Os resultados também põem em causa uma ideia-chave acerca das lesões da espinal medula: o facto de o seu tratamento exigir a regeneração dos neurónios danificados ou a sua substituição, por exemplo, por células estaminais. Ambas abordagens têm-se revelado extremamente difíceis – e, no caso das células estaminais, controversas.
“A principal mensagem aqui é que as pessoas com lesões da espinal medula do tipo das destes homens já não precisam de pensar que a sua paralisia é uma sentença para toda a vida”, disse em entrevista Roderic Pettigrew, que não participou no estudo. Pettigrew é director do Instituto Nacional de Imagiologia Biomédica e de Bioengenharia, que faz parte dos Institutos Nacionais de Saúde norte-americanos (NIH, a instância federal que financia a investigação pública nos EUA). “Podem conseguir um certo nível de função voluntária”, algo que o cientista considera ser um “marco” nas pesquisas sobre lesões espinais. O seu instituto financiou em parte o estudo, que foi publicado terça-feira na revistaBrain. A fundação criada pelo actor Christopher Reeve, paralisado na sequência de um acidente de cavalo, também co-financiou estas pesquisas.
A recuperação parcial conseguida por doentes “irrecuperáveis” sugere que os médicos e os terapeutas da reabilitação poderão estar a desistir de ajudar milhões de pessoas paralisadas. É que a terapia física pode simular alguns dos aspectos da estimulação eléctrica fornecida pelo dispositivo agora testado, diz Susan Harkema, especialista de reabilitação neurológica da Universidade de Louisville, que liderou o novo estudo. “Umas das coisas que estes resultados mostram é que o potencial de recuperação dos doentes com lesões espinais é maior do que se pensava, mesmo sem estimulação eléctrica”, explicou numa entrevista. “Hoje em dia, os doentes não beneficiam de reabilitação porque não são considerados um 'bom investimento'. Devemos repensar o que lhes oferecemos, porque a reabilitação pode promover a recuperação de um número muito maior."
Estrela de basebol
O estudo destes cientistas começou com o caso de um único doente paralisado, cujos resultados a equipa de Harkema publicou em 2011. Rob Summers, estrela de basebol universitário, fora atropelado em 2006, ficando paralisado do pescoço para baixo. Em finais de 2009, foi-lhe colocado um implante epidural imediatamente abaixo da zona lesionada. O dispositivo de 72 gramas começou a emitir correntes eléctricas de diversas frequências e intensidades, estimulando os densos fascículos de neurónios da espinal medula.
Três dias mais tarde, Summers pôs-se de pé sem ajuda. Em 2010, deu uns primeiros passos hesitantes.
A sua recuperação parcial tornou-se um fenómeno mediático, mas mesmo os autores do tratamento acharam que a estimulação epidural apenas poderia beneficiar os doentes paralisados que, como Summers, ainda tinham alguma sensibilidade nas extremidades paralisadas. “Partimos do princípio de que os circuitos sensoriais ainda presentes eram cruciais para esta recuperação”, diz Harkema.
Daí que os cientistas tivessem poucas esperanças para dois dos seus três doentes seguintes. É que nem Kent Stephenson nem Andrew Meas tinham qualquer sensibilidade nas pernas. Stephenson estava paralisado desde 2009, na sequência de um acidente de motocross quando tinha 21 anos. Após meses a fazer reabilitação no Colorado, relembra, “disseram-me que nunca tornaria a mexer as pernas, que não havia qualquer esperança”. Mas 11 dias depois de ter começado a receber os estímulos eléctricos produzidos por um dispositivo do tamanho de um baralho cartas – o estimulador RestoreAdvanced, fabricado pela empresa Medtronic e utilizado no controlo da dor –, Stephenson mexeu a sua perna esquerda “paralisada” enquanto estava deitado de costas.
“A minha mãe, que estava presente quando ligaram o estimulador e me disseram ‘levanta a perna esquerda’, desatou a chorar quando consegui”, conta Stephenson. Também eu fiquei com lágrimas nos olhos. Tinham-me dito que nunca tornaria a mexer-me voluntariamente. Os cientistas também não estavam à espera do que aconteceu”, diz Claudia Angeli, do Instituto de Reabilitação Frazer e da Universidade de Louisville, que co-liderou o estudo. “Mas quando Kent se mexeu, pensámos que afinal aquilo talvez estivesse a funcionar.
Enviado por José Mariano - Fonte: Público
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