É justo que uma pessoa com deficiência pague por mais de um ingresso por conta de sua condição física?
LEIDE MOREIRA , minha amiga, advogada e poeta, tem esclerose lateral amiotrófica. Só possui o movimento dos olhos, e com eles se comunica. Nessa ação não está incluído o piscar, que ela não executa, de modo que sua linguagem consiste apenas na movimentação de seu globo ocular. Seus assistentes precisam piscar-lhe os olhos e pingar colírio a todo momento e, se essa tarefa falhar, Leide corre o risco de cegar, perdendo, então, a única forma de comunicação que possui.
No lançamento de seu segundo livro, "Poesias para me sentir viva", no auditório da Folha de S.Paulo, em novembro de 2008, combinamos de fazer um programa juntas. Um cineminha, quem sabe. Leide me surpreendeu com o convite para assistir a um show de Ney Matogrosso.
Esse foi seu primeiro programa após o lançamento do livro, e lá fomos nós juntas ao espetáculo. Para isso, ela contou com ambulância e todo um aparato que utiliza para continuar viva. Ela é ligada permanentemente a um equipamento que a auxilia na respiração, máquina que a acompanha sempre.
Foi transportada em uma maca móvel, utilizada também durante o show. Com a musculatura paralisada e atrofiada, a poeta sente desconforto quando fica sentada por muito tempo, por isso, sempre que sai, também utiliza a maca.
Na ocasião, o Citibank Hall lhe cobrou quatro ingressos, alegando que ela ocuparia o espaço de uma mesa.
Ainda argumentaram que estariam dando um desconto de 50%, já que a mesa era de oito lugares e eles cobrariam "somente" quatro ingressos.
Apesar de não considerar justo e por conta de sua empolgação pelo show, por sair de casa e pela nova experiência, Leide aceitou arcar com os quatro ingressos para si, sem contar com os de sua equipe.
Leide decidiu que veria, após essa ocasião, o novo show de Ney Matogrosso, novamente no Citibank Hall, mas pagando o preço justo, ou seja, apenas seu ingresso, e não os quatro que pagara anteriormente somente para si. Novamente, as entradas de seus funcionários foram devidamente pagas.
Após uma semana de conversas com Ministério Público, associações que defendem os direitos das pessoas com deficiência e um contato meu com a diretoria do local, no qual inclusive fui muito bem atendida, a casa de espetáculos concordou em receber Leide pagando um ingresso, assim como outros consumidores.
Ela, porém, não foi atendida no pedido de ressarcimento, em forma de desconto, dos três ingressos cobrados indevidamente na ocasião anterior, para o primeiro show. Desconfia ainda que poderá enfrentar situação similar em uma eventual próxima oportunidade, já que foi informada pela casa de espetáculos que, "dessa vez, foi aberta uma exceção".
Nesse caso, o fato de Leide ter conquistado o direito de uma pessoa pagar por um ingresso foi interpretado como uma concessão.
Possivelmente, dentro de alguns meses, esse abuso será passível de multa, já que nesta semana irei protocolar na Câmara dos Vereadores de São Paulo um projeto de lei municipal que proíbe casas de shows de cobrar mais de uma entrada para pessoas em situações semelhantes à de Leide.
Numa ocasião como essa, temos a oportunidade de detectar como os mecanismos excludentes são comuns em nossa sociedade. Mesmo que, em relação à inclusão das pessoas com deficiência, a legislação brasileira esteja bem avançada, na prática, a inclusão social exige o enfrentamento de grandes barreiras e desafios, configurando-se numa luta diária para conseguir apenas o elementar.
Porém, sabemos que essa é uma causa de todos nós, e estamos comprometidos com o desenvolvimento de uma sociedade cidadã e justa.
Por isso, Leide, eu e tantas outras pessoas para as quais essas barreiras são ocorrências corriqueiras acreditamos que podemos comemorar mais uma importante vitória, sabendo que ainda temos muitos desafios nessa jornada de lutas.
Fonte e informação completa no site: Vereadora Mara Gabrilli
Acrescento: Aqui está mais uma vez a prova da importância, de se colocarem as pessoas certas nos cargos certos.
Só uma pessoa deficiente poderia agir e sentir o problema desta maneira. Dei-vos a conhecer esta grande mulher, aqui. Impossível ficar indiferente.
a ganância de alguns promotores de eventos beira o absurdo... deixam de lado os preceitos básicos da dignidade humana para lucrar um pouco a mais...
ResponderEliminarDisse tudo, o pior é que o podem fazer sem serem punidos.
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