sábado, 6 de abril de 2019

A Lei das Acessibilidades não é para cumprir

Minha nova crónica no Jornal Abarca.

Em Dezembro de 2017 reservei o quarto twin com wc, através do site da Pousada da Juventude de Lisboa, situada na Rua Andrade Corvo, em Lisboa, o único quarto dito adaptado desta pousada. Tive o cuidado de questionar a pousada através do telefone, se o quarto era realmente adaptado a utilizadores de cadeira de rodas elétrica, que é o meu caso. Sempre me responderam afirmativamente. Mas a realidade encontrada foi bem diferente. Um pesadelo. 

Aqui a denúncia feita na altura: 
https://tetraplegicos.blogspot.com/2017/12/pesadelo-na-pousada-da-juventude-de.html

Quase um ano e meio depois, eis a resposta da Provedoria de Justiça á minha reclamação:



V. Exa. solicitou a intervenção da Provedora de Justiça relativamente às questões de acessibilidade que se verificam na Pousada de Juventude de Lisboa. Relatou que tendo efetuado uma reserva para um “quarto duplo c/ WC, adaptado para pessoas de mobilidade condicionada”, deparou-se com vários obstáculos à utilização daquele equipamento. Verificou, desde logo, que a cadeira de rodas não cabia na cabine do ascensor que permite o acesso ao quarto. Assim, foi necessário retirar o suporte de pés e uma parte do encosto da cadeira de rodas para que fosse possível a entrada na cabina do ascensor. Acresce que as dimensões da cabine do ascensor não permitiram que fosse acompanhado e, sendo totalmente dependente de terceiros, viu-se impossibilitado de pressionar o botão do ascensor de maneira a permitir a sua paragem. Assim, ficou à mercê da intervenção de outros utilizadores do ascensor para dele sair.


Relativamente às instalações sanitárias do quarto adaptado, viu-se impossibilidade de alcançar, com a cadeira de rodas, a sanita e a base de duche, devido às dimensões muito reduzidas do espaço e à disposição dos respetivos equipamentos. Ouvimos a Cooperativa de Interesse Público e de Solidariedade Social, entidade que explora as Pousadas de Juventude da Rede Nacional, que prestou as seguintes informações:


A Movijovem entrou em processo de liquidação em 2011 por se encontrar em situação de crise financeira. Assim sendo, até setembro de 2014 – data de reversão do processo de liquidação – apenas foram praticados, nas Pousadas de Juventude, atos de liquidação da Régis Cooperativa. Não obstante o processo de reversão da liquidação e a diminuição do passivo, a atual situação financeira ainda é débil, não dispondo de meios económicos que lhe permitam fazer face a todas as obras de remodelação necessárias nos edifícios que explora.



Os números 1 e 2 do artigo 10.º do Decreto-Lei n.º 163/2006, de 8 de agosto, determinam, nestes casos, que o cumprimento das normas técnicas de acessibilidade constantes do anexo ao diploma não é exigível quando as obras necessárias à sua execução requeiram a aplicação de meios económico-financeiros desproporcionados ou não disponíveis. Contudo, a Movijovem é sensível à necessidade de melhorar a acessibilidade das pessoas com mobilidade reduzida, considerando essa melhoria um elemento fundamental na vida dessas pessoas, e lamenta o sucedido. Encontra-se a avaliar as condições de acessibilidade existentes nas Pousadas de Juventude e a estabelecer contactos com entidades competentes para identificar as necessidades de eventuais alterações, por forma a disponibilizar melhor acessibilidade a todos os utentes com mobilidade reduzida ou condicionada.

Os serviços da Provedoria de Justiça efetuaram uma visita às instalações da Pousada da Juventude de Lisboa, tendo testemunhado as condições do quarto adaptado para pessoas com mobilidade limitada, que V. Exa. descreveu. A par dos aspetos inicialmente indicados por V. Exa., foi ainda verificado que o intercomunicador colocado no exterior do edifício se encontra instalado a altura não acessível a cidadãos que se desloquem de cadeira de rodas.

Informamos que ainda não foi possível à Movijovem executar as obras de remodelação que permitirão dotar o edifício das condições de acessibilidade necessárias, mas está a ser elaborado o projeto das obras de remodelação, o qual irá contemplar os meios de acessibilidade do edifício. Encontrando-se a questão reclamada a merecer, agora, o devido acompanhamento das entidades competentes, determinei o arquivamento do presente processo.

Ou seja, a Lei permite tudo, depende da interpretação. Já o suposto quarto adaptado continua disponível e a ser comercializado como sendo acessível.

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