Penso que a primeira vez que ouvi falar em António Costa foi em 1993, a pretexto de uma campanha autárquica em que este organizou uma corrida entre um burro e um Ferrari na Calçada de Carriche. No fim, os 300 cavalos do Ferrari perderam contra o burro por 5 minutos. Apesar desta excelente iniciativa de campanha, Costa viria a perder a corrida à Câmara de Loures para os comunistas.
Quase 20 anos depois, em 2011, António Costa viria a proibir o Ferrari de andar por determinadas zonas de Lisboa. Na verdade, não proibiu especificamente o Ferrari, proibiu os carros anteriores a 2000 de por lá passearem. O argumento é simples: poluem mais. Mas a verdade é que a gasolina e o gasóleo já pagam um imposto especial por causa da poluição. Assim, quem tem carros mais poluentes já é penalizado com mais impostos.
De um ponto de vista de justiça social, tenho dificuldade em perceber estas políticas. É que, evidentemente, são muito raros os Ferraris anteriores a 2000 que se passeiam por Lisboa. Este é o tipo de medidas que penaliza desproporcionalmente a classe média-baixa. Parece que os nossos políticos gostam de colocar obstáculos no caminho de quem já tem todos os dias diversos obstáculos para superar. Faz-me lembrar aquele ditado (não sei se português) que ouvi da boca de Maria de Medeiros, no filme “Henry and June”: “Se a merda valesse dinheiro, os pobres não tinham cu!”
É um ditado que me vem muitas vezes à cabeça e a pretexto de diversos assuntos. A última vez foi quando soube do anúncio de que o Governo de António Costa ia cortar parcialmente a isenção de IUC (Imposto Único de Circulação) para pessoas com deficiência acima dos 60%. Caramba, 60% de deficiência! Cabe na cabeça de alguém andar a dificultar ainda mais a vida destas pessoas?
O argumento, mais uma vez, é simples, apenas se corta na isenção do IUC dos carros mais poluentes, que também são os de alta cilindrada.Para o blogue Geringonça trata-se apenas de cortar na “isenção do imposto automóvel a deficientes com carros de luxo.”
Carros de luxo? No Facebook, Andreia Lagartinho Oliveira pede sugestões. Comprou há pouco tempo um carro que precisa de transportar duas cadeiras eléctricas, de 175 kgs cada uma (mais as raparigas que as usam). O carro tem de ser suficientemente alto para as miúdas irem sentadas nas cadeiras sem baterem com a cabeça no tecto.
É assim tão surpreendente que estas pessoas precisem de carros de alta cilindrada? Será que estão convencidos de que as pessoas andam a comprar Ferraris para transportar os filhos deficientes?
No seu blogue, Ana Rebelo, mãe de uma menina com 97% de incapacidade permanente, explica-nos que todos os anos tem de ir às Finanças fazer prova da deficiência da Maria. Imaginem ter uma filha com uma deficiência desta dimensão. Ter todos os anos de ir às Finanças entregar prova da sua incapacidade. E este ano descobrir que perdeu parte da isenção do IUC. O automóvel de luxo? A mãe da Maria, no seu Facebook, esclarece: “O nosso [carro] é género camião, para conseguir transportar uma família numerosa de 3 filhos e mais uma cadeira, andarilho, etc.”
Se nem nos anos mais duros da troika foi necessário avançar com estes cortes, é agora que é mesmo necessário? De que verbas estamos a falar? Este corte atinge tão poucas pessoas que as verbas são irrisórias no cômputo geral do Orçamento do Estado, pelo que se lesa as pessoas que mais azar têm, sem qualquer vantagem para o resto da sociedade. Não têm vergonha?
Fonte: Observador
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