"Estou tão arrependido do que aconteceu à minha filha. Perdi a cabeça naquele momento". A declaração ao DN é de António Lima Marques, ex-fuzileiro com 65 anos, acusado de ter tentado matar a tiro a filha, Diana, que deixou tetraplégica, por não gostar da escolha de namorado que ela fez. A filha era médica, o namorado um "simples" operário fabril.
Foi há cinco anos. O processo subiu há uma semana à Relação de Lisboa, onde está pendente recurso da defesa do arguido, depois de um despacho judicial ter anulado uma sessão que estava marcada para segunda-feira, 3 de outubro, no Tribunal de Almada, para ouvir de novo uma psiquiatra cujo depoimento teria ficado mal gravado. Já há no caso três sentenças proferidas pelo tribunal de Almada e dois acórdãos da Relação de Lisboa.
António já está condenado, desde julho de 2012, a 17 anos de prisão pelo coletivo de Almada e a pagar uma indemnização à filha de 104.251,0 mil euros, por danos patrimoniais e morais, pena que tem vindo sempre a ser confirmada pelo mesmo coletivo, apesar dos recursos enviados pela defesa do arguido para a Relação.
A questão é que o arguido nunca aceitou a pena que considera "pesada" e alegou sempre que estava sob a influência de uma depressão quando disparou. "Se a pena fosse menor eu ainda podia ir trabalhar a conduzir um carro para ajudar a minha filha. E não tenho como pagar uma indemnização tão avultada. Tenho parte do ordenado penhorado, restam-me 500 euros por mês para viver", contou ao DN.
Gameiro Fernandes, advogado do arguido, defende que a condenação seja menor e por tentativa de homicídio privilegiado (feito sob o domínio de uma compreensível emoção violenta ou desespero) e não qualificado.
Diana Marques Santos, hoje com 31 anos, remete-se ao silêncio. Atualmente vive com a mãe. Foi o pai que a criou desde os 13 anos, com quem mantinha fortes laços afetivos - como reconhece o Ministério Público- até ao dia em que pegou na pistola e a alvejou. A advogada de Diana, Cláudia de Melo Pimenta, informou que a sua cliente não presta declarações nesta fase.
"Mato-te já!, ameaçou o pai
Diana tinha 26 anos quando foi atingida com três tiros no pai, um no abdómen, outro no ombro e um terceiro no pescoço. A jovem médica que trabalhava na altura no hospital de Évora e tinha uma carreira promissora pela frente ficou tetraplégica. Foi em 9 de abril de 2011, no apartamento do pai, o ex-fuzileiro António Lima Marques, em Feijó (Almada). Um pai controlador e obsessivo, segundo contou a filha, que naquele dia teve uma discussão com Diana por ela não ter ido almoçar com ele, como combinado previamente, e por ter antes almoçado com a família do namorado Miguel Barreto. António não aceitava o jovem por ser um simples empregado fabril, divorciado e pai de um filho.
"Mato-te já", disse António para Diana, saindo da cozinha e regressando depois com uma pistola semi-automática calibre 6.35mm. À distância de um metro da filha fez quatro disparos: três atingiram-na.
Numa inquirição, a psiquiatra Margarida Pinheiro, que acompanhou o arguido quando este esteve em prisão preventiva na cadeia de Setúbal, considerou que ele disparou sobre a filha movido por problemas psicológicos, o que diminui a sua culpa. Opinião que é contrária à perícia médico-legal pedida pelo Ministério Público. A acusação sustenta que António quis tirar a vida da filha e que agiu voluntária e conscientemente.
Há três anos que António aguarda o desfecho do julgamento em liberdade,medicado com antidepressivos e ansiolíticos.
O arrastar do caso na justiça que não é exemplo único. No processo Casa Pia, por exemplo, em que estavam em causa abusos sexuais a menores da instituição, a dificuldade na produção de prova volvidos muitos anos sobre os factos fez com que o caso se arrastasse por mais de oito anos.
Incapaz de fazer algo sozinha
O segundo acórdão do tribunal de Almada, de 18 de outubro de 2013, sublinha que Diana era, à data dos factos, uma pessoa alegre e saudável, e mantém a pena de 17 anos ao pai. "Em consequência da tetraplegia que apresenta não pode tomar banho sozinha, não pode cuidar da sua higiene pessoal, não pode tomar a sua medicação sozinha, não consegue vestir-se, não se deita nem se levanta sozinha e só se desloca numa cadeira de rodas, necessitando, para todas estas tarefas, de ajuda de terceira pessoa", refere o acórdão.
António diz hoje que nunca planeou matar a filha. "Antes tivesse dado um tiro a mim".
Fonte: DN
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