo assegure algumas medidas urgentes:

• Manter e, quando necessário, aumentar os níveis de apoio às pessoas dependentes;
• Fiscalizar e punir a redução dos apoios às pessoas com deficiência contra a sua vontade, nomeadamente os serviços de apoio domiciliário e a assistência pessoal prestada pelos Centros de Apoio à Vida Independente;
• Reforçar o investimento nos Centros de Apoio à Vida Independente para possibilitar o aumento do número de destinatários de assistência pessoal e de horas de assistência disponíveis por destinatários nas situações em que tal se justifique;
• Fornecer equipamentos de proteção individual (máscaras, luvas e desinfetante) às organizações que prestam apoio presencial a pessoas com deficiência;
• Agilizar e evitar a interrupção da atribuição de produtos de apoio;
• Rastrear a infeção pelo COVID 19 nos lares residenciais, locais propícios ao contágio, como se tem verificado nos lares de idosos;
• Assegurar a prioridade no atendimento às pessoas com deficiência nos serviços públicos e privados, inclusive nos serviços de encomendas on-line
• Certificar-se que a informação de saúde pública é acessível a todos prevendo a inserção de legendagem, interpretação em Língua Gestual Portuguesa e outros formatos alternativos;
• Garantir a acessibilidade de toda a comunicação digital, indispensável à população cega.
• Converter os materiais de divulgação em formatos de Leitura Fácil tendo em consideração as pessoas com deficiência intelectual ou baixa literacia.
• Implementar uma linha telefónica de assistência dedicada às pessoas com deficiência que preveja a comunicação áudio, texto e em Língua Gestual Portuguesa;
• Possibilitar o teletrabalho a todas as pessoas com deficiência com risco agravado de saúde que o requeiram. Na impossibilidade funcional da sua obtenção, deverão ser abrangidas nas medidas de apoio extraordinário à suspensão da atividade.
• Garantir a manutenção do rendimento das famílias que têm pessoas com deficiência no agregado familiar, forçados a prestar assistência básica, por encerramento de instituições ou situação de teletrabalho, tendo em consideração os custos acrescidos decorrentes da situação de deficiência.
• Salvaguardar que qualquer resposta bancária excecional criada neste período não exclua nenhum cliente com base na sua deficiência.

A identificação das necessidades e a conceção, execução e acompanhamento de todas as iniciativas e medidas de combate à pandemia deverá ser feita após consulta e em articulação com as pessoas com deficiência e suas organizações representativas, salvaguardando todos os direitos inscritos na Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência.

Por fim, não podemos deixar de expressar a nossa gratidão a tantos profissionais, nomeadamente os e as assistentes pessoais, que possibilitam sustentar a vida e a dignidade humana em circunstâncias tão difíceis.

A Direção da Associação Centro de Vida Independente.

Fonte página facebook Centro de Vida Independente

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