domingo, 4 de novembro de 2018

Meu pequeno grande gesto

Minha crónica deste mês no jornal Abarca

Com o acidente, e ida para a cadeira de rodas, fiquei compulsivamente proibido de realizar muitas das funções que antes fazia dentro da normalidade que é viver sem condicionalismos. Algumas tão simples como colher fruta directamente da árvore. Era um prazer tremendo chegar perto da árvore, escolher o fruto e saboreá-lo. Quem diria que no lar onde me encontro voltaria a poder usufruir desse prazer? Vinte e sete anos depois consegui-o.
A Direcção do Centro de Apoio Social da Carregueira, entre algumas outras iniciativas inovadoras, resolveu criar um projecto agrícola, com a finalidade de auto-sustentabilizar a Instituição, e de forma a aliviar os seus gastos, e a proporcionar aos utentes e colaboradores, uma alimentação mais sadia. Diariamente são confeccionadas nesta IPSS, uma média de 300 refeições, e dessa forma o caminho é ir ao encontro da quase obrigatoriedade que é as IPSS se recriarem de forma a se auto manterem, pois se continuarem a depender do valor dos apoios da Segurança Social, o seu futuro não será risonho.
A colocação em prática do referido projecto agrícola já nos permite ser auto-sustentáveis em grande percentagem no abastecimento de batata, cebola, tomate, alho francês, curgete, couve, salsa, abóbora, coentro, melão, meloa, batata doce, melancia, laranja, clementina, feijão verde, alface, nabiça, pimento, morango, orégão e pepino, a título de exemplo. Só não o é a 100% porque o gelo e o frio do Inverno, sem estufa, o impossibilitam.
Do referido projecto faz também parte a fruticultura. Um pomar de citrinos em regime de arrendamento, e algumas outras árvores frutíferas junto ao Lar, algumas das quais espalhadas por entre a relva sempre bem cuidada, começam a dar os seus frutos.
Junto ao meu quarto existe: uma pereira, uma macieira, uma laranjeira e uma ancoreira. Muitas outras estão espalhadas por todo o espaço envolvente do complexo, incluindo um loureiro e algumas tílias.
É um privilégio ver os produtos crescerem ali ao lado, e poder saboreá-los. Eu que sou um entusiasta de produtos biológicos, sinto um prazer tremendo nisso.
Poder voltar a realizar um gesto que tanto desejava, é emocionante. Este já está. Existem outros dos quais tenho muitas saudades. Como por exemplo sentir os pés na terra e abraçar, são outras pequenas coisas de que muito sinto falta, mas neste caso sei que é uma tarefa impossível. Sem sensibilidade nos pés, sentir a terra não é possível, abraçar como desejo, sem sentir a pele e calor humano de quem se abraça, também não, porque não é um abraço como gosto… aquele "abraçaço”!
Mas ter tido esta surpresa já foi muito bom, porque a vida prazerosa e sentida é muito melhor.

Eduardo Jorge

2 comentários:

  1. O Eduardo é uma força viva da natureza não sei onde vai buscar tanta coragem,go gostaria de conseguir imita-lo por um só momento.

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